Um pouco de leveza. Foi desta maneira que terminou a mostra competitiva do Festival de Brasília 2014. Após a exibição de diversos filmes formalistas e herméticos, Ela Volta na Quinta constitui uma obra simples e comovente - sem dúvida, o melhor filme apresentado no festival este ano. Antes do longa-metragem, como de costume, foram apresentados dois curtas-metragens: Estátua!, de Gabriela Amaral Almeida, e La Llamada, de Gustavo Vinagre.
Repulsa à maternidade
Em seu terceiro filme no festival (após Loja de Répteis e Sem Coração), a talentosa Maeve Jinkings é a atriz principal de Estátua!. A trama começa como um drama, com a chegada de uma babá grávida à casa da pequena Joana, garota de quem ela deve cuidar durante dez dias. Aos poucos, a babá começa a suspeitar do rosto angelical da criança, projetando na garota os seus próprios medos em relação à maternidade. A atriz faz um belo trabalho de composição, embora a passagem da tranquilidade à loucura seja acelerada demais. Estátua! seria bom material para um longa-metragem, formato que traria tempo para a trama se desenvolver com sutileza. Mesmo assim, entre os diversos curtas de terror apresentados, este é o mais coeso e bem resolvido.
O homem é uma ilha
Já La Llamada se passa em Cuba, onde um comerciante vende seus legumes aos moradores locais. O documentário acompanha o dia a dia deste senhor idoso, um antigo revolucionário cujo filho fugiu da ilha e nunca mais manteve contato. Por isso a espera pela chamada telefônica do título. O diretor apresenta um olhar calmo e respeitoso ao tema, mas a sua intervenção excessiva na realidade local causa certo incômodo. O momento em que Gustavo Vinagre simula a ligação do filho tão esperado, e depois pede para o diretor simular uma reação de raiva com o diretor atinge um grau de ficcionalização (ou mesmo manipulação) que desvirtua a força documental do conjunto.
Retrato de família
Ela Volta na Quinta foi a grande surpresa dentro da competição de longas-metragens. O diretor André Novais coloca-se em cena ao lado da mãe, do pai e do irmão, mas ao invés de fazer um documentário convencional, cria uma narrativa fictícia com estes não atores. O resultado é naturalista, repleto de belas cenas do cotidiano que, segundo Novais, evitam a tradicional representação da família negra de classe média, vinculada à violência e às drogas. O cineasta possui uma sensibilidade ímpar para filmar a crise no relacionamento dos pais, e despertou aplausos calorosos na plateia do Cine Brasília ao fim da sessão.
Confira a nossa crítica.