No Festival de Brasília 2014, a primeira noite da mostra competitiva começou com força total. Desde a exibição do clássico O Caso dos Irmãos Naves à tarde, até os dois curtas-metragens e o longa-metragem apresentados, todos os filmes abordavam direta ou indiretamente a questão da prisão e da liberdade individual.
A sessão noturna teve início com a exibição do curta-metragem Loja de Répteis, do diretor pernambucano Pedro Severien. O filme traz a história de um jovem casal (Maeve Jinkings e Fransérgio Araújo) que hesitam em vender a loja de animais mantida em um casarão. Enquanto isso, um jacaré vaga pelos corredores escuros da casa... A história assustadora faz referência ao Giallo italiano com bom uso de luzes e enquadramentos. Talvez a metáfora sobre a prisão dos indivíduos fique um pouco perdida em diálogos de pretensão existencial, mas o curta deixa uma forte impressão.
Em seguida, mais um curta-metragem foi apresentado: Bashar, do paulista Diogo Faggiano. O filme aborda a guerra na Síria durante o governo autoritário de Bashar Al-Assad, misturando diversos registros, incluindo imagens captadas por rebeldes locais, entrevistas do presidente a canais de televisão e mesmo esquetes cômicas feitas por sírios. Certamente, esta discussão é pertinente e importante, além de ser rara em uma produção nacional, mas a mistura entre documentário e paródia deixa a desejar. Mesmo assim, Bashar recebeu aplausos calorosos da plateia do Cine Brasília.
Por fim, foi apresentado o documentário Sem Pena, de Eugênio Puppo, abrindo a competição de longas-metragens. O diretor estava apreensivo por ser a primeira exibição do filme, mas o resultado foi excelente. Puppo fez uma parceria com o IDDD (Instituto de Defesa do Direito de Defesa) para investigar o sistema judiciário e sua relação com a estrutura carcerária do país. Com vários depoimentos perturbadores e complexos, o filme traz a curiosa escolha de não mostrar o rosto dos entrevistados, deixando o espectador fazer conexões poéticas com outras imagens destinadas a representar a justiça. A consequência desta escolha é uma obra inovadora, instigante e muito complexa. Confira a nossa crítica.
Na coletiva de imprensa sobre o filme, o diretor falou sobre as diversas dificuldades de realizar este documentário. Puppo afirmou ficar incomodado diante do gênero televisivo de documentários, com imagens de depoimentos dominando toda a narrativa, por isso retirou os rostos das pessoas para criar um efeito instigante. Ele também ressaltou que sempre quis fugir do tom de denúncia social, evitando cenas chorosas ou chocantes, no intuito de se focar na reflexão e no debate de ideias. Sem Pena chega aos cinemas em 12 cidades brasileiras no dia 2 de outubro, antes de ser exibido em outras versões, incluindo pela Internet.
Esta noite, a mostra competitiva segue com os curtas-metragens Sem Coração e Crônicas de uma Cidade Inventada, além do longa-metragem Brasil S/A, de Marcelo Pedroso.