por Roberto Cunha
O diretor Estevao Ciavatta faz sua estreia no cinema (ficção) com Made in China, comédia estrelada pela esposa, Regina Casé, e um elenco cheio de gente conhecida de diferentes áreas, como Xande de Pilares, do grupo Revelação, e Luis Lobianco, do Porta dos Fundos. O AdoroCinema estava curioso para saber mais sobre a produção e deu uma invadida nas filmagens. Lá, fomos recebidos pelo cineasta, por sua estrela e parte do elenco, todos reunidos em um papo descontraído numa "fictícia esquina da Rua da Alfandega", super bem produzida.
A história gira em torno do personagem de Casé, que trabalha na loja de um comerciante árabe, que vem sofrendo com a concorrência direta das mercadorias chinesas vendidas do outro lado da rua, e ela decide investigar. Com distribuição da H2O Films, a estreia ainda está indefinida, podendo ser no segundo semestre de 2014 ou início de 2015.
A IDEIA
Explicando a origem da trama que tem o Saara (conjunto de ruas e lojas, no Centro do Rio de Janeiro) como pano de fundo, o cineasta revelou que a ideia já existia há 10 anos. Segundo ele, ainda sem um roteiro nas mãos, a intenção era explorar o "território de paz entre árabes e judeus", mas durante a pesquisa, descobriu que a chegada dos chineses era o grande barato a ser discutido. "Porque eles desestabilizaram a paz na pequena ONU, como chamam os dirigentes locais. A partir daí surgiu a ideia de falar desse desafio de receber os chineses", fazendo ainda um paralelo com a economia brasileira.
"Esses amarelos não falam direito"
SONDANDO O TERRENO
No período da pesquisa eles constataram que tanto árabes, quanto os judeus, sofreram uma resistência quando chegaram ali. "Agora, passadas as várias gerações, são eles que reagem dessa forma ao novos "invasores". Eu vi que tinha uma coisa assim 'esses amarelos não falam direito, não falam com a gente, não querem se associar ao Saara'. Tinha uma questão muito difícil para quem era do Saara". Quando ele levou Otávio Augusto (Seu Nazir) para conhecer o personagem no qual o dele era baseado, a coisa já tinha mudado. Eles já não pensam mais assim em relação aos chineses, mas existe "uma afrmação de que a Saara jamais será uma Chinatown".
ELENCO MADE IN CHINA
Como na roda da conversa a chinesa Yili Chang carregava bastante no sotaque, com o tradicional "L" no lugar do "R", Ciavatta aproveitou para reforçar que o elenco oriental era todo original de fábrica e a maioria não ator. "O elenco chinês é todo chinês. Ninguém nasceu no Brasil", enfatizou. Segundo ele, foram feitos muitos testes e a atriz é correspondente da TV chinesa, no Brasil. "Ela tinha um frescor que me interessava e quem faz a mãe dela é a própria mãe. O único que é ator é o Tony Lee", lembrou. A produção queria ser o mais realista e como o filme tem muitos diálogos em chinês (serão legendados), eles não queriam pessoas que falassem mal chinês. Otávio Augusto ainda brincou: "Só chinês fala chinês", arrancando risos do pessoal.
RISO MADE IN BRAZIL
Como o Seu Nazir (Otávio Augusto) é um árabe, perguntamos ao ator se ele criou um sotaque especial, algo comum em personagens assim. Ele revelou que a opção foi por não seguir esse caminho e achou bom. O cineasta completou assim: "Eu não queria forçar o riso. Queria ir para um lado mais realista. Tem situações engraçadas, algumas que esbarram na chanchada. Tem uma quase surrealista que se passa perto do carnaval. Mas eu não queria mesmo forçar o riso pelo sotaque".
Regina contou que a comédia tem a confusão de ninguém entender o que o outro está falando. Disse ainda que o Luis (Lobianco, do Porta dos Fundos) ajudou muito com as piadas. "Eu conversei antes e ele trouxe um monte de coisa boa". Luis aproveitou a ocasião e abriu o jogo: "Com o Estevão nada é defintivo. Existe liberdade para propor. Trabalhar assim... todo mundo sai ganhando". Juliana Alves disse que penou com Lobianco no set: "Tive que me concentrar muito para não soltar uma gargalhada".
"No fim da cena, todo mundo tava me xingando"
LEVANDO BRONCA NAS FILMAGENS
Casé contou que o Rio de Janeiro para ela é o Arpoador, o Jardim Botânico, o Mercadão de Madureira e o Saara. "Eu não aguento ficar muito tempo sem ir lá. É onde a gente se inspira. A gente vai ao Saara uma vez por semana, no mínimo". Nesse momento, ela lembra que acabou sendo hostilizada porque o público local não entendia que ela estava filmando, quando encontravam ela na rua. "Ela (Francis) não cumprimentava ninguém e ninguém via a câmera. Aí, no fim da cena, todo mundo tava me xingando", fazendo os jornalistas darem risadas. "Eu tenteii bolar uma maneira, usei megafone, mas fiquei lá uns quatro dias com todo mundo brigando comigo. Foi muito sofrido esse corpo a corpo", contou.
QUEM É FRANCIS?
Questionada sobre seu personagem, Regina Casé disse que a Francis não é uma composição. Disse ter feito uma retrospectiva dos personagens dela na ficção e viu que todos eram muito populares, como a Tina Pepper (novela Cambalacho) e a nordestina de Eu Tu Eles (2000). "Era uma nordestina como um milhão que eu vi. O Estevão falou para eu pegar as personagens que já tinha visto e botar no mesmo saco. É quase um baú de documentários, na hora eu não penso e vem aquelas pessoas que já me atenderam, que eu fiquei conversando". Ciavatta diz que Francis é madura, uma mulher que sabe o que quer e "tem um coisa legal da relação dos dois, fugindo do que normalmente tem nos filmes, que é o fato dela não querer casar com ele, porque já criou os filhos, aí ela diz 'Casar é o que? Você ficar mexendo nas minhas coisas, ficar cozinhando...', explicou.
"Eu tinha que beijar a Regina no meio do Saara...eu ia ficando cada vez mais travado"
MARIDO E MULHER NO SET
Quando perguntaram sobre o relacionamento do casal (Regina e Estevão), agora no cinema, a resposta foi simples. "É como qualquer outro ator que eu dirijo", disse o diretor, enquanto ela lembrava que eles trabalham juntos há anos e em situações difíceis: "A gente nunca filmou num lugar fácil. Na próxima encarnação, vou fazer (programas) 'Minha Chiqueria', 'Os Melhores Spas do Mundo'... A gente tá sempre na favela ou no mato", disse rindo. Ele lembrou que quando iam filmar em Paris, México, Angola, sempre perguntavam pelo pior lugar. "Era lá que a gente queria filmar", conta, e ela finaliza: "Essa situação de agora é refresco".
PRIMEIRA VEZ
Antes da conversa, em uma das cenas que estava sendo filmada com Xande de Pilares (ao lado) e Regina Casé, rolava o maior beijão entre eles, repetido diversas vezes por conta de acertos de marcação, posição de câmeras etc. Perguntamos sobre a experiência, o convite, e ele disse que a Regina tinha feito o convite sem entrar em detalhes, mandando ele procurar a produção. "Meu horizonte é totalmente música. Eu fui fazer o teste convicto de que não passaria. Aí eu passei, o medo aumenta e a primeira cena eu tinha que beijar a Regina no meio do Saara, as pessoas querendo tirar foto, a gente não conseguia gravar e eu ia ficando cada vez mais travado", disse o cantor.
PALCO X FICÇÃO
Aproveitamos o embalo da conversa e perguntamos se existia um paralelo entre o palco e o filme, se ele sentia medo. "Eu canto para 60 mil pessoas e não tenho medo. Aqui tenho medo de 10, de estar do lado de uma", lembrando que passou a entender como se fosse uma brincadeira, que você vai aprendendo, se acostumando. O diretor aproveitou para elogiar o "pupilo" (com quem já trabalha no progama Esquenta), dizendo-se satisfeito com a escolha: "Não era só decorar o texto, tem a intenção das falas e o Xande arrebentou".
EM BUSCA DO REALISMO
Em vários momentos, Ciavatta frisou a busca por um filme o mais realista possível: "É uma comédia que mistura muitas sensações e sentimentos. É também realista. E ter as pessoas que não são atores, mas entendem o personagem é legal". Para a surpresa dos presentes, ele revelou ainda que Xande já tinha trabalhado no Saara, não como pregoeiro (que anuncia os produtos na calçada), mas como estoquista. "O momento mais louco foi comemorar o Ano Novo Chinês lá. Levamos um dragão no meio do Saara, andando lá dentro, e filmando... A gente criou um esquina, mas era importante ter o Saara. Filmamos na Igreja de São Jorge, na Rua da Alfândega, na Senhor do Passos, para o espectador entender que universo é esse que estamos falando".