por Bruno Carmelo
Estreia nesta sexta-feira, dia 13 de dezembro, o drama Além da Fronteira, história do estudante palestino Nimer Mashrawi (Nicholas Jacob), que cruza a fronteira de Israel para ter uma educação melhor em Tel-Aviv. No local, ele conhece o advogado Roy Schaefer (Michael Aloni) e se apaixona. No entanto, a intimidade do garoto com o povo de Israel cria diversas tensões em sua família.
O AdoroCinema conversou em exclusividade com o diretor Michael Mayer, que venceu diversos prêmios por esta estreia na direção de longas-metragens. O cineasta falou sobre a origem do projeto, a escolha do elenco e a recepção do filme, tanto nos festivais gays quanto nos festivais internacionais.
Confira a seguir esta conversa, e leia a nossa crítica sobre o filme:
Além da Fronteira
Como surgiu a ideia do projeto?
Um amigo estava falando sobre a situação em Tel-Aviv, com pessoas que ajudam palestinos a entrar em Israel. Eu morei em Israel a minha vida inteira, eu cresci lá, mas não sabia que isso estava acontecendo. Parecia muito interessante investigar mais sobre o assunto. Quando viajei de novo a Israel, eu fiz uma pesquisa, e encontrei um homem que passou por essa situação. Eu achei que seria um ótimo material para um filme.
Este é um tema bastante ambicioso para um primeiro filme!
Eu nunca pensei neste tema como algo ambicioso. O que era ambicioso, para mim, era viver em um país, e fazer um filme sobre outro país. E tentar voltar para a casa de antigamente. Eu cresci em Israel, mas fui para os Estados Unidos para estudar cinema. Esta ideia de fazer um filme de volta à terra da minha infância me parecia a coisa mais ambiciosa.
Foi fácil encontrar investidores que apoiassem a produção?
Encontramos alguns investidores privados, que leram o roteiro e decidiram apoiar o projeto. Eu achei que teria que ir a Israel e filmar apenas com esse dinheiro que conseguimos nos Estados Unidos. Felizmente, quando cheguei lá, um canal de televisão ouviu falar no projeto e adorou o filme. Eles quiseram participar, e assim conseguimos nos candidatar ao Israel Film Fund. Duas semanas antes de começar a gravar, eles decidiram investir também. Foi ótimo, e surpreendente que tenha acontecido em um tempo longo, mas de maneira relativamente fácil, o que não é comum nos longas-metragens.
Para o papel principal, você escolheu Nicholas Jacob, que nunca tinha atuado. Por que fez essa escolha?
A namorada de Nicholas Jacob na época participou do teste de elenco, para o personagem da irmã. Ela não conseguiu o papel, mas recomendou o namorado dela. Ela disse ao diretor de elenco que ele era talentoso, e que queria muito tentar. Nós já tínhamos dois candidatos, dois atores de que gostávamos, mas o Nicholas chegou e ele era ótimo. O que era ainda melhor é que, ao lado de outros atores, ele ficava ainda melhor. Quando o vimos com Michael, que interpreta o namorado dele, os dois combinavam muito bem.
Nicholas também tinha uma história de vida interessante, porque a mãe dele é italiana, e o pai é palestino. Ele cresceu nos Estados Unidos, depois foi para Israel, em uma escolha judaica. Ele sempre foi um estrangeiro, com amigos judeus e palestinos. Ele sempre foi “o outro”. Na escola judaica, ele sempre era considerado “o palestino”, e eu achei que isso era muito semelhante ao personagem de Nimer. E quando você trabalha com atores não profissionais, ajuda muito se eles tiverem uma história de vida que contribua. Um ator profissional tem várias técnicas para interpretar o papel, mas é difícil para um não profissional. Nós trabalhamos muito, e conversamos muito sobre a vida pessoal dele.
Você trabalhou com referências de livros e outros filmes para dirigir os atores?
Sim, usei algumas referências, mas foi principalmente com a equipe técnica, não muito com os atores. Com os técnicos, nós assistimos juntos a filmes expressionistas, com fotografia de Gordon Willis, que fez O Poderoso Chefão e Manhattan. Nos anos 1970, ele era conhecido em Hollywood como o “príncipe das trevas”, porque trabalhava com pouquíssima luz. Seus filmes eram muito escuros, cheios de sombras. Nós sabíamos que Além da Fronteira seria um filme escuro, com muitas cenas sombrias, em exteriores.
De fato, a direção de fotografia é um dos aspectos que mais chama a atenção no filme, assim como a câmera na mão. Como você chegou a essas escolhas estéticas?
Bom, eu tive muitas discussões com o meu diretor de fotografia. Primeiro, nós sabíamos que não haveria dinheiro suficiente para filmar em película, então fizemos em imagem digital de alta definição. Mas nós tentamos criar uma aparência mais “suja”, mais orgânica. Então filmamos com 16mm, para parecer mais cru. Segundo, nós queríamos que a câmera ficasse muito próxima da ação. A maioria do filme é feita com a câmera bem próxima aos atores. Isso cria uma impressão de intimidade, sabe? É possível filmar duas pessoas conversando e colocar a câmera a dez metros de distância, mas ainda criar closes. Para os atores, seria como trabalhar no teatro, porque estão distantes da câmera. Mas nós escolhemos ficar perto, para dar aos atores uma sensação de proteção, de que estávamos sempre presentes.
Além da Fronteira foi exibido tanto em festivais gays quanto nos festivais internacionais. Como as pessoas reagiram?
O fato curioso é que o filme foi selecionado primeiro em festivais internacionais, e só depois ele entrou em festivais gays. Começou nos festivais internacionais de Hamburgo, Chicago, Toronto, Seattle, e depois ele foi para os gays... Eu fiquei surpreso, porque o filme foi bem recebido pelas plateias heterossexuais. Obviamente, alguns espectadores gays vieram ver o filme em festivais internacionais, mas o fato de ter recebido uma boa repercussão em tantos festivais ajudou muito. Foi uma boa surpresa.
Qual foi a reação dos públicos israelense e palestino? O filme já foi exibido nos dois países?
Ainda estamos tentando exibir na Palestina. Só existia um cinema no país, mas ele fechou alguns anos atrás. Estamos tentando mostrá-lo em universidades, e uma pessoa de um centro cultural de Ramallah está assistindo a uma cópia em DVD do filme. É difícil, porque o tema ainda é tabu. Quando foi exibido em Israel, a plateia era composta tanto por israelenses quanto por palestinos. Alguns palestinos me disseram que já tinham visto vários filmes sobre o seu país, mas quase nenhum filmado diretamente no local, com palestinos. Nós vencemos o prêmio de melhor filme em Haifa, e já estamos sendo exibidos na televisão a cabo em Israel. Isso é ótimo.