por Roberto Cunha, em Brasília
Dando continuidade ao Festival de Brasília do Cinema Brasileiro, os profissionais envolvidos nas obras exibidas na sexta-feira de competição conversaram com jornalistas e outros profissionais ligados ao cinema. Abaixo, você tem um breve resumo do que foi dito pelos "donos" da noite.
HEREROS ANGOLA
Cenas agoniantes
O impacto de várias cenas de Hereros Angola (BA), de Sergio Guerra, é inquestionável. Isso foi percebido com a reação do público diante dos rituais de circuncisão e abate de animais, entre outros não menos traumáticos mostrados, na sala escura. Já na sala de debate, o roteirista e editor Marcelo Luna falou que eles tentaram não interferir em nada durante a captura desses momentos: “A gente esperava dias, se deslocava muito para conseguir registrar tudo. Usávamos um telefone via satélite para sabermos quando os rituais iriam
acontecer. O parto nós conseguimos captar depois de acompanharmos a gravidez e de ficarmos dias na aldeia especialmente para isso. Muitos momentos não estão no filme, como os rituais de feitiçaria e os julgamentos, que são extremamente refinados”, disse ele.
A origem
Filho do cineasta ausente do evento, João Guerra (foto) é um dos produtores executivos e ele falou sobre o projeto: “Meu pai tem uma enorme paixão por Angola. Ele mora há mais de 15 anos entre o Brasil e Angola. Numa das viagens que fez pelo país, tomou contato com os povos Hereros e viu que não havia quase nenhum registro sobre eles”. As imagens foram captadas em 2009 e só uma parte delas foi usada no corte final do longa, que contou com um tradutor em tempo integral acompanhando as filmagens e a edição.
AVANTI POPOLO
Outro longa que dividiu opiniões na terceira noite do evento, Avanti Popolo (SP) foi definido pelo seu diretor como “um filme sobre a morte, a ferida, a solidão, o esquecimento, a desesperança”. Uruguaio radicado no Brasil, Michael Wahrmann complementou o raciocínio, estabelendo uma conexão direta com o cinema: “Hoje, eu não sei o que fazer com o cinema, o que fazer com os filmes, por que fazer cinema. É uma atividade que era difícil na época do Carlão (Reichenbach) e continua sendo até hoje. Fizemos um longa com orçamento de curta”.
Custo zero
Protagonizado por não-atores, o longa faz uso de muito material de arquivo produzido por Marcos Bertoni nas décadas de 70 e 80. É ele quem diz que a ideia era fazer um filme com custo zero e ela nasceu num frio dia de chuva em São Paulo: “Eu achei umas sobras de filmes de 20, 30 anos atrás e comecei a emendar. Dublei os personagens e fiz o que hoje eu chamo de Cinema da Reciclagem ou cinema solitário. Dizem que os filmes velhos são transformados em vassouras. Mas o Micha deu uma utilização melhor para os meus”.
Alegria e tristeza
Formado em Artes Plásticas, o cineasta comenta outro ponto do filme que são os obsessivos. “Cada pessoa do filme tem uma substituição clara de algum problema”, disse ele. E a escolha do professor André Gatti como protagonista foi pessoal: "Queria que ele fizesse o personagem melancólico e amargo como ele mesmo é”, frisou o diretor. Gatti arrancou risos da plateia mais de uma vez com sua sinceridade e humor nada comum: “Não foi um dos meus alunos mais assíduos por assim dizer, mas tem uma intuição monstruosa! Algumas coisas do filme para mim são Limite (de Mário Peixoto). Ele é um animal cinematográfico”.
AU REVOIR
Para a surpresa de muita gente sugestionada pelo idioma falado e ainda o título do curta de ficção Au Revoir, a diretora Milena Times (foto) revelou que a obra não foi filmada fora de Recife. “Em nenhum momento eu falo que estou em Paris. A gente tinha como referência cidades menores da França, mas procuramos trabalhar com liberdade para criar as referências europeias, uma atmosfera européia”, disse. Segundo a protagonista Rita Carelli, “o grande trabalho foi no registro da contenção, porque minha formação é de palhaça. Meu objetivo principal no filme foi ser fiel à sensibilidade de Milena, corporificar os desejos dela”.
FAROESTE - UM AUTÊNTICO WESTERN
“Quando penso numa animação, gosto de misturar tudo”, disse Wesley Rodrigues (foto), diretor do curta animado Faroeste – Um Autêntico Western (GO), depois de citar Quentin Tarantino, Akira Kurosawa e Hayao Miyazaki como fontes de inspiração.
Premiado como Melhor Curta Brasileiro no AnimaMundi 2013, ele aborda a questão da violência social com muito humor negro, levando a ação para um lugar árido, que poderia ser no Brasil ou no local frequentado pelo famigerado Papa-Léguas da Warner, outra referência vista. “Lembrei de algumas cidades do interior de Goiás, que têm este clima desértico e tentei colocar no filme”, disse o cineasta.
Ele contou que fez o filme durante os intervalos de seu trabalho como animador no longa Até que a Sbornia nos Separe, Melhor Filme (Júri Popular) e Melhor Direção de Arte (Júri Oficial) no Festival de Gramado. Wesley disse ainda que se prepara para lançar um romance em quadrinhos de 460 páginas, chamado "Imaginário Coletivo".
CARGA VIVA
Com poucos diálogos, Carga Viva (MG) apresenta uma família criadora de jumentos, que vivem próximos da capital mineira, e usam os animais para passeios pelo Parque Municipal de Belo Horizonte. Para o fotógrafo do curta, Lucas Barbi, "o Parque é um pequeno espaço de resistência dentro da cidade".
A diretora Débora de Oliveira explicou que a intenção era “fazer a junção dos dois espaços: o campo e a cidade grande”. Luna complementa que esse é o trabalho da família: "Com os jumentos, eles aproximam a roça de crianças que nunca tiveram contato com estes animais”.
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