por Roberto Cunha, em Brasília
Seguindo a tradição das entrevistas coletivas no dia seguinte da exibição, a sexta-feira começou com os realizadores e equipe dos filmes da noite anterior, debatendo suas obras. Veja como foi o encontro com jornalistas e convidados.
O CANTO DA LONA
Dono de três prêmios conquistados na edição de 2012 do Festival de Brasília do Cinema Brasileiro, com a A Guerra dos Gibis, o cineasta Thiago Brandimarte Mendonça contou para todos que seu filme de agora, o curta O Canto da Lona, surgiu numa conversa de bar. “Eu tinha vontade de fazer um filme sobre o circo, vinha conversando sobre isso com o pesquisador José Ramos Tinhorão. Daí, conheci a filha de dona Lérida (Coutinho), que também tinha este desejo. Decidimos contar esta história”, disse o jovem, que volta a investir na cultura popular.
O processo de filmagem
O diretor disse que eles fecharam o Teatro Folias por uma semana (“um templo de resistência teatral no centro de São Paulo” nas palavras dele) sem saber um rumo certo, dando início a um filme-processo, com bastante espaço para o improviso. “Não sabíamos o que iria acontecer. Tínhamos a ideia de mostrar um pouco como era o circo-teatro, pedir a todos os personagens que apresentassem uma cena e uma canção que tivessem marcado suas vidas e carreiras. Depois, uma coisa foi puxando a outra”, explicou.
Por que usar o Preto & Branco?
Sobre a opção pelo P&B, Mendonça contou que a ideia tinha a ver com o fato de que estava abordando um circo que não existe mais e a cortina vermelha, como único elemento colorido, seria o ícone marcante desta época.
O MESTRE E O DIVINO
Cercado de polêmicas, Adalbert Heide é um dos personagens do título O Mestre e o Divino. Por conta do histórico de excentricidades e até polêmica, como acusações não comprovadas de pedofilia, o jovem cineasta Tiago Campos (ao lado) contou que já chegou para filmar "preparado para não ser bem recebido e ser atacado" pelo "índio" alemão. Ao lado do produtor e criador do projeto Vídeo nas Aldeias, ele disse que o filme foi rodado em dois tempos, divididos em uma semana inicial e, depois, um mês corrido. Nesse período final, contou que foi mais fácil se aproximar dos dois personagens cineastas: o missionário e o índio.
Um olhar mais crítico
Quando questionado sobre uma possível ausência de um olhar mais crítico, ele se defendeu dizendo que as imagens falam por si só e de que a ideia era juntar essas três visões. Sobre isso, acrescentou que eles já tinham uma imagem de Adalbert como alguém muito carrancudo, mas isso foi mudando. "Nosso objetivo geral era conseguir resgatar o acervo que ele tinha. Aos poucos, fomos sendo seduzidos por ele, reconhecendo a complexidade da personagem, vendo a relação dele com o índio Divino (ao lado). A gente não conseguia fugir muito da caricatura de um personagem chato, mas como testemunhamos o lado humano dele, tentamos deixar espaço para o personagem também seduzir as pessoas”, concluiu.
Conflitos
Num dos momentos mais polêmicos, cutucado por um dos jornalistas para falar mais sobre o real papel e a vida ao lado do Mestre, o indígena não fez rodeios: "Eles eram muito duros". Contou que seus pais e os mais velhos penaram nas mãos dos padres salesianos, que só davam comida mediante o trabalho. Lembrando que ao mesmo tempo eles ajudaram a manter várias tradições, Divino disse ter chegado a conclusão que era preciso enfrentar, mas sem briga com aquele que ele chamou de "um funcionário de Deus".
Carelli disse que o diretor até que tentou: “O Tiaguinho buscou briga o tempo todo para levantar as questões que já tínhamos pensado em abordar, mas os dois lados fugiram da raia”, brincou. Para o AdoroCinema, numa conversa exclusiva, o xavante disse que o diretor lutou mesmo e foi um guerreiro para conseguir o que queria.
Direitos autorais
Sobre a questão de direitos autorais, já que exibe imagens não autorizadas, eles disseram que o mais complicado continua sendo conseguir contactar a apresentadora Xuxa, uma vez que existem imagens do You Tube com ela cantando ao lado dos índios xavantes e do próprio Divino, na época bem jovem. “Estamos tentando, mas nunca conseguimos chegar nem perto da produção dela”, disse o produtor.
DEPOIS DA CHUVA
Focado nos 30 anos do movimento das Diretas Já!, o longa trouxe o ano de 1984 para as telas e a turma do filme (realizadores e elenco) compareceram em peso para defender o projeto no debate. Como era de se esperar, o momento de manifestações populares que o Brasil vem passando nos últimos meses foi uma das coisas que veio rapidamente na cabeça de muita gente ao falar de Depois da Chuva. “Nós filmamos entre junho e julho de 2012, bem antes das manifestações, mas agora o filme ganhou outras possibilidades de leitura”, disseram os diretores baianos Cláudio Marques e Marília Hughes.
A semente da ideia
Cláudio revelou que o projeto tem no seu DNA uma inspiração autobiográfica: “Tive meu despertar político e amoroso na década de 80 e lembro a sensação de impotência quando Sarney foi empossado Presidente da República. Conversando sobre isso com Marília, ela viu que estava aí o tema para nosso primeiro longa”. A dupla contou ter chegado a essa conclusão quando se deram conta que esse período tinha sido pouco retratado no cinema. “Isso nos intrigou e achamos que é porque gerou uma frustração muito grande. A gente ficou muito tempo sem conseguir falar sobre o que aconteceu”, completou o diretor.
Referências
Instigados a comentar as referências, Marília confessou ter buscado inspiração em Água Fria, longa do francês Olivier Assayas, para mostrar a história de amor entre dois adolescentes. “Tem uma energia nesse filme do Assayas que a gente queria para o nosso filme”, disse ela, completando que a escolha do elenco foi fundamental. “Fizemos uma pesquisa ampla em Salvador, nos colégios, grupos de teatro, entrevistas por Skype, presenciais e tudo o mais. Depois que conhecemos o Pedro (Pedro Maia), soubemos que estava ali nosso personagem e a partir dele fomos selecionando todo o resto do elenco”.
Imagens de arquivo
Sobre o uso de imagens reais no filme de ficção, o cineasta explicou que a ideia era mostrar a distância entre o real e a "ficção da vida": “Nós queríamos mostrar que existia um abismo entre o discurso empolado dos políticos e a juventude. Os anos 1980 marcam o fim das grandes utopias. Quisemos mostrar o fosso que há entre o político profissional e o jovem utópico”.
RYB
O curta de animação é fruto de um ano de oficina na Escola Ozzi de Audiovisual de Brasília, há 10 anos atuando na área de animação na capital federal. Segundo o produtor executivo Maurício Fonteles, a Ozzi faz a oficina Animus e durante um ano produz os curtas. Ele falou da ralação que é realizar uma animação como RYB: “Muita gente que nunca teve contato com a animação ou o cinema tem a possibilidade de participar deste processo, que é tão doloroso. A gente passa três meses modelando e texturizando um elemento, por exemplo, e ele passa apenas três segundos na tela. O filme foi realizado por alunos e profissionais que já foram alunos da gente”, sentenciou orgulhoso.
LIÇÃO DE ESQUI
Amigos na vida real, os dois jovens diretores Leonardo Mouramateus e Samuel Brasileiro contaram que fizeram Lição de Esqui com R$ 15.5 mil descontados os impostos dos R$ 20 mil conquistados via edital da Prefeitura de Fortaleza. A ideia era fazer um filme sobre amizade e a dupla comentou sobre a improvisação na obra que contou com não atores: “A gente faz do jeito que dá. São muitas tomadas que a gente junta pra fazer o filme. E sempre deixamos espaços para a improvisação. Gostamos de trabalhar os vazios”.
Para maiores informações, visite o site Festival de Brasília do Cinema Brasileiro. O AdoroCinema viajou a convite da organização.
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