por Lucas Salgado
Destaque no Festival de Sundance em 2011, A Tentação chega aos cinemas brasileiros abordando temas sérios como religião, intolerância, infidelidade e homosexualismo. Para saber mais sobre o longa, o AdoroCinema conversou com exclusividade com o diretor e roteirista Matthew Chapman (foto), e você pode conferir o melhor do bate papo logo abaixo.
Fale um pouco sobre a origem do projeto. De onde tirou a ideia para o roteiro?
Comecei a escrever A Tentação após os atentados de 11 de setembro. Conheci muitos fundamentalistas nos Estados Unidos quando trabalhava como jornalista e autor de não-ficção. Estava em Nova York no 11 de setembro e isso certamente me fez pensar mais sobre fundamentalismo e a natureza da fé. Como fazer com que as pessoas acreditem em coisas que tão violentas ou em outras que não fazem o menor sentido? É fascinante. Pensei que eu poderia fazer um filme que entretece, mas que também tocasse nessas questões.
Como foi a seleção do elenco?
Eu queria Charlie Hunnam como Gavin porque ele tem uma certa doçura, assim como inteligência. O personagem diz algumas coisas bem duras e se comporta mal, então o ator tinha que ser cativante. Liv Tyler se tornou uma mulher e acho seu rosto muito expressivo agora que ela passou por algumas coisas bem difíceis. Patrick Wilson é simplesmente um grande ator, assim como Terrence Howard.
Patrick Wilson tem uma atuação impressionante como Joe. Como foi o processo de desenvolvimento do personagem com ele?
Conheço a Bíblia muito bem. Apresentei a ele alguns de seus cantos mais estranhos. Ele estudou profundamente e me trouxe várias grandes citações. “Estou lavado, justificado e santificado”, foi uma sugestão dele. Ele é um ator incrível, muito preciso e bem treinado.
O fundamentalismo religioso tem sido objeto constante de seu trabalho. O que te atrai neste assunto?
Como você deve saber, eu sou bisneto de Charles Darwin. Mais de uma vez me foi dito por fundamentalistas americanos e evangélicos que apenas por esta razão eu irei para o inferno. Algumas vezes, acho que o fato de eu não acreditar em Deus faz com que digam coisas assim. Normalmente, é uma relação amigável. “Você gostaria de um pouco mais de café (antes de queimar por toda eternidade)?” Acho isso tão engraçado quanto aterrorizante. Como pessoas agradáveis e sãs podem ficar tão confortáveis com este conceito incrivelmente violento de incineração em massa prescrita por Deus? E se estão confortáveis com isso, o quão mais fácil é aceitar os outros tipos de violência? Lembre-se, não é algo que termina, é infinito. É como aquelas velas em um bolo de aniversário, que continuam acendendo mesmo depois que você sopra – só que existem milhões dessas velas e nós estamos sentados em cima delas. Socorro!
Antes de A Tentação, você ficou 22 anos sem dirigir um filme. Como é voltar à função?
Quando parei de dirigir, eu era um homem. Quando voltei era outro. Eu tive uma filha. Meus pais morreram. Viajei mundo a fora como jornalista, perguntando todo tipo de questão. Eu estava diferente, mais crescido. As pessoas subestimam essas coisas. Acho dirigir algo menos técnico, pelo menos no tipo de filme que eu tenho interesse, que são mais humanos, sobre o que você é e o que quer dizer. Aproveitei mais porque me conheço melhor e foi mais fácil não me desviar da minha visão.
Você escreveu o roteiro de Flores Raras. O que pode nos falar sobre o filmes? Como foi o contato com Bruno Barreto?
É a história de duas mulheres que se apaixonam em uma época em que isso não era fácil. Elas eram fortes e inteligentes, mas de formas bem diferentes. Eu gostei de trabalhar com o Bruno Barreto e vou fazer outro filme com ele baseado em Menino do Rio. Eu fui aos ensaios e reescrevi bastante do roteiro para Bruno e os atores. Pude trabalhar com Glória Pires. Foi tudo muito bom.
O que te atraiu na história de Elizabeth Bishop?
Eu desprezo a homofobia. O filme sobre o caso de amor entre Elizabeth Bishop e Lota de Macedo Soares é um trabalho pós-homofóbico. É mais sobre o quão duro é para pessoas fortes e complicadas se envolverem do que sobre o quão difícil é ser gay e apaixonado, embora isso gerava, e ainda gera, algumas complicações.
Com o elenco de A Tentação no Festival de Sundance
O Silêncio da Chuva é outros projeto seu com um diretor brasileiro (Daniel Filho). Fale um pouco sobre o trabalho?
Tenho muito orgulho deste roteiro. Acho que é o melhor suspense que eu já escrevi. É adaptação de um livro, mas adicionei uma metáfora sobre o velho e o novo Brasil. Também é sobre o Rio de Janeiro e seu renascimento. É um sombrio e visualmente interessante noir.
Trata-se de uma adaptação de Luis Alfredo Garcia-Roza. Como roteirista, tem uma preferência entre escrever um texto original ou adaptar um trabalho de outro autor?
Na verdade, não. Muitas vezes você começa a escrever algo seu e acha que é bom e logo percebe que alguns elementos que você achava que funcionariam não funcionam e você se vê caindo de um precipício. Outras vezes você acaba escrevendo algo seu e conseguindo tudo o que queria. Adaptando um trabalho é um pouco mais fácil ter uma visão do futuro. Às vezes já existe algo que funciona de uma forma ou de outra. Isso pode ser libertador, se não se tornar referencial. Não sou deste tipo. É possível que o tiro saia pela culatra. John Grisham odiou minha adaptação para O Júri. Não por eu ter mudado o foco do tabaco para as armas, mas por eu ter tornado a história sexy e ele (Grisham) ser batista. Acabou que eu e o sexo fomos jogados de lado. Por outro lado, tomei muitas liberdades em O Que Mais Pode Acontecer? e Donald Westlake achou que foi a melhor adaptação de todos os seus livros. Isso significou muito para mim, porque era um grande escritor. Nós dois ficamos infelizes com o resultado do filme, mas essa é outra história.
A Tentação