por Francisco Russo, direto de Cannes
Emoções distintas tomaram conta da mostra competitiva de Cannes. Enquanto ontem à tarde o austríaco Paradise: Love trouxe muita polêmica à Croisette, devido ao modo como retrata diversas formas de preconceito, hoje pela manhã foi exibido o italiano Reality, que aborda o fascínio provocado pelo programa televisivo Big Brother. Filmes bastante diferentes que trazem um ponto em comum: o tom crítico ao tema em questão.
O apartheid social retratado em uma cena de "Paradise: Love"
A história de Paradise: Love, por si só, já coloca o dedo na ferida. Uma senhora de meia idade, bem de vida, resolve deixar seu país natal para uma espécie de resort no Quênia, onde pretende fazer turismo sexual. Palco ideal para todo tipo de preconceito, envolvendo cor da pele, riqueza pessoal, costumes e até mesmo origem (europeus x africanos). Entretanto, o filme do diretor Ulrich Seidl passa longe de apontar culpados. Não há inocentes nesta história onde todos, sem exceção, buscam melhorar de vida deixando de lado qualquer trava moral. Puro instinto de sobrevivência social, onde o vale-tudo muitas vezes incomoda o espectador - não apenas pelo exibido em cena, mas pela consciência de que situações como as retratadas realmente acontecem.
Forte e com situações humilhantes para ressaltar o absurdo da situação, Paradise: Love choca tendo convicções ideológicas como pano de fundo. É através do explícito que o diretor procura a denúncia de um jogo onde ambos os lados pensam estar lucrando. Destaque também para a protagonista Margarete Tiesel, que se atira à personagem com coragem, especialmente devido à exposição que ela lhe proporciona. Até o momento, é o mais impactante filme da mostra competitiva deste ano.
Aniello Arena é o dono de uma peixaria sondado para entrar na versão italiana do Big Brother
Produzido na Itália, Reality poderia muito bem ter sido feito também no Brasil - com certas adaptações relacionadas à cultura local, é claro. Luciano (Aniello Arena) é dono de uma peixaria e faz diversos bicos para manter a família. Sondado para integrar a próxima edição do Grande Fratello, a versão local do Big Brother, ele vibra com a chance de enfim subir de vida. Após realizar dois testes, cresce a expectativa em ser confirmado no programa. Só que a espera faz com que se torne cada vez mais paranóico.
Após denunciar a máfia italiana em Gomorra, o diretor Matteo Garrone volta sua atenção para o fascínio provocado pela televisão. A fama rápida e o dinheiro fácil são os grandes alvos, modificando pouco a pouco os ideais de Luciano. Pela popularidade do Big Brother e a imensa influência da TV, o contexto apresentado lembra bastante a realidade brasileira. Entretanto, apesar do tema atraente e da boa atuação de Arena, o filme segue sempre em ritmo morno por não ir mais a fundo na questão da influência da TV na sociedade. Focado mais na história do protagonista, Reality perde a chance de tornar mais ampla uma discussão bastante pertinente para os dias atuais. Apenas mediano.
Tanto Reality quanto Paradise: Love ainda não têm previsão de lançamento nos cinemas brasileiros. Logo abaixo você pode conferir vídeos de ambos.
Reality
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