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    Entrevista com o diretor Walter Carvalho, de Raul - O Início, o Fim e o Meio

    Raul - O Início, o Fim e o Meio chega aos cinemas contando a história de um dos maiores ícones da música brasileira. O AdoroCinema aproveitou para conversar com Walter Carvalho, diretor do longa.

    por Lucas Salgado

    Um dos mais conceituados diretores de fotografia do Brasil, Walter Carvalho tem se aventurado cada vez mais na função de diretor principal. Raul - O Início, o Fim e o Meio é o sexto longa comandado por ele, cujo maior sucesso, curiosamente, é a cinebiografia de outro ícone da música brasileira em Cazuza - O Tempo Não Pára. Para promover o lançamento do documentário sobre Raulzito, o cineasta concedeu coletiva de imprensa no Rio de Janeiro. O AdoroCinema marcou presença na entrevista e traz para você o que de melhor aconteceu.

    Antes Cazuza, agora Raul

    Antes de dirigir um documentário sobre Raul Seixas, Walter Carvalho realizou o longa Cazuza - O Tempo Não Pára. O cineasta revelou que não foi ele que decidiu que um seria ficção e o outro documentário. Os projetos já previam esta situação previamente. 

    “Começamos essa viagem em 2009 e agora iremos entregar o filme para o público”, destacou Carvalho.

    Por que Raul?

    “Dizer o que me interessa na figura do Raul seria objeto de um seminário. Você tem um compositor, um artista de palco. Tem um tipo de artista que não existe mais. Na época do Raul, que é a mesma do Caetano Veloso e do Chico Buarque, o artista que era o mercado. Hoje ele é criado pelo mercado. Você coloca um modelito e é vendido com um viés mercadológico”, destacou Walter, que completou: "Nem todos duram tanto."

    O cineasta lembrou ainda que o músico surgiu num momento único no Brasil, que coincide com o nascimento da Bossa Nova, do Cinema Novo e do teatro de Zé Celso.

    Easy Rider

    Logo no início do filme nos deparamos com imagens do clássico Sem Destino. Carvalho explicou um pouco a opção: “O Raul não vem só, ele vem com a contracultura, que é um movimento que surgi com o beatnik nos Estados Unidos e que tem como primeiro ponta pé na área do cinema o Easy Rider. Não é a toa que eu começo o filme com a cena dos motoqueiros no deserto da Califórnia.”

    O diretor destacou que quis fazer a ligação entre o deserto da Califórnia com o sertão da Bahia, onde nasce Raul Seixas. “É a mesma ligação entre Luiz Gonzaga e Elvis Presley, que é a grande sacação do Raul”, disse.

    Walter Carvalho contou ainda que ele deve ter sido uma das últimas pessoas a obterem autorização para usar imagens de Easy Rider antes da morte de Dennis Hopper. O cineasta brasileiro havia visitado o ator e diretor americano há vários anos, em companhia de Joao Moreira Salles. Para convencê-lo a liberar os direitos sem custos, Carvalho enviou uma foto de tal encontro e explicou um pouco do projeto através de uma carta.

    Direitos de imagem

    Segundo o diretor, 30% do orçamento do filme – o que dá cerca de R$ 750 mil – foram gastos na aquisição de direitos de imagens. Ele lamentou não ter encontrado registro da apresentação de Raul no Festival da Canção de 1972, quando surgiu com o hit “Let me Sing”. “Se eu encontrar, vendo meu carro, compro os direitos e insiro a música no filme”, brincou.

    Carvalho lamentou tanto a falta de tal registro, que chegou a cogitar inserir no longa a apresentação de Maria Alcina cantando “Fio Maravilha” na mesma edição, mas logo percebeu que não faria o menor sentido.

    Paulo Coelho

    Walter afirmou que o trabalho de colher os depoimentos é uma luta corporal feita pela produção, consistindo em inúmeros contatos via carta, e-mail e telefone. Ele disse que levaram meses para convencer Paulo Coelho a dar uma entrevista para o longa. A produção teve muito problemas para se adequar à movimentada agenda do escritor.

    “Eu não queria pensar nisso, mas cheguei a me acostumar com a ideia de fazer o filme sem a presença do Paulo, o que seria algo lamentável”, afirmou. A sorte dos realizadores foi que Coelho viu um programa especial da Globonews sobre Raul, em que Sylvio Passos (presidente do Rail Rock Club) elogiava a produção de Raul - O Início, o Fim e o Meio. Após isso, o próprio autor procurou o produtor Denis Feijão para agendar uma entrevista.

    Paulo Coelho aceitou dar 45 minutos de entrevistas para o filme, no que deu início a uma nova jornada por parte dos envolvidos no projeto, que era convencer o escritor a dar um depoimento mais longo. “Falei com o Roberto Menescal, que é grande amigo dele, para me ajudar, porque 45 minutos era muito pouco, não daria para abordar toda a história dos dois”, destacou Carvalho. Chegando na casa de Coelho em Genebra, o diretor conseguiu convencê-lo a dar duas horas e quinze minutos de depoimentos.

    Em momento algum, Walter Carvalho ligou as dificuldades com Paulo a qualquer tipo de desrespeito com a produção, fazendo questão de ressaltar que ele é uma pessoa de fato com muitos compromissos. Lembrou ainda que o escritor chegou a pedir para amigos chegarem mais tarde em um jantar que iria promover em sua casa em razão das gravações. “Isso demonstra a generosidade que ele teve com a equipe, comigo e com todo mundo”, afirmou.

    Morte de Raul

    O cineasta surpreendeu ao dizer que, para ele, Raul teria morrido de amor. "O Raul morreu por amor. O Raul morreu de uma paixão louca pela Edith", destacou Walter, fazendo menção à primeira esposa do músico. O longa mostra várias mulheres da vida de Seixas e Edith é a única que se recusou a dar depoimento. Por isso, a afirmação soou surpreendente. Mas o diretor fez questão de frisar que a diferença de Edith para as outras foi que ela se encantou pelo Raul da Bahia, enquanto que as demais já conheceram o astro do rock.

    Um capítulo controverso com relação ao falecimento do ícone da música brasileira foi a série de 50 shows que Raul fez com Marcelo Nova. Muitos apontam que as apresentações ajudaram a apressar a morte dele, mas outros – como mostra o filme – também defendem que estas, na verdade, colaboraram para mantê-lo vivo por mais tempo.

    “Ele fez 50 shows sem faltar nenhum e morreu no primeiro final de semana sem show, o que é bem simbólico. Não posso afirmar categoricamente que se ele tivesse continuado, ele não teria morrido. Como também não posso dizer que ele teria morrido antes. Ninguém sabe”, afirmou.

    Walter Carvalho lembrou ainda de outros ícones que faleceram cedo. “O processo do Raul foi como o de Glauber Rocha, Torquato Neto, Jimi Hendrix, Janis Joplin. São pessoas, artistas, que vieram ao mundo com brevidade. São pessoas que vieram ao mundo para ter uma passagem meteórica e deixar uma obra. É uma predestinação, não sei. São características de alguns artistas que abreviam as suas vidas. O Raul é uma pessoa viveu para sua obra e morreu por ela.”

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