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    Ambição, desejo e jogo do bicho: Os Enforcados desvenda o que acontece nos condomínios de luxo do Rio (Entrevista)
    Giovanna Ribeiro
    Giovanna Ribeiro
    -Redatora e Crítica
    Aprendeu com Amélie Poulain a ir ao cinema sozinha às sextas e observar a reação do público. Mas, no fundo, queria mesmo era ser o Rocky Balboa.

    Em uma trama em que todos são antagonistas de si mesmos, Os Enforcados marca o amadurecimento da parceria entre Fernando Coimbra e Leandra Leal, desde O Lobo Atrás da Porta.

    É possível dizer que o cinema brasileiro já conta com uma vasta filmografia sobre escassez. Sobre realidades em que se falta de tudo, e muitas das vezes o poder paralelo exerce controle. Mas, em um país desigual, se há falta, também há concentração. Logo, o cineasta Fernando Coimbra, que já havia estreado seu primeiro longa-metragem com o pé direito no Festival do Rio de 2013 - ocasião na qual O Lobo Atrás da Porta foi um dos grandes vencedores -, chegou à edição de 2024 com a expectativa de repetir o sucesso com seu novo thriller, Os Enforcados.

    Em Os Enforcados, Regina (Leandra Leal) e Valerio (Irandhir Santos) estão felizes no relacionamento e levam uma vida confortável na Barra da Tijuca, Rio de Janeiro. Mas desde a morte do pai de Valerio, um dos maiores bicheiros da cidade, eles procuram se adaptar aos negócios criminosos da família. Ao mesmo tempo, o casal também têm despesas e dívidas ​​para quitar, logo, o tio de Valerio, Linduarte (Stepan Nercessian) insiste que o sobrinho assuma a "banca".

    Numa noite, o casal encontra uma solução para todos os problemas, em um movimento impulsivo: matar o tio e “vender” o negócio. No entanto, ao fazer isso, ambos mergulham ainda mais na violência e nas contradições do poder, dos quais queriam escapar.

    Paris Filmes

    Parte sátira, parte Shakespeare, Os Enforcados surgiu quando O Lobo Atrás da Porta ainda estava em processo de finalização. No entanto, após Fernando Coimbra passar uma temporada no exterior dirigindo projetos como Narcos e What/If, somente em 2024 o filme conheceria as telas brasileiras pela primeira vez, no Festival do Rio - após a Première Mundial no Festival de Toronto. E mais de dez anos depois do primeiro longa-metragem do diretor.

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    Em entrevista ao AdoroCinema, Coimbra revelou a inspiração em Macbeth, ao buscar contar uma história de cobiça, ambição, ou quando matar o Rei para pegar o lugar dele, nem sempre é sinônimo de sucesso. Para tanto, o diretor resgatou sua protagonista Leandra Leal, e realizou um desejo antigo de trabalhar com Irandhir Santos, dando aos atores uma abertura para que eles também pudessem reimaginar essa figura quase “folclórica” do Rio de Janeiro, o bicheiro:

    “Esse personagem que ascendeu no Brasil do ‘cidadão de bem’, que paga seus impostos. O que é correto, que é moralmente correto, mas, na verdade, é uma galera muito corrupta [...] Então para mim é muito sobre essa elite econômica que a gente tem, que é super corrupta, mas se vende como os exemplos da moral e dos bons costumes”, diz o diretor.

    Estranho amor

    Mas, Os Enforcados é também a história de um casamento. Para o diretor, o vínculo entre Valério e Regina consegue reunir, tanto a força, quanto uma vulnerabilidade destrutiva: “Justamente por eles fazerem um pacto juntos, que seria o pacto de um casamento, um projeto de vida, mas em cima de um crime, aquilo vai desandando, vai perdendo o controle [...] A força deles tá nessa conexão, e depois [a vulnerabilidade está] nessa desconexão que vai na mesma intensidade” diz Coimbra.

    Paris Filmes

    Essa intensidade é reconhecida por Irandhir Santos. A ator enxerga no casal principal uma forma de amor muito particular, e um desejo estimulado pela ambição, que em determinado momento, se transforma em disputa. Ao AdoroCinema, Irandhir confirmou que o processo de filmagem de Os Enforcados foi extremamente propositivo, e tanto ele, quanto Leandra, tiveram todo o espaço necessário para adicionar tempero a esse estranho amor:

    “Também havia essa abertura, o que cada um poderia cooperar, até as ideias mais escabrosas. E era um jogo bonito, porque acabava virando jogo de conquista também, que tem muito a ver com esses dois. O que a gente trazia de proposta para a cena não deixava de ser a conquista entre Valério e Regina. Houve um jogo ali que a gente jogou sem anunciar, ele foi se estabelecendo. Isso foi bonito de viver assim com ela [Leandra]. Gostei de jogar esse jogo” diz Irandhir Santos.

    A forma de amor que eles encontraram foi o estímulo mútuo desse desejo. Capaz de fazerem qualquer coisa para atingir. É a ambição, é um poder que vai sendo buscado por esses dois, até o ponto de ser disputado também

    Leandra, por sua vez, ressalta o caráter político da obra. Ao AdoroCinema, a intérprete de Regina, compartilhou uma visão menos romântica da personagem, que no seu entendimento, possui a capacidade de amar "muito atravessada pela segurança financeira": "Precisa ter um acordo que tenha uma compensação financeira, para poder se apaixonar” observa. Para a atriz, Os Enforcados trata, acima de tudo, sobre violência:

    “Você tá falando realmente de quem financia essa violência. Ele é realista, mas não é realista. Tem toda a linguagem dele própria, mas ele tem isso um DNA, ele fala a partir de quem financia, de quem lucra com isso” analisa Leandra.

    Sem mocinhos ou vilões - ou melhor, todos são antagonistas de si mesmos -, Os Enforcados também marca o amadurecimento da parceria entre Fernando Coimbra e Leandra Leal, especialmente, considerando que o projeto de Coimbra foi o primeiro papel que a atriz aceitou, após sua primeira experiência como diretora, com a série A Vida Pela Frente:

    “Foi uma relação muito mais forte com uma confiança ainda maior, como uma entrega muito maior dos dois, uma troca. Já tinha sido incrível no Lobo [O Lobo Atrás da Porta], mas teve esse amadurecimento dos dois” ressalta Fernando Coimbra.

    Filme visto no 26º Festival do Rio em outubro de 2024. Os Enforcados estreia nos cinemas brasileiros somente em 2025.

    Os Enforcados
    Os Enforcados
    Criador(es): Fernando Coimbra
    Com Leandra Leal, Irandhir Santos, Irene Ravache

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