Desde o futebol até a política, fazer piada dos problemas é algo que aproxima os povos latinos tanto quanto as fronteiras que compartilhamos. Durante a estreia de Puan, parte da Première Latina do Festival do Rio 2023, no tradicional cinema de rua Estação Botafogo, as risadas de situações da rotina de um professor portenho mostraram que o “rir para não chorar” prevalece sempre.
Mais acostumados em retratar as “calles” e pampas argentinas sob um tom mais dramático, Benjamín Naishtat e María Alché fizeram questão de produzir uma comédia para retratar a realidade do nosso país vizinho. Com coprodução brasileira, o longa-metragem chegou às terras cariocas já laureado com dois prêmios do Festival de San Sebastián: Melhor Ator para Marcelo Subiotto e Melhor Roteiro.
Após a morte repentina de seu mentor, Marcelo Pena (Marcelo Subiotto) está pronto para preencher a cadeira de professor titular de Filosofia da Universidade de Buenos Aires (UBA). Mesmo sendo a aparente escolha certeira para a função, seus esforços de anos podem ser em vão, porque tudo muda com o retorno de Rafael Sujarchuk (Leonardo Sbaraglia), seu colega mais atraente e carismático. Com a crise econômica - e a da meia-idade - batendo à porta, o filósofo tenta equilibrar seus dramas pessoais com os da faculdade.
Em entrevista exclusiva ao AdoroCinema, o diretor Benjamín Naishtat, ressalta a necessidade de contar histórias com conflitos próximos aos da vida real no cinema, a fim de gerar identificação do público:
“Há uma tendência na ficção hegemônica de não querer mostrar a vida das pessoas de verdade. Muitas vezes os filmes mais comerciais não correspondem com a realidade da população e, por isso, queríamos fazer uma comédia com personagens reais, professores da UBA em seus apartamentinhos sem saber se vão conseguir chegar ao fim do mês”, explica.
Além disso, ele pontua a importância que a indústria cinematográfica, e os próprios festivais de cinema, enxerguem a seriedade e a pertinência por trás gênero cômico:
“Você pode fazer um filme muito engraçado, refletir sobre uma realidade e falar de política sem precisar ser algo chato. Os festivais acabam tendo um certo preconceito e não dão muito espaço para a comédia, que, às vezes, é estupidamente vista como um gênero menor. Eu e María consideramos a comédia algo muito sério e importante, que sempre foi veículo de comentário social e cultural", defende o cineasta.
Festival do Rio 2023: Cinebiografia de Sidney Magal, Meu Sangue Ferve Por Você é um retrato íntimo de uma história de amor (Entrevista Exclusiva)Puan discute sobre a importância da educação fazendo perguntas a quem assiste
Quando se trata de um filme que foca na realidade crua de seus personagens, é impossível descolar a narrativa do contexto social na qual ela está inserida. No caso de Puan, o microcosmos da Facultad de Filosofía y Letras, campus da Universidade de Buenos Aires que fica pertinho da estação “Puan" do metrô da capital argentina. Acima disso, a crise econômica, política e social que paira sobre o país - e encontra semelhanças por toda a América Latina - é uma personagem crucial na trama.
A inflação que anda de montanha-russa e os cortes nos gastos públicos fazem parte do dia-a-dia da população e afetam suas vidas em diferentes instâncias. Esse cenário impulsiona os conflitos da história, exibindo as manifestações que tomam as ruas portenhas diariamente e a luta para manter a universidade de pé. No longa, o filósofo Marcelo Pena, vivido por Subiotto, utiliza tais exemplos do cotidiano de seus alunos para ilustrar as complexas teorias de Thomas Hobbes e Heidegger.
Assim como o professor Pena em sala de aula, o roteiro de Naishtat e Alché não dá respostas de bandeja ao público. Muito pelo contrário, o diretor destaca que o equilíbrio entre os dilemas pessoais e sociais do filme se dá por meio das perguntas levantadas - mesmo que de forma cômica - a quem assiste:
“Puan é uma comédia de perguntas. Nosso desejo era deixar essas perguntas: ‘O que é educação? O que é ensinar? O que é aprender? O que é um professor? O que é um estudante?’ Todas essas questões estão aí. Ao mesmo tempo, a vida íntima se mistura, afinal, o que fazemos com o legado e a alma de quem se foi é a pergunta que está no filme”.
O Festival do Rio acontece até o dia 15 de outubro de 2023, no Rio de Janeiro.
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