Além de ter um universo mais maluco que a maioria dos outros filmes da Disney, Alice no País das Maravilhas apresenta uma galeria de personagens que às vezes são bastante bizarros para as crianças, e talvez esse seja um dos motivos de seu fracasso de bilheteria. Mas você sabia que o próprio Walt Disney não gostou do filme, mesmo quando era apenas um projeto na salinha de sua equipe de animação?
Em seu livro Walt Disney: O Triunfo da Imaginação Americana, o autor Neal Gabler detalha a realização do filme e a origem do projeto, explicando essa rejeição.
Já em 1933, foi a atriz Mary Pickford quem pediu a Walt que adaptasse o romance de Lewis Caroll misturando animação e live-action, como a Disney já fazia com os curtas Alice’s Comedies, lançados na década de 1920, e já inspirados em Alice no País das Maravilhas. A atriz oferece uma quantia considerável a Walt para financiar o projeto e distribuí-lo por meio da empresa que ela co-criou, a United Artists. O produtor não responde. Três anos depois, quebrou o contrato de distribuição que o unia ao United para passar para a RKO, com um número muito maior de cinemas.
Qual foi a última princesa criada por Walt Disney? Morte do fundador abalou o estúdio por décadasO romance Alice no País das Maravilhas caiu em domínio público, mas Walt ainda compra os direitos de publicação do livro ilustrado por John Tenniel em 1938. Estamos então logo após o lançamento de Branca de Neve e os Sete Anões, um grande sucesso. O projeto continuará sendo um projeto de desenvolvimento por muitos anos, com o roteiro mudando de uma mistura de live-action/animação para um filme de animação puro e os escritores lentamente arrancando os cabelos.
Um deles, o romancista Aldous Huxley, passa o tempo sendo interrompido por Walt durante as reuniões e bate à porta após cinco reuniões de redação. Outro, Bob Carr, descobre que o romance não contém história e que Alice "não tem personagem, ela é o palhaço branco contra um bando de quadrinhos malucos. Nenhum personagem principal deveria se encontrar nessa situação insustentável".
Walt está bem ciente dos problemas: ele não consegue criar o visual final de Alice com o departamento de animação. Ele acha a personagem "muito fria, sem emitir calor". Os animadores estão trabalhando paralelamente neste projeto e em Cinderela, que está para sair. Ben Sharpsteen até sussurra que Walt se sente compelido a liderar o projeto "quer ele goste ou não", porque "pessoas muito sofisticadas" estão insistindo para que ele o lance.
Os roteiristas continuam caminhando, e Walt admite que desistiria se Peter Pan estivesse pronto e pudesse ocupar o lugar, exceto que ele não está. Seu irmão, Roy Disney, odeia o projeto e teria jogado a toalha se fosse o único tomador de decisão. Em suma, todos veem a catástrofe se aproximando, mas o filme é lançado mesmo assim em 28 de julho de 1951, um ano e meio depois de Cinderela e sete meses antes de Peter Pan.
Na época de seu lançamento, Alice no País das Maravilhas enfrenta outra Alice, também lançado em julho, dirigido por Dallas Bower com Carol Marsh no papel-título e misturando live action e bonecos. Walt tenta se opor, em vão. Em bilheteria, o longa rende apenas 2 milhões de dólares para um orçamento de 3 milhões.
Entrevistado sobre esse fracasso, Walt julga ter "se encurralado", descrevendo o filme como uma "grande decepção". “É terrivelmente difícil trazer a fantasia para a tela”. Acrescenta em outra entrevista, ainda citada no livro de Gabler: “Não sentimos nada, mas nos obrigamos a isso”.
O filme será, no entanto, redescoberto pela contracultura dos anos 60 e reavaliado. Seu lançamento em VHS contribuirá para sua popularidade com as gerações subsequentes e validará que o filme, como muitos clássicos da Disney, estava à frente de seu tempo.