“Um homem tem de ser um pouco louco, senão ele nunca vai ousar se soltar e ser livre.” Zorba.
Rever "Zorba" é sempre um convite prazeroso. Pessoalmente, é um filme que remete várias lembranças das mais diversas fases de minha vida. O mais admirável do filme é a sua simplicidade herdada do neo-realismo, algo quase impossível de se ver no cinema atual, e provavelmente pelas características de nossa geração individualista.
O paradoxo em "Zorba", está nos seus traços de singelez que ganham uma dimensão esplêndida. Tudo é tão bem realizado que até os deslizes acabam sendo irrelevantes, embora existentes. Os erros pontuais do filme, talvez se caracterizem pela relação de adaptação do romance homônimo de Nikos Kazantzakis, tendo o roteiro e direção assinadas por Michael Cacoyannis.
Ao fragmentar um momento da vida entre o encontro do jovem Basil (Alan Bates) com o Zorba (Anthony Quinn) passando pelas relações de trabalho, companheirismo e finalizando com a despedida desses amigos, temos nesse fragmento de momentos, inserções em estilo de crônicas da vida que nem sempre pontuam ou constroem relações, além disso, ao centralizar o filme na relançar entre esses dois amigos, perdemos, e em total mérito pela qualidade artística e interpretativa, figuras interessantíssimas como a brilhante Madame Hortense (Lila Kedrova), a Viúva (Irene Papas) e o louco/bobo da cidade (Sotiris Moustakas). Além de todos esses personagens, acrescente os moradores do vilarejo de Creta (onde se passa a maior parte da história), que oscilam entre um grande coro de representação dos habitantes locais e em outros momentos, essa massa da população consegue a proeza de serem os protagonistas de "Zorba", influenciando nos enredos e determinando situações.
Talvez o ponto mais fraco do roteiro, se dê na não relação em particular, com a história das mulheres do filme, a viúva e a Madame, ambas são aparentemente um recurso para simbolizar, uma específica relação amorosa na vida dos dois amigos, mas que são apenas uma diante das outras que já vieram e das outras que ainda virão, a propósito, o filme fornece poucas pistas sobre o passado e mais poucas ainda sobre o futuro das personagens Zorba e Basil, o que não é algo negativo, se existe algo que o neo-realismo pontua com clareza, é o vai e vem de histórias que nos atravessam.
Destaque especial para a fotografia de Walter Lassally e a direção de arte de Vassilis Photopoulos, ambas, merecidamente premiadas com o Oscar em suas respectivas categorias e que são marcantes até hoje, uma verdadeira aula de composição e feição artística, o reflexo disso é notável também na qualidade da reprodução do filme.
Um à parte que se faz necessário aqui, é pela qualidade no trabalho de todos os atores, indiscutivelmente excelentes, com atenção especial para a atuação feminina e em grande destaque, Anthony Quinn, um ator sem dúvidas, invejável. Quando conhecemos um pouco sobre a história desse ator mexicano, que foi lutador de boxe… enfim, quando conhecemos um pouco mais sobre sua vida e carreira, nosso queixo cai e ficamos ainda mais admirados com seu trabalho. Quinn, realizou em "Zorba" um feito raro para muitos outros atores, compor uma personagem atemporal, que até hoje é referenciada e reverenciada. Sem dúvidas, um brilhante trabalho de um ator igualmente brilhante.