Creio que "O bebê de Rosemary" seja muito mais que um filme de suspense e terror. A sutileza extrema de sua linguagem o coloca em um patamar artístico. "O bebê de Rosemary" é um poema cinematográfico tenebroso, onde o pior e mais cruel não é falado nem visto. O filme começa com uma suave canção de ninar ; mais se parece a trilha de uma obra romântica. Os diálogos iniciais também são muito tranquilos e cotidianos , embora já forneçam pistas importantes para o desenrolar do filme. Durante toda a trama , mesmo quando já temos certeza dos horrores que cercam a doce e ingênua protagonista , nada de concreto é ofertado ao público. Os mais céticos podem levar muito tempo para aceitar que a jovem Rosemary realmente está encurralada em uma conspiração satânica. Ironicamente , a intenção de Polanski era fazer o espectador acreditar que Rosemary sofria de alucinações e imaginava coisas , por ser o diretor ateu, portanto descrente das figuras de Deus e do diabo. Porém, felizmente , seu intento falhou e acabou produzindo uma das obras mais aterrorizantes e dramáticas sobre o lado oculto do mundo. Creio que Polanski tentou refazer "O bebê de Rosemary" 8 anos mais tarde , por meio do filme "O inquilino" , uma obra bastante interessante sobre o duplo e a loucura. Apesar de extremamente assustador, "O bebê de Rosemary" é também um filme muito dramático. Creio que os grandes filmes de terror sejam dramáticos em suas raízes; o terror deriva de uma situação muito triste , que conduz a consequências igualmente sofridas. Basta relembrarmos "O iluminado", "Carrie, a estranha" e "O exorcista" , que foi baseado em um romance verdadeiramente dramático sobre a perda da fé , sobre a culpa e sobre os inocentes expiando os pecados do mundo. O final de "O bebê de Rosemary" nos deixa profundamente tristes e melancólicos porque a personagem chega a uma situação insolúvel. O mais interessante da obra é verificar que sem uma cena violenta ou visualmente assustadora , com rostos desfigurados ou personagens que olham para a câmera com um sorriso macabro ou olhos vermelhos, Polanski fez um cult do terror, que é todo costurado por uma série de coincidências estranhas , pessoas gentis demais e uma gravidez fora dos padrões sem motivo aparente. Merece destaque a cena em que vemos marcas na parede , na casa dos vizinhos de Rosemary , indicando que eles trocaram os quadros que ali estavam por obras mais convencionais. As marcas passam quase despercebidas, o que confere um elemento semi oculto. Como dizia Hitchcock ,pior que uma bomba explodindo é a expectativa de que ela vai explodir. Aquelas marcas são um aviso sutil de que o casal esconde algo e esta sensação é terrível. O grande armário que esconde uma porta , que dá acesso a outro apartamento também é um elemento perturbador , embora aparentemente não tão importante em um primeiro momento. A cenografia é um item muito relevante neste filme porque o prédio antigo e charmoso, com uma aura de extrema respeitabilidade nos mostra que o pior , muitas vezes , está onde menos esperamos. Outra cena que merece destaque é a que Rosemary fica semi consciente e presencia algo , que ela imagina ter sonhado depois. Os limites entre sonho e realidade e o questionamento da verdade , mesmo que por um breve instante , fornecem a qualquer filme um ingrediente muito valioso: o mistério. Para os apreciadores do gênero, vale a pena conferir !