Em 1990, Jorge Furtado, diretor dos longas, Houve uma vez dois verões (2002), O Homem que copiava (2003), Meu Tio Matou um Cara (2004) e Saneamento Básico (2007), levou o Urso de Prata de melhor curta no Festival de Berlim por esta amarga demonstração da lógica capitalista. Estruturado com o mais básico dos telecursos, Ilha das Flores mapeia a trajetória de um tomate na sociedade de consumo. Numa série de vinhetas secas e irônicas, nas quais a encenação de um registro documental é intercalada com animações toscas e imagens de arquivo, a fruta sai da plantação de um fazendeiro, o Sr. Suzuki, passa pela cozinha de dona Anete, uma dona-de-casa da classe média, e vai parar no lixão da Ilha das Flores, na periferia de Porto Alegre, onde porcos (primeiro) e pobres (depois) colhem sobras para a alimentação. Em 12 minutos, o filme sobe e desce essa cadeia alimentar e se depara com seres humanos nas duas extremidades, todos dotados de “telencéfalo altamente desenvolvido e polegar opositor”, como reiterado pela narração de Paulo José, mas nem todos dotados de dinheiro. O texto, como de praxe no cinema de Furtado, é o triunfo. Concebido para “ser compreendido até por marcianos”, recorre à repetição do óbvio nas definições do que seja ser humano, tomate, porco, dinheiro e justapõe tais conceitos via raciocínio frio, mecânico, no padrão “A leva a B, que leva a C”. O tom de bizarria preparara o terreno com perfeição para a puxada de tapete no final, quando o humanismo do filme se revela. Com Ciça Reckziegel, Douglas Trainini e Júlia Barth.