Não pense que se trata de um documentário pastiche no qual a beleza da natureza sairia ressaltada e o homem maravilhado com os desígnios divinos na criação do universo. Caso você queira esse tipo de material basta sintonizar a sua televisão a cabo nos canais que só passam tal tipo de programação 24 horas por dia. Com Werner Herzog o buraco é mais embaixo. O diretor alemão ganhou notoriedade pela qualidade do seu cinema e por algumas excentricidades. Uma delas foi cismar em transportar um barco pela floresta amazônica - sem haver condições materiais para tal - para acabar de filmar "FITZCARRALDO". Nada mais natural que Werner Herzog se interessasse pela vida do ambientalista Timothy Treadwell, um bipolar de carteirinha (pelo que pude observar nas filmagens que o próprio Treadwell fez nas várias temporadas em que ele permaneceu numa reserva ambiental no Alaska), ex-alcoolista, que chegou a conclusão que era melhor viver entre os ursos do que entre os humanos. Treadwell permanecia junto dos ursos nas primaveras e verões, filmava e voltava para a California no inverno e no outono, época em que divulgava o seu material. Qual seria, então, a diferença entre Timothy Treadwell e outros documentaristas da vida selvagem? A resposta é que Treadwell queria provar que os ursos eram superiores à civilização. Em suma, nós mortais vivemos na barbárie, ao contrário dos ursos "grizzlies" (os mais ferozes ursos na face da terra). É evidente que o senhor Treadwell é portador de algum transtorno mental, facilmente diagnosticado até pelo menos dotado de conhecimentos psiquiátricos. Ele ultrapassou todas as barreiras da sandice: não mantinha distância dos ursos, nominava-os um a um, fazia discursos contra a sociedade, falava sem parar, isso tudo filmado pelo próprio Treadwell. A Herzog coube selecionar o melhor material para o documentário, além de entrevistar os pais, amigos íntimos (muito poucos, por sinal) e a ex-namorada de Treadwell. O cara acabou como todo mundo imaginava: engolido por um urso. Esta é a força da natureza que Treadwell não conseguiu entender. Infelizmente, ele levou a sua namorada para o mesmo destino. Numa certa altura do documentário, Herzog, que além de diretor faz a narração, comenta de que ele próprio já havia se deparado com atores que se imaginavam acima de tudo e de todos. No caso, ele faz referência a um de seus atores prediletos, Klaus Kinski, conhecido criador de confusões nos sets de filmagem. Reza a lenda que Werner Herzog e Klaus Kinski saíram no tapa devido à megalomania do segundo nas filmagens de "AGUIRRE, A CÓLERA DOS DEUSES", filme clássico, de 1972, que está a venda por R$ 9,90 nas Lojas Americanas. Não percam "O HOMEM URSO" e "AGUIRRE".