Shrek Forever After (2010) marca o capítulo final da icônica franquia Shrek (pelo menos até o recente anúncio de um quinto filme em desenvolvimento). O longa, dirigido por Mike Mitchell e roteirizado por Josh Klausner e Darren Lemke, apresenta uma abordagem mais introspectiva ao explorar as frustrações de Shrek com sua rotina e o desejo de reviver seus dias como um ogro temido. Ao contrário do humor subversivo e das sátiras afiadíssimas dos primeiros filmes, esta sequência busca um tom mais emocional e reflexivo, utilizando uma premissa inspirada em A Felicidade Não se Compra (It's a Wonderful Life, 1946) para explorar o valor da família e a aceitação da própria identidade. Embora tenha sido um sucesso de bilheteria, arrecadando US$ 752 milhões mundialmente, a recepção crítica foi mista, com elogios à animação e ao desenvolvimento de Shrek, mas críticas à previsibilidade da trama e à ausência do brilho cômico dos antecessores.
A história parte de um evento do passado, onde os pais de Fiona quase assinaram um contrato com Rumpelstiltskin para libertá-la da maldição. Com a intervenção de Shrek em Shrek (2001), o pacto nunca foi selado, e Rumpel nutre ressentimento contra o ogro. No presente, Shrek se sente preso em uma rotina tediosa, cansado da fama e do papel de pai de família. Após um acesso de frustração durante o aniversário de seus filhos, ele cruza o caminho de Rumpelstiltskin, que lhe oferece um contrato para viver um dia como um "ogro de verdade" em troca de um dia de sua infância. No entanto, Shrek descobre que o contrato o transportou para uma realidade paralela na qual ele nunca nasceu, Fiona nunca foi resgatada e Tão Tão Distante está sob o domínio de Rumpel.
Essa estrutura narrativa permite que o filme explore uma nova faceta do protagonista. Diferente das aventuras anteriores, que subvertiam os contos de fadas clássicos, Shrek Forever After investe na jornada emocional do personagem, enfatizando temas como a valorização da vida cotidiana e a importância de reconhecer a felicidade nos momentos simples. A relação entre Shrek e Fiona é redesenhada, pois, nesta realidade, ela se tornou uma guerreira independente e desconfiada, sem lembranças do amor que os unia. Essa mudança oferece um novo ângulo para a dinâmica do casal, mas também limita o desenvolvimento emocional de Fiona, que passa grande parte do filme com um arco centrado na desconfiança.
As atuações de voz continuam sendo um dos pontos fortes da franquia. Mike Myers mantém a essência de Shrek, equilibrando o sarcasmo com um tom mais vulnerável e introspectivo. Eddie Murphy e Antonio Banderas retornam como Burro e Gato de Botas, respectivamente, mas seus personagens têm menos destaque e servem mais como alívio cômico secundário do que como figuras centrais na jornada de Shrek. Cameron Diaz, como Fiona, entrega uma interpretação mais séria, refletindo a nova versão de sua personagem. A grande adição ao elenco é Walt Dohrn como Rumpelstiltskin, um vilão caricato e manipulador que, embora tenha uma presença energética, não atinge o mesmo nível icônico da Fada Madrinha em Shrek 2 (2004). Seu plano de dominação funciona dentro da lógica do filme, mas carece de uma ameaça genuína que eleve a tensão dramática.
O roteiro, apesar de ter uma premissa interessante, segue um desenvolvimento relativamente previsível. A estrutura narrativa de um "mundo alternativo" e a necessidade de desfazer um contrato mágico já foram exploradas em inúmeras outras produções, e Shrek Forever After não adiciona muitas inovações a esse conceito. O humor, marca registrada da franquia, é mais contido e menos incisivo, optando por piadas situacionais e visuais em detrimento da sátira afiada que caracterizou os filmes anteriores. O tom mais sério e introspectivo pode ser um fator determinante para a recepção dividida do público.
Visualmente, o filme demonstra a evolução tecnológica da DreamWorks Animation. A qualidade da animação é superior à dos anteriores, com texturas mais realistas, expressões faciais aprimoradas e um trabalho refinado em iluminação e cenários. A ambientação da realidade alternativa de Tão Tão Distante é visualmente distinta, com um aspecto sombrio que reflete a opressão imposta por Rumpelstiltskin. As cenas de ação são bem coreografadas, especialmente nos confrontos entre os ogros rebeldes e as bruxas do vilão. No entanto, apesar dos avanços técnicos, a estética geral do filme não inova drasticamente em relação aos antecessores, mantendo a identidade visual estabelecida pela franquia.
A trilha sonora, elemento marcante nos primeiros filmes, aqui perde parte de seu impacto. O uso de músicas licenciadas ainda está presente, mas sem o mesmo efeito memorável de canções como All Star (Shrek) ou Holding Out for a Hero (Shrek 2). A composição original de Harry Gregson-Williams mantém o tom épico e aventuresco, mas sem grandes momentos que se destaquem. Esse aspecto contribui para a sensação geral de que o filme carece de um diferencial marcante em relação aos anteriores.
O desfecho do filme reforça a mensagem central sobre gratidão e valorização da vida que se tem. Após se sacrificar para salvar Fiona e os ogros, Shrek começa a desaparecer, mas é salvo pelo beijo de Fiona, desfazendo o contrato e restaurando a linha do tempo original. O retorno ao presente permite a Shrek um novo olhar sobre sua vida, levando-o a abraçar sua família e amigos com uma nova apreciação. Embora o final seja satisfatório e emocionalmente eficaz, ele também não surpreende, reforçando a previsibilidade da história.
No balanço geral, Shrek Forever After é uma despedida sólida para a franquia, embora sem o mesmo brilho dos primeiros filmes. Seu tom mais introspectivo e sua estrutura narrativa previsível podem ter decepcionado fãs que esperavam o humor irreverente e a criatividade subversiva que marcaram os filmes anteriores. Ainda assim, sua qualidade técnica, boas atuações de voz e a jornada emocional de Shrek garantem um desfecho digno para a saga do ogro. Comercialmente, o sucesso de bilheteria reafirma o apelo da franquia, mas a recepção crítica mais morna reflete a percepção de que a série havia atingido um ponto de desgaste criativo. Com um quinto filme em desenvolvimento, resta saber se a DreamWorks conseguirá revitalizar a fórmula e trazer de volta a magia que fez de Shrek um marco na animação moderna.