As Cruzadas foram uma série de expedições que possuíam o objetivo de assegurar o domínio cristão sobre os lugares sagrados que eram controlados pelos muçulmanos. As lutas duraram dos séculos 11 ao 14. O filme “Cruzada”, do diretor Ridley Scott, se passa durante a Terceira Cruzada, ocorrida nos anos de 1189 a 1192. Nessa época, cristãos e muçulmanos conviviam pacificamente em Jerusalém. Resultado dos esforços dos Reis Saladin (muçulmanos) e Baldwin IV (cristãos).
A primeira hora de “Cruzada” é determinante para o resto do filme. São nestes momentos que iremos conhecer Balian (Orlando Bloom, protagonizando um filme pela primeira vez), um ferreiro que está de luto pela morte da esposa e do filho. Balian está sem perspectivas na vida quando recebe a visita do Barão Godfrey de Ibelin (Liam Neeson, em uma participação marcante), que se apresenta como seu pai e o convida a se tornar um cavaleiro e a defender o Reino Latino de Jerusalém, governado pelo Rei Baldwin IV (Edward Norton, escondido por trás de uma máscara de ferro), um homem condenado à morte devido à lepra que tira suas forças.
Godfrey sabe do momento difícil pelo qual Balian está passando, por isso apresenta a ida a Jerusalém (apresentada, no filme, como o mundo novo, aonde existe amor ao invés de ódio) como uma jornada de redenção, na qual o filho irá se redimir dos seus pecados e salvará a alma da esposa suicida. Diante de tal argumento, Balian não tem como recusar a proposta do pai e embarca nessa viagem de autodescoberta na qual ele surge como um novo raio de esperança para o povo de Jerusalém.
Apesar da convivência pacífica existente entre cristãos e muçulmanos, eram muitos aqueles (de ambos os lados) que queriam ver a luta armada entre os dois povos. Os Cavaleiros Templários, a mando do Papa, contavam com a ajuda de Guy de Lusignan e de Reynald de Châtillon (Brendan Gleeson) para assassinar muçulmanos. Tais ataques causavam ira em Saladin (o excelente ator sírio Ghassan Massoud) e fragilizavam a relação que ele tinha com o Rei Baldwin IV. A guerra não tardaria a acontecer. Com a morte de Baldwin e o ataque à irmã de Saladin, ela começou e resultou na retomada do controle de Jerusalém pelos muçulmanos.
“Cruzada” é um filme que quebra muitas convenções do cinema. Pela primeira vez, vemos os muçulmanos serem retratados como pessoas normais sem serem taxadas de terroristas ou causadores do mal do mundo. E há muito tempo que não vemos um filme no qual não existem mocinhos ou vilões (com a exceção de Guy de Lusignan e Reynald de Châtillon), um lado vencedor ou um lado perdedor. Cada uma das partes retratadas têm uma justificativa para os seus atos. Você pode até não concordar com elas, mas não irá julgar as decisões que foram tomadas.
O filme possui muitas virtudes: um cuidado com o visual e com as cenas de luta (uma marca do diretor Ridley Scott), um roteiro que contém mensagens belas e é bastante atual e um excelente elenco de apoio. É essa última virtude que expõe o grande defeito de “Cruzada”: Balian é uma personagem tão apática quanto a atuação de Orlando Bloom. A platéia se engana quando pensa que ele é o herói do filme. Esse posto pertence aos reis Saladin e Baldwin IV, homens nobres e de extremo caráter, que provaram que a diplomacia e a tolerância são a principal saída para os conflitos do Oriente Médio. Se isso foi possível há mil anos atrás, o que impede que isso ocorra novamente nos dias de hoje? É essa a grande mensagem que “Cruzada” nos deixa.