Eu estou um tanto confuso, pois este filme me proporcionou um misto de sensações positivas inexplicáveis, Uma vez que fora baseado em um livro hermético de Virgínia Woolf, especialista em escrever livros utilizando o fluxo de consciência, e eu me propus a ler, assimilei que nem o livro, nem o filme possuem mensagens nítidas ou simbolismos ocultos. É simplesmente uma história fantástica, sem um escopo, sem precisar dizer a que veio. Consegui me manter imerso no universo do filme, sobretudo, devido à atuação excepcional de Tilda Swinton (esse diva vale o ingresso de qualquer filme) com sua voz melodiosa e seu sotaque perfeito para a leitura de textos poéticos, além de aparência sabidamente andrógina e sua habilidade em interpretar personagens de sexos duvidosos. Eu compreendo que inúmeras pessoas assistam a Orlando e imaginem se há qualquer conotação ou crítica em favor da transsexualidade ou acerca do papel feminino na sociedade inglesa elisabetana. De fato, tanto no livro quanto no filme, Orlando começa como um homem machista, controlador, presunçoso até certo ponto (considerando a classe dos poetas como visionários, pessoas com uma visão acima das outras, e atribuindo a si mesmo o título de poeta), até o ponto em que que conhece uma mulher cossaca e a deseja para si; logo após, ela parte, marcando seu coração. Em seguida, conhece seu poeta favorito, o qual o desaponta em todos os aspectos possíveis, aproveitando-se da complacência e bondade de Orlando para se mostrar um grande babaca mal-agradecido. Enfim, a troca de sexo transformou a sua visão e o modo de vida de tal modo que ele passa a enxergar o mundo sob as limitações da mulher no século XVIII e aprender a lidar com tais problemáticas. Parece-me uma alegoria da figura humana, deslocada do contexto reprodutivo, no processo de compreender as vivências humanas, nossa hipocrisia, a ironia de certos acontecimentos, a crueldade despropositada, as injustiças, o comportamento associado aos homens e às mulheres. Tudo isso da perspectiva de um ser que, à primeira vista, não têm sexo, é apenas humano. Para mim, foi uma experiência única, em que não me preocupei em momento algum com a passagem do tempo, sem que eu me questionasse exatamente sobre a mensagem que desejava passar e sequer com o ponto onde iria chegar (pois não chega em lugar algum). A conclusão vêm de um forma abrupta, sob uma trilha sonora maravilhosa, e o filme parece esperar que tudo o que você tenha visto aquele ponto faça algum sentido ou, se não fez, que seja, ao menos, satisfatório. Para mim, foi bem mais que isso.