A grande virtude de “Eterno Amor”, filme do diretor francês Jean-Pierre Jeunet (“O Fabuloso Destino de Amelie Poulain”), é fugir do rótulo que rodeia os filmes de guerra. É claro que, no filme, existem cenas extremamente reais nos campos de batalha, mas esta história está relegada a um segundo plano. Para Jeunet e Guillaume Laurant, autores do roteiro de “Eterno Amor”, o importante é destrinchar a história por trás de cada soldado que batalha na guerra, a de suas famílias e das mulheres a quem eles amaram.
Todos os acontecimentos de “Eterno Amor” giram em torno de dois conceitos. O primeiro deles é o de que a guerra não é justa. A justiça não existe quando ela tira jovens do auge de sua vida e nem do lado daqueles que venceram a batalha. Da mesma maneira, a guerra imprime mudanças permanentes na vida daqueles que se aventuram nela. “Eterno Amor” se passa na I Guerra Mundial e começa contando a história de cinco soldados franceses que se automutilaram para serem liberados de seus deveres no exército francês (aparentemente, essa era uma prática comum nas tropas, atingindo aqueles que eram mais sensíveis aos horrores da guerra). Os cinco soldados foram condenados à morte e abandonados em uma trincheira à mercê dos inimigos alemães. Um destes soldados era o jovem e idealista Manech (Gaspard Ulliel), órfão de pai e mãe e noivo apaixonado da não menos idealista Mathilde (a ótima Audrey Tautou, mais adorável do que nunca).
Quando Mathilde recebe uma carta do governo francês notificando-a da morte de Manech, ela se recusa a acreditar em tal possibilidade. Se Manech estivesse morto, ela sentiria. Para os cinco soldados abandonados na trincheira, o fio de telefone era uma esperança de vida (por meio dele, poderia vir o perdão do presidente francês). Mathilde se agarrará a esse mesmo fio e às mínimas coisas da vida, de forma a manter as suas esperanças acesas (essa é a deixa para o segundo conceito presente no filme: enquanto existir esperança, você deve continuar acreditando em algo). Ela tem certeza de que irá encontrar Manech. Em consequência disso, Mathilde contrata um detetive particular e não hesita em gastar o dinheiro de sua herança para encontrar qualquer pista que a leve a seu noivo.
A partir deste momento, “Eterno Amor” entra em uma série de histórias paralelas – e igualmente interessantes – sobre os acontecimentos da trincheira, os cinco soldados e suas famílias (uma delas é protagonizada por Jodie Foster). Histórias estas com um único ponto em comum: a presença de pessoas que, estarrecidas com as crueldades da guerra, fariam de tudo para sair dela – ou, então, devolveriam todo o sofrimento que ela lhe causou. Podemos encontrar neste segmento do filme, uma incrível semelhança com a história de “Cold Mountain”, do diretor Anthony Minghella, longa que retratava a história de um soldado (Inman, interpretado por Jude Law) desiludido com a guerra, que foge de seus deveres militares e embarca numa jornada de volta para casa e para os braços de seu grande amor (Ada, interpretada por Nicole Kidman). No caminho de Inman, ele encontra várias pessoas que o ajudarão a chegar ao seu propósito final.
À primeira vista, o lado sombrio de “Eterno Amor” foge de tudo aquilo que Jean-Pierre Jeunet realizou em sua carreira. Entretanto, o diretor aborda este lado sombrio com a mesma fantasia e o lirismo que marcam seus trabalhos anteriores, como “Delicatessen” e o já citado “O Fabuloso Destino de Amelie Poulain”. Com a ajuda das excelentes fotografia de Bruno Delbonnel e da direção de arte de Aline Bonetto (ambas merecidamente indicadas ao Oscar 2005), “Eterno Amor” é o trabalho mais maduro deste renomado diretor francês.