Apesar de estar situado nos Estados Unidos dos anos 40, a maior constatação que o diretor e roteirista Bill Condon faz em “Kinsey – Vamos Falar de Sexo” é a de que os Estados Unidos não mudaram. O mesmo conservadorismo e moralismo que estavam presentes há mais de sessenta anos permanecem enraizados na sociedade norte-americana até hoje. A maior prova disso foram os protestos realizados – claro – por grupos religiosos (um dos quais recebia o curioso nome de “Virgens Renovadas”) nas portas dos cinemas que exibiam o filme.
Esta foi a mesma recepção que esperou o biólogo, professor e pesquisador da Universidade de Indiana Alfred Kinsey (o excelente ator Liam Neeson) quando, com o auxílio de sua equipe de entrevistadores (interpretados por Peter Sarsgaard, Timothy Hutton e Chris O’Donnell), lançou os livros “Sexual Behavior in the Human Male” e, posteriormente, “Sexual Behavior in the Human Female”. Os dois livros faziam um panorama do comportamento sexual de homens e mulheres, provando que os desejos e fantasias de ambos os sexos, por mais estranhos que parecessem, eram absolutamente normais.
Na época em que Kinsey realizou estes estudos, o sexo era considerado um tabu (de certa forma, até hoje, o assunto ainda é). Acreditava-se que a masturbação, homossexualismo e o adultério, só para citar alguns casos, eram uma coisa suja, ou pior, uma doença. O sexo não era nada natural – nem mesmo entre as pessoas casadas. Ninguém ficava confortável em discutir ou, sequer, tentar realizar o ato. A pesquisa que Kinsey realizou foi justificada com base em sua própria vida pessoal. Filho de um pastor (John Lithgow) que apregoava a sujeira do sexo e dos vícios, Kinsey foi um garoto, adolescente e homem recluso, do tipo que só se dedicava aos animais que tanto amava (o estudo das diversas espécies de vespas tomou grande parte de sua vida) e que só conseguiu se libertar disso quando conheceu a estudante Clara McMillen (a ótima Laura Linney, que foi indicada ao Oscar 2005 de Melhor Atriz Coadjuvante pela sua performance neste filme), que era uma de suas alunas e com quem ele veio a se casar.
As pesquisas lideradas por Alfred Kinsey mostraram que o sexo apesar de ser prazeroso, também pode magoar e machucar. Os métodos de pesquisa que Kinsey utilizava eram bastante incomuns e controversos: ele estimulava o sexo grupal, homossexual e a troca de esposas entre sua equipe de entrevistadores – ignorando os sentimentos que estavam em jogo ali. Ao mesmo tempo em que ouvia passivamente o relato de pessoas que diziam ter feito sexo com meninos e meninas pré-adolescentes. Tudo isso pelo bem da ciência e da vida sexual dos casais, é claro.
Poucos filmes falaram do sexo de uma maneira tão honesta e, principalmente, sem apelações como “Kinsey – Vamos Falar de Sexo”. O filme é importante, pois lembra uma época na qual o sexo deixou de ser tratado por baixo dos panos e passou a ser um assunto obrigatório nas rodas de conversa – para o bem ou para o mal. No entanto, “Kinsey – Vamos Falar de Sexo” não é um filme excitante (com o perdão do trocadilho), pois possui muitos problemas de roteiro, especialmente nos minutos que antecedem ao seu desfecho, quando Kinsey, depois de perder apoios importantes – e fundamentais – para a realização de sua pesquisa, volta ao habitat que iniciou seu amor pela biologia – a floresta – e se depara com uma questão que, cedo ou tarde, todos nós iremos enfrentar: E agora? A resposta está no filme, mas como Kinsey voltou ao jogo é uma informação que Bill Condon não compartilha conosco.