Definitivamente o século XX e o início dos anos 2000 foi a Era de Ouro de Hollywoody. Com grandes sucessos tanto de pública quanto de crítica que viriam a revolucionar o universo cinematográfico, como a trilogia O Poderoso Chefão de Francis Ford Coppola, De Volta Para o Futuro, Ben Hur (1960), a trilogia original Star Wars e outros clássicos dignos de todos os prêmios possíveis Hollywoody viveu uma de suas melhores épocas.
Em 1976 chegaria aos cinemas o longa Rocky, Um Lutador, estrelado por Sylvester Stallone e que tinha como objetivo contar a ascensão de um lutador de boxe desgastado pela vida. Felizmente o filme funcionou de maneira perfeita, lucrando o suficiente para futuras continuações (não tão boas e necessárias quanto o primeiro) e se tornando marcante a ponto de ser uma obra prima dos filmes de esporte. Seguindo o exemplo e a fórmula da produção de Stallone, surgiria o projeto The Karate Kid, que chegaria oito anos mais tarde aos cinemas, exatamente em 1984. Seguindo praticamente a mesma linha de raciocínio, o longa dos anos 80 só muda seu público alvo geral — que aqui se tornam os adolescentes — e tenta transmitir uma mensagem além de superação. E assim como outras produções, mesmo não sendo tão original, Karatê Kid — A Hora da Verdade se tornou uma das meninas de ouro de Hollywoody na época.
O filme conta a história do jovem Daniel LaRusso (Ralph Macchio) que se vê obrigado a se mudar de Newark, Nova Jersey, para a Califórnia, já que a sua mãe havia conseguido um novo emprego. Daniel tenta se adaptar a sua vida nova e logo conhece uma nova amiga: Ali Mills (Elisabeth Shue). Porém a proximidade com a garota de bairro rico lhe trará problemas com seu ex-namorado: Johnny Lawrence (William Zabka), lutador de karatê que inconformado com o término do namoro fará de tudo para infernizar Daniel. O jogo vira quando LaRusso conhece Mr. Kesuke Miyagi (Pat Morita), o encanador do prédio que resolve ensinar karatê a Daniel para que o jovem entre no torneio e enfrente Johnny e assim consiga resolver seus problemas.
Há um motivo simples — além de repetir uma fórmula de sucesso — para que Karatê Kid — A Hora da Verdade tivesse certas semelhanças com Rocky, um Lutador. Ambos os filmes detêm o mesmo diretor, John G. Avildsen. Sendo assim, a expectativa era muito grande em cima de Karatê Kid, já que Rocky Balboa já havia conquistado metade dos corações americanos.
A expectativa é bem atendida, e mantem o mesmo nível de Rocky, já que Avildsen resolve seguir a mesma linha de raciocínio e usa dos mesmos elementos de sucesso. Porém o longa estrelado por Ralph Macchio conta com aspectos negativos — assim como a falta de originalidade —, mesmos que escassos.
A começar pela trilha sonora. Aqui ela é dividida em dois. Temos a instrumental composta por Bill Conti, que embora não consiga compor sucessos tão marcantes como os de Rocky, repete seu excelente trabalho e faz com que a trilha sonora principal se grave em nossas cabeças ao acabarmos de assistir ao filme. O outro lado são as músicas oitentistas que o diretor Avildsen resolve usar na metade do filme. A música combina, acontece que em certos momentos — como Daniel correndo de Johnny no Halloween — ela poderia ser evitada para dar mais espaço a instrumental e assim dar mais ênfase e carga dramática nas cenas nas quais aparece.
Infelizmente o ator Ralph Macchio também não dá um excelente desempenho. Sim, ele encarna o protagonista e o espectador acredita e acompanha toda a trajetória de seu personagem, porém o jovem Macchio de 84 tinha poucas expressões faciais e não desempenhava seu papel bem, fazendo com que seu Daniel LaRusso fique insuportavelmente chato — indo além da proposta do adolescente irritante. Tanto que coadjuvantes como a personagem de Shue e de Morita — que tem um ótimo desenvolvimento — conseguem ser mais carismáticos que o protagonista.
Felizmente, os pontos negativos se encerram aí. Então, depois disso, Karatê Kid – A Hora da Verdade — ou simplesmente The Karate Kid, no original — se revela uma obra-prima e um dos clássicos de John G. Avildsen.
O roteiro fica nas mãos de Robert Mark que busca explorar vários pontos. Mark, embora atualmente decaído com os roteiros da trilogia Busca Implacável e Carga Explosiva, no filme adolescente o cineasta aproveita cada ponto. Contando uma história de superação Mark narra a típica Jornada do Herói, com Daniel deslocado e ao longo de todo caminho enquanto tenta provar que consegue ser capaz se adaptando aos poucos a Califórnia que tanto odeia e finalmente se sentindo em Casa.
Para começar, Robert Mark, ao lado de John G. Avildsen, acerta no principal, que se trata da vida adolescente. O pano de fundo usa os conflitos típicos, a adaptação a um lugar novo, nova namorada, problemas com colegas, mas quando começa a desenvolver a história deixa os clichês para trás e dá profundidade as situações buscando a originalidade — inclusive as filosofias do Sr. Miyagi.
Falando em filosofia o filme na verdade é todo trabalhado em cima do conceito do símbolo oriental yin e yang — que significa no geral a perfeita união dos opostos. Isso é gritante e trabalhado em praticamente todos os núcleos do filme. A relação controversa de Daniel com Ali; a amizade do Sr. Miyagi com LaRusso. E até o clímax do personagem de Macchio com o de Zabka. Todos são opostos que ao longo do filme são trabalhados e finalmente se unem — vide a belíssima cena de Johnny [Spoiler] entregando o troféu nas mãos de Daniel, vendo que havia errado e além de reforçar o yin e yang do filme traduzindo uma das mensagens importantes do esporte — a convivência pacífica entre os adversários. E ainda há mais: através dos diálogos bem trabalhados do Sr. Miyagi o filme nos dá uma sábia fonte de conhecimento sobre a vida — algo que vai além do típico conceito de certo e o errado.
Sendo assim Karatê Kid — A Hora da Verdade se torna um clássico de sua época, e marca a infância das crianças — e continua até hoje marcando, mesmo que o trabalho tenha sido passado para Jayden Smith. Um trabalho impecável e emocionante, vale a pena conferir cada minuto dessa aventura filosófica.
Nota: 8,9/10