Mystic River (br: Sobre meninos e lobos / pt: Mystic River) é um filme de 2003, do gênero drama e suspense, dirigido pelo aclamado e premiado diretor estadunidense Clint Eastwood, e estrelado por Sean Penn, Tim Robbins, Kevin Bacon, Marcia Gay Harden, Laurence Fishburne, Laura Linney, Tom Guiry, Emmy Rossum, Spencer Treat Clark, Andrew Mackin e Eli Wallach. Para início dessa crítica, posso adiantar que é um filme para poucos, para aqueles que curtem mistério, drama e curiosidade sobre as aflições humanas. Tal filme não é um blockbuster, longe disso, mas é um longa digno do seleto time de filmes considerados novos clássicos.
Baseado no livro Dennis Lehane, Sobre Meninos e Lobos conta a história de vida de três amigos de infância - Jimmy Markum (Sean Penn), Dave Boyle (Tim Robbins) e Sean Devine (Kevin Bacon) – estes por sua vez, tiveram suas vidas marcadas por um acontecimento trágico e hediondo há exatamente 25 anos: os amigos enquanto brincavam e se divertiam na rua foram abordados por dois homens que se identificaram como policiais, que obrigaram Dave (Tim Robbins) a entrar no carro, o que aconteceu com ele no decorrer dos dias do sequestro marcou a vida deste e dos amigos de forma traumática.
O tempo passa os três tornam-se adultos e se distancia, cada um tem sua vida, família, emprego, obrigações diárias. Até que o inesperado acontece, a filha de Jimmy (Sean Penn) foi assassinada de forma brutal e o encarregado de investigar o homicídio é Sean Devine (Kevin Bacon), assim um dos principais suspeitos é Dave (Tim Robbins), que esconde um segredo que sua própria esposa desconhece. Assim os três se aproximam novamente; com o decorrer da investigação, os três se deparam com fatos amargos de suas adolescências, fatos que eles preferiam nunca mais relembrar.
Depois de comandar sucessos de público e crítica como Cowboys do Espaço, Menina de Ouro, Cartas de Iwo Jima e entre outros filmes, Clint Eastwood mais uma vez supera a si ao dirigir Sobre Meninos e Lobos, abordando a individualidade dos seus personagens. Eastwood mostra que basta apenas uma tragédia ou um acontecimento muito forte para marcar nossas vidas de forma implacável; e é dessas tragédias que nasce a dualidade da sanidade e lucidez dos personagens tão bem ambientadas num universo frio e sem remorso. É dessa frieza que o espectador se choca ao se deparar com Sobre Meninis e Lobos, muitos podem ter saído da seção de cinema meio embasbacado com esta dualidade explorável. Ou seja, é um filme baseado na vida das pessoas comuns, pessoas reais, com seus anseios, torturas diárias e pequenos momentos de felicidade, tais momentos só encontrados no final.
É esta humanidade que concerne a força do longa, uma humanidade simples e chocante na visão de Clint Eastwood. Ele acertou em cheio! Precisei assistir a este filme três vezes para conseguir digerir todo o impacto que ele causa na primeira seção, para captar toda psicologia que há nele, e claro, para conseguir escrever esta crítica. Você deve está pensando “esse filme é uma desilusão”, é sim, é a falta de esperança de três amigos que não encontram felicidade ao relembrar aquilo que chocaram suas vidas sem sentido. Mas não há como negar que este aspecto frio é dado de forma graciosa, graças a seu elenco principal.
Tim Robbins é o ator, roteirista, cineasta e tudo mais, é simplesmente perfeito em seu personagem Dave Boyle, melancólico e de aspecto doentio após ter passado pelo sequestro dos falsos policiais. As lembranças deste fato faz com que Dave se torne um adulto introvertido e depressivo que não se apazigua consigo, mesmo tendo uma estabilidade familiar e financeira. O que ocorreu durante os dias de sequestro é a chave para o trauma de Dave, do fato de nunca ter se curado, de ter um filho que protege mais do que a si mesmo, pelo simples e horrível medo de que ocorra a ele o que aconteceu com ele. A sensibilidade da atuação de Robbins é emocionante, causando ao espectador sentimentos de pena e tristeza. Fazendo-nos pensar, “será que acontecerá com meu filho, o que fazer”? Ah, não posso contar o que aconteceu com Dave, se não estraga o filme, terão que assistir!
Sean Devine, personagem vivido por Kevin Bacon poderia ser o mais lúcido dos três, mas ele também guarda suas tristezas e frustações. Isso é visível na simples expressão de Bacon, interpretando um rosto frustrado por ter sido abandonado pela esposa, que no decorrer da história pensamos que são simples devaneios dele ao falar com a mulher sem rosto. Isso é magistral, a forma como Eastwood coloca a transição dele e sua esposa. Laurence Fishburne interpreta o parceiro de Sean, que parece conhecer um pouco da vida deste e entende suas inquietações. Principalmente por está emocionalmente envolvido em resolver o assassinato da filha de seu melhor amigo Jimmy Markum (Sean Penn).
E por falar em máximo de excelência em desempenho de atuação, não podemos de citar e exaltar em lugar de destaque merecido, o rebelde ator Sean Penn. Interpretando Jimmy Markum, um cinquentão, que preserva seu charme ao usar artifícios para compor um pai zeloso para suas filhas. No início pensamos que Jimmy não passa de um cara que guarda ainda sua rebeldia juvenil, se destacando apenas como dono de comércio e marido presente. Porém no decorrer do longa vemos que seu passado é bem pesado e que ainda mantém presente resquícios destes como porto seguro. É no momento da morte de sua filha que Jimmy se rever como ladrão e assassino ético a seu ver, matando e roubando os injustos. Sean Penn compõe um pai revoltado com a morte da filha, que busca de forma implacável seu assassino de forma violenta. Talvez a parte do filme que demostre a clareza de sua revolta é durante o encontro do corpo da filha, Jimmy grita, se debate e as berros implorando para ver a filha sendo impedido por vários policiais, é de sensibilizar qualquer um. Interrogando e torturando quem for preciso para encontrar pistas e respostas, Jimmy confronta o amigo e investigador Sean (Kevin Bacon) na forma pessoal de sua investigação.
Agora entendo por que Sean Penn prefira interpretar personagens encharcados de complexidade humana, ele dá conta do recado. Vemos isso ao interpretar um pai com problemas mentais em Uma Lição de Amor (2001), Milk (2008), pelo qual ganhou um Oscar de melhor ator principal. E antes deste prêmio veio outro Oscar por melhor ator no nosso Sobre Meninos e Lobos (2003) a interpretação de pai injustiçado e sedento de vingança lhe valeu vários prêmios, como um Globo de Ouro (prefiro este ao Oscar). Sean Penn é o ator completo, o melhor dessa geração (sempre foi um dos meus 10 preferidos) juntamente com outros grandes nomes, é evidente o talento deste.
O elenco todo é sublime, a direção de Clint Eastwood merece ser ovacionada, por vários motivos, o principal deles é a harmonia e a liberdade que dá aos personagens, cada um com suas complexidades e individualidades que vão compor um thriller de mistério; a forma como a película de filme é colocada é ilustre. O que Sobre Meninos e Lobos nos deixa é um legado de que ninguém é mau, simplesmente as decisões que tomamos afloram em consequências que estão fora de nosso controle, como um efeito borboleta assim como o final do filme expõe.
No fim do filme Sean (Kevin Bacon) vai ao encontro de Jimmy (Sean Penn) para revelar a ele que descobriu quem é o assassino de sua filha. Jimmy fica paralisado ao descobrir que cometeu um erro terrível, ao julgar outra pessoa como o suposto assassino. Sean olha de forma pesarosa a Jimmy e o pergunta: “onde está Dave”? Jimmy responde: “a última vez que vi Dave Boyle, foi no banco de trás daquele carro há 25 anos”. E assim se encerra de forma prolixa um dos melhores filmes de todos os tempos (em minha opinião). É o final de máxima magnitude que engrandece ainda mais esta obra do grande Clint Eastwood.
Bye, depois volto com mais críticas... Bjos!