A grande diferença de Lady Bird em relação aos inúmeros filmes que abordam o drama de pessoas que querem se encontrar na vida profissionalmente e emocionalmente está no enfoque suave mas ao mesmo tempo realista da diretora e roteirista Greta Gerwig – apenas em seu segundo trabalho por trás das câmeras, ela (que também é atriz) consegue atingir um resultado surpreendente e adorável para mostrar as ambições, medos, desejos e descobertas de Christine “Lady Bird” McPherson (Ronan), uma moça prestes à completar seus dezoito anos.
Auto batizada com o nome “Lady Bird”, a personagem de Saiorse Ronan é uma exemplificação do que muitos adolescentes passam quando a idade de decidir o futuro chega – mais especificamente sua profissão ou carreira – sua mãe, Marion (Metcalf), rejeita a ideia da filha tentar uma faculdade fora da cidadezinha em que vivem, Sacramento, na Califórnia. Estudando em uma escola de ensino médio católica, vamos acompanhar essa “fase de transição” de Lady Bird, mostrando seus primeiros amores (Hedges e Chalamet), sua relação com sua melhor amiga (Feldstein), a dificuldade em saber o que quer escolher para o futuro – confrontada com certos rótulos e resistências que a sociedade tenta impor – e sua relação com sua família, seu irmão (Jordan Rodrigues) e a namorada dele (Dayane Newton), seu pai Larry (Letts), que sofre com depressão e, principalmente, no conflituoso relacionamento com sua mãe, que discorda de muitas ideias e vontade de Christine.
Rodeada de personagens (propositalmente) buscando se encontrar na vida – mesmo os que já estão na vida adulta – o roteiro e a direção de Greta se mostram inspirados devido a sensibilidade com que são concebidos – há um evidente esforço para tornar crível o drama de cada papel – assim como a condução de atores da cineasta, possibilitando atuações abertas, espontâneas e bastante eficazes para trazer a tona os emocionais abalados de seus diversos personagens multifacetados – além do foco em Lady Bird, o talento da diretora aparece sobre os momentos em que o primeiro amor da moça, o garoto Danny, vivido pelo excelente Lucas Hedges (de Manchester À Beira-Mar), que sofre para conseguir assumir sua homossexualidade, justamente pela pressão de seus pais – e o enfoque na rebeldia aparentemente sem sentido do Kyle, do também ótimo Timothée Chalamet, é bem realçado para mostrar o impacto que certas atitudes dele causam em Christine – há ainda a boa atuação da amiga Julie, vivida por Beanie Feldstein, as dificuldades do pai de Lady Bird, vivido pelo eficiente Tracy Letts, que precisa arrumar um novo emprego, e uma pequena (mas tocante) participação de Stephen Henderson como o Padre Leviatch, um dos professores da escola – especificamente na cena onde ele tenta fazer uma sessão de terapia, onde ele acaba sendo o primeiro a chorar por lembrar de fatos de seu passado.
Ainda que fortemente bem desenvolvido, o roteiro do filme se sustenta muito bem pela dinâmica incrivelmente clara e direta entre Saiorse e Laurie Metcalf – as duas, como mãe e filha, respectivamente, impressionam com suas atuações, que jamais passam dos limites do que poderia ser apenas apelativo – os diálogos bem escritos e realísticos, aliam-se a perfeição dos tons de vozes e expressões faciais entre as duas – curiosamente, até mesmo a falta de dialogo entre elas é mostrada de forma brilhante – como a cena em que conversam (pausadamente) na loja de roupas ou, o momento mais triste do filme – quando, após uma revelação (ou omissão, digamos assim) o grito de desespero de uma para uma ser ouvida pela outra é suficiente para encher os nossos olhos de lágrimas.
Ainda que não seja um trabalho extremamente inovador, Lady Bird cumpre com excelência a sua proposta de mostrar com sinceridade as possibilidades e o pensamento de uma pessoa que ainda enxerga a vida com incertezas e preocupações – conseguindo, ainda, inserir importantes questões sobre o feminismo, machismo, preconceito de gênero, intolerância religiosa e até questões sobre o aborto – amparado pela atuação estelar de suas duas atrizes incríveis.