Este é um filme excelente, mas sou obrigado a avaliar como sendo "bom" porque há elementos simplesmente REVOLTANTES no enredo e que não se diluem, apesar da excelência do elenco, cenários, figurinos e reconstituição primorosa de época.
Inicia-se em 1994, ano em que ocorre o ataque contra a AMIA (Associação Mutual Israelita Argentina), que foi um atentado terrorista que ocorreu em Buenos Aires em 18 de julho de 1994, matando 85 pessoas e ferindo centenas. Foi o atentado mais mortal na Argentina.
O atentado serve ao enredo pois foi graças a ele que Sérgio Dayan, industrial judeu argentino em processo de falência, consegue simular a própria morte para que, desta maneira, sua esposa, Estela, consiga receber seu seguro de vida e pagar parte de seus credores.
Dayan deve, literalmente "para Deus, todo mundo e mais alguém", como se fala no nordeste do Brasil, sendo que até mesmo as mensalidades da escola de seus filhos, Florência e Mattia, estão atrasadas e ele, diante da pressão do agiota Hugo Brenner, também judeu argentino, após ferir-se no atentado à AMIA, decide fugir para o Paraguai e fazer com que todos acreditem que ele foi morto.
No Paraguai assume novo nome e nova identidade, Nikolas, acaba se amasiando com a fogosa Ilu, viúva de seu empregador, "El Gordo", e acaba, desta maneira, sendo coproprietário da loja.
Passam-se quinze anos. Durante este tempo Estela se casa com Hugo Brenner e tem com ele uma filha, Victoria, que se soma aos filhos que ela já tinha com Sérgio, que foram muito bem criados por Hugo, de maneira que o enxergam como pai e tem muito carinho por ele, especialmente o filho Mattia, que tinha apenas 7 anos quando do desaparecimento de Sérgio e que passa a trabalhar com Hugo, em sua financeira.
Tudo estava indo maravilhosamente bem para ambos os grupos familiares, tanto em Buenos Aires quanto em Assunção, até que a filha de Sergio e Estela, Florência, vai se casar e divulga, a pedido do noivo Ariel, um vídeo no Facebook em que fala sobre seu pai biológico, supostamente falecido.
O filme funciona como gatilho, que faz com que Sérgio abandone Ilu, sua loja e a boa vida que tinha no Paraguai para voltar a Buenos Aires.
Na sinagoga, ao ver a filha Florência entrar de braços dados com um sorridente Hugo, visivelmente desempenhando muito bem o papel de pai da noiva, Sérgio fica revoltado e decide matar Hugo. Só não o mata no banheiro do local onde está acontecendo a festa de casamento porque seu filho entra e conversa com o "pai" (Hugo), demonstrando o amor e o respeito que existe entre ambos, de maneira que, por pouco tempo, Sérgio fica comovido.
Em tentando sair da festa, é seguido por Estela, que o reconheceu.
Hugo e Mattia, julgando que ele é um invasor, ou matador profissional enviado por um grupo rival, que estava ameaçando Hugo, saem também da festa, seguindo Sérgio e Estela.
Sérgio aponta a arma e vai atirar em Hugo que, para se defender, atira nele antes.
Sérgio tomba, é amparado por Estela e o filme termina antes que ele morra, em seus braços.
Ficamos sem saber como a situação será resolvida e, inclusive, como ficará o relacionamento entre Estela e Hugo, após ele, em legítima defesa, ter morto Sérgio.
Os detalhes REVOLTANTES citados logo no início desta crítica:
1. Se Sérgio aceitou assumir nova vida e nova identidade, em outro país, e se tudo ia indo muito bem tanto para ele quanto para sua família, porque, num ato egoísta e mesquinho, resolve voltar, exatamente no dia do casamento da filha, e estragar tudo para todo mundo?
2. Se ele de fato amava sua esposa e seus filhos deveria desejar o melhor para eles. Ao observar a vida de Estela e Hugo ele deveria ter percebido o quanto o casal era feliz, se dava bem, o quanto criaram bem tanto seus dois filhos quanto a filha que tiveram juntos, e se retirar e voltar a ser feliz com a sua Ilu.
3. Enquanto Estela de fato assumiu o seu relacionamento com Hugo, se casou com ele e até tiveram uma filha juntos, Sérgio terá Ilu sempre como uma amante, pouco mais que uma prostituta, já que se deita com ela, fazem sexo até ficarem exaustos, mas sequer dormem juntos, já que ele sempre se retira para seu quarto de pousada. Ele não demonstra amor, carinho ou sequer respeito pela mulher que o acolheu e o tornou sócio de sua loja. Será que este desrespeito indiferente é fruto do preconceito, porque ela é cristã (eles, todos os demais, judeus) e paraguaia, exatamente como a empregada doméstica que o servia em Buenos Aires?
Como sempre, os moralistas são aqueles mais sem moral de todos! Aquele que é descrito como "sendo capaz de fazer qualquer coisa pela sua família" quase destrói a vida de todos eles e aquele que é pintado como o paradigma do amor incondicional, não ama ninguém, sequer tem amor próprio.