Sydney Sweeney brilha no polêmico Imaculada, mas filme de terror sofre com clichês e não foge do convencional
por Bruno Botelho dos SantosO provocativo subgênero Nunsploitation teve seu auge nos anos 70 colocando o foco nas freiras católicas, com produções que questionavam a repressão sexual das mulheres e a opressão imposta pelas instituições religiosas, especialmente a Igreja Católica. Os Demônios (1971), Satânico Pandemoniumm (1975) e Alucarda, a Filha das Trevas (1977) são alguns exemplos que causaram muita polêmica na época. Mas os filmes de terror sobre freiras estão mais em alta do que nunca…
Nos últimos anos, diversas produções da temática foram lançadas nos cinemas, quase como um renascimento do subgênero. A franquia Invocação do Mal teve um papel importante nessa febre, com os spin-offs A Freira (2018) e A Freira 2 (2023), mas também tivemos outros filmes como A Maldição da Freira (2018), Benedetta (2021), Irmã Morte (2023), O Convento (2023) e A Primeira Profecia (2024). Imaculada, estrelado por Sydney Sweeney, é mais um desses exemplares.
Imaculada acompanha a história da jovem religiosa americana Cecilia (Sydney Sweeney), que se muda para um ilustre convento na zona rural italiana. Apesar de ser recebida calorosamente pelas irmãs e freiras, ela logo percebe estranhas situações que a fazem questionar a segurança de seu novo lar, que abriga segredos sombrios e terríveis. Aos poucos, as suspeitas da jovem se tornam realidade quando ela acorda misteriosamente grávida.
Cecilia começa a ser atormentada por forças perversas enquanto confronta os segredos e horrores do convento. Em meio a visões assustadoras e eventos inexplicáveis, ela tenta desvendar a origem de sua condição e a verdadeira natureza do lugar. A experiência religiosa está prestes a se transformar em um pesadelo. Seria a gravidez uma dádiva ou uma maldição?
Ambientado em um isolado convento italiano, inicialmente, Imaculada aproveita bem do lugar visualmente para construir um clima sombrio e opressivo para Cecilia.
O filme se apropria e subverte a imagética católica, principalmente pela figura das santidades. Em uma de suas melhores cenas (e na imagem acima), a personagem de Sydney Sweeney reproduz visualmente a imagem da Virgem Maria. É interessante como Imaculada, palavra atribuída pela religião a pessoas "puras" e sem pecados, trabalha propositadamente essa relação visual e temática entre Cecilia e a santa, já que eventualmente ela descobre que está grávida – mesmo sem ter feito sexo, então seria fruto de um milagre. Isso rapidamente desperta o interesse dos responsáveis pelo convento.
Desta forma, o roteiro escrito por Andrew Lobel questiona o controle da religião sobre o corpo da mulher e toda violência cometida pelo sistema patriarcal, colocando justamente a freira interpretada por Sweeney no centro dessa discussão, enquanto ela se vê como vítima e tenta fugir desse ciclo de controle e opressão masculina para ter direito sobre seu próprio corpo. Por isso mesmo, Imaculada não aposta no terror sobrenatural. Na verdade, suas ameaças estão voltadas para aspectos relacionáveis da vida real, abrindo espaço para o debate sobre pautas feministas, como direitos reprodutivos e aborto.
O problema de Imaculada é que, ao mesmo tempo em que existem conceitos visuais e temáticos chamativos, tudo infelizmente se perde em uma narrativa que segue para o caminho mais clichê possível de filmes de terror hollywoodianos. O diretor Michael Mohan – que já havia trabalhado anteriormente com Sydney Sweeney em The Voyeurs (2021) – aposta bastante em jump scares para assustar o público, mas que atrapalham por serem previsíveis e mal utilizados. Por causa da sua curta duração de 1 hora e 29 minutos, o filme deixa de lado essa construção inicial de atmosfera e investimento psicológico, enquanto desenvolve a trama e seus personagens de forma apressada e mecânica, o que impede qualquer investimento de quem assiste.
Filmes de terror causando polêmica não são nenhuma novidade. Com Imaculada não é diferente e ele gerou controvérsia durante seu lançamento nos Estados Unidos, acusado de blasfêmia por grupos cristãos revoltados com suas temáticas. Mas, no final das contas, a produção estrelada por Sydney Sweeney é tão perturbadora assim?
O diretor Michael Mohan se inspirou bastante em clássicos subversivos do cinema de terror, principalmente Os Demônios de 1971 e O Bebê de Rosemary de 1968, além de filmes italianos do gênero, como Banho de Sangue (1971), A Rainha Vermelha Mata 7 Vezes (1972) e O Quê Vocês Fizeram com Solange? (1976). Por isso mesmo, Imaculada tenta fugir do terror mainstream almejando algo mais provocativo e disruptivo, mas não consegue escapar dos clichês no terror mais convencional.
O filme realmente tem cenas mais pesadas e sangrentas, que podem incomodar os mais sensíveis, especialmente quando o diretor recorre para o horror corporal na personagem Cecilia de Sydney Sweeney, mas não é realmente tão extremo quanto parece. Em termos de comparação, A Primeira Profecia é bem mais ousado e perturbador. As polêmicas de Imaculada estão mais ligadas com os temas que ele explora, com críticas contundentes ao sistema opressivo da Igreja Católica.
Desde que despontou em Euphoria, Sydney Sweeney se tornou uma das queridinhas de Hollywood, estrelando Era uma Vez em... Hollywood (2019), The White Lotus (2021), The Voyeurs (2021), Todos Menos Você (2023), Reality (2023) e Madame Teia (2024). A atriz está aproveitando esse momento em alta para construir seu espaço na indústria cinematográfica como produtora, como acontece justamente em Imaculada.
Seu roteiro estava em desenvolvimento há 10 anos, com diversas mudanças ao longo do tempo, até que a própria Sydney Sweeney entrou como protagonista e produtora. Ela tem espaço para brilhar em Imaculada com um papel diferente de tudo que ela já fez na carreira, se aprofundando nas nuances psicológicas de Cecilia. A personagem começa o filme de maneira mais reservada e submissa, mas seu comportamento muda ao longo da trama, sendo consumida pela fúria enquanto tenta retomar o controle sobre seu próprio corpo. Essa explosão de raiva culmina nos potentes minutos finais, com Sweeney roubando a cena como uma verdadeira rainha do grito (scream queen).
Por outro lado, os demais personagens de Imaculada são todos genéricos ou subdesenvolvidos. Quem tem mais destaque entre eles é Álvaro Morte, conhecido por La Casa de Papel, que interpreta o padre Sal Tedeschi. O ator é o principal antagonista e, mesmo que não tenha o desenvolvimento necessário, funciona bem conforme temos as revelações sobre seu plano e suas intenções no controle do corpo das mulheres no convento.
Imaculada tem conceitos visuais interessantes, assim como uma discussão atual e importante sobre o controle do corpo feminino. Mesmo assim, o filme se perde em meio aos sustos baratos e desenvolvimento apressado, apelando para clichês de terror.
O destaque do filme fica mesmo para Sydney Sweeney, que rouba a cena com momentos poderosos e explosivos, provando seu potencial como um ícone do terror.