Com mais Kong do que Godzilla, filme do Monsterverse melhora o seu antecessor
por Rafael FelizardoNo decorrer de 1933, os Estados Unidos viram nascer King Kong, um gorila de mais de sete metros de altura que rapidamente conquistou a simpatia do público. Com o passar dos anos, inúmeros remakes e reboots com o primata ganharam vida, elevando a mitologia do personagem ao patamar de uma das mais relevantes da cultura pop.
Onze anos mais tarde, o Japão também apostou em seu próprio kaiju (monstro gigante), jogando sob os holofotes um titã ainda mais imponente, intitulado Godzilla - Gojira para os mais íntimos. Como sua contraparte norte-americana, um grande número de produções acabou levando o seu nome; culminando no Monsterverse - um universo compartilhado, criado em 2014, que coloca suas estrelas em batalha.
Desta forma, 2024 continua o legado e apresenta aos entusiastas Godzilla e Kong: O Novo Império, um blockbuster amplamente aguardado e que se desenvolve sob a batuta de Adam Wingard e protagonismos de Rebecca Hall, Brian Tyree Henry e Dan Stevens.
Na trama, a humanidade descobre, da pior forma possível, que está sob uma ameaça colossal, até então escondida no interior da Terra Oca. Para a surpresa de Ilene, Trapper e Bernie, o mundo que forjou os titãs, logo, logo, mostrará suas garras, forçando o todo-poderoso Kong e o temível Godzilla a se unirem mais uma vez para salvar o futuro da raça humana.
Se em 2021 Godzilla vs Kong agradou a maior parte do público e da crítica, é possível afirmar que O Novo Império dá um passo além. Aqui, faz-se presente quase os mesmos personagens moldados pelos já conhecidos arquétipos cinematográficos, mas que se mostram mais carismáticos conforme o enredo progride. Se Godzilla vs Kong perdia a atenção do espectador toda vez que o arco humano entrava em foco, em O Novo Império, o problema não é tão aparente, contando com figuras - ainda unidimensionais - que funcionam de uma forma melhor.
Presente no filme passado, Alexander Skarsgård dá lugar ao também eye candy Dan Stevens, que performa um bonitão-sensível extensamente mais interessante. Já Rebecca Hall retorna na pele da Dra. Ilene Andrews, mesma personagem, mas com um tempo de tela com mais sal, menos chato, do que o da prequela. Brian Tyree Henry segue pelo mesmo caminho de Rebecca, servindo novamente como alívio cômico mas com um bem-vindo tempero a mais.
Para os entusiastas da violência desmedida, vale também colocar que The New Empire (no original) conta com alguns minutos extras de porradaria franca. Tanto o réptil japonês quanto o mamífero norte-americano podem ser vistos em numerosas sequências de ação que certamente colocarão o público mais próximo da ponta da poltrona. Sem sombra de dúvida, Adam Wingard acertou quando decidiu dar aos kaijus um tempo a mais abaixo dos holofotes - tempo, esse, alimentado agora por braços mecânicos, dentes de metal e outras bugigangas.
Apesar de encontrar seu ponto alto na ação, ao sair dela, a obra em questão lida com percalços que incomodam. Com algumas cenas um tanto emocionalmente bregas - que não chegam a ser um problema - e desenvolvimento previsível, o enredo se constrói sobre uma série de soluções cômodas, recorrendo, inclusive, a um Deus ex-machina (resolução mirabolante) para resolver certa adversidade criada (lembra do Projeto Potência?).
Além disso, para os fãs exclusivamente de Godzilla, O Novo Império pode incomodar por ser mais um filme de Kong do que do lagarto gigante. Nele, acompanhamos a jornada do gorila em uma trajetória para definir os limites de sua identidade, enquanto a ameaça japonesa pouco tem a acrescentar em termos de trama. A narrativa também conta com um sério problema de ritmo, onde cenas mais arrastadas e outras mais corridas desarticulam completamente o andamento.
No âmbito dos efeitos especiais, é possível notar que foi feito um trabalho para humanizar as expressões de Kong, muito devido ao arco dramático do personagem. Entretanto, em boa parte do enredo, O Novo Império falha em fazer a audiência acreditar que esses titãs são de fato gigantes, mesmo nas cenas em que temos um comparativo visual, como nos combates em meio aos prédios das grandes cidades.
Outro ponto que vale a pena destacar é que o timing para lançamento do filme não poderia ser pior, uma vez que, no fim do ano passado, vimos chegar às salas escuras Godzilla: Minus One, um longa-metragem que acabou se tornando referência no gênero - e inclusive faturou um Oscar. Com equipe e orçamento infinitamente menores, não é exagero afirmar que Minus One superou, em muito, O Novo Império, ponto que ainda será alvo de muitas comparações.
Se você não for uma pessoa chata como esta que vos escreve, O Novo Império será uma viagem divertida, lotada de humor e belas cores saturadas. A obra entrega um número considerável de batalhas titânicas, resultando, quase sempre, na destruição de grandes localidades mundiais.
Apesar de contar com seus contratempos, a película é claramente um blockbuster com o intuito exclusivo de entreter. Nesse ponto, Godzilla e Kong cumpre com seu objetivo, mergulhando o espectador em uma jornada que não será a mais marcante já vista, mas provavelmente o distrairá pelas quase duas horas de duração.
Com uma trilha sonora recheada de sintetizadores oitentistas, o longa é alimentado por músicas já conhecidas do grande público, que podem entregar certa dose de euforia principalmente para os mais nostálgicos. O antagonismo do filme também é um ponto a se destacar, evoluindo principalmente se comparamos ao impessoal mecha que encontramos na produção passada.
E para finalizar, para os mais patrióticos, Godzilla e Kong culmina em uma surpreendente tomada ambientada no Brasil. Aqui, eu não vou me prolongar muito para evitar spoilers, mas saiba que, de forma que vem virando tendência em Hollywood, a produção resolveu mergulhar em um empolgante fanservice para a entusiasmada população de nosso país.