Oppenheimer é o filme mais importante da história. Eu não estou exagerando. Eu não estou dizendo que seja o melhor filme da história (se bem que têm pouquíssimos filmes que podem competir com Oppenheimer nesse sentido). Mas eu estou dizendo que ele é importante, o mais importante. Porque a sobrevivência da humanidade depende da compreensão correta dessa história absurda.
Boas histórias despertam emoções. Esse deve ser o principal objetivo de um escritor, porque quando você associa uma emoção forte a algum momento da sua vida, pronto, ele se torna inesquecível.
Essa emoção pode ser medo, graça, tristeza, solidão, felicidade, não importa. Pense em um filme que marcou a sua vida. Esse filme que você pensou tem uma emoção associada.
Bem, eu nunca vou esquecer Oppenheimer.
Christopher Nolan criou uma obra de arte onde som, imagem e personagens se misturam e se tornam um só. E o objetivo dele era que eu, o espectador, conseguisse terminar o filme sentindo a mesma coisa que Oppenheimer sentiu.
Mas pra isso acontecer, Nolan não poderia nos contar como Oppenheimer se sentiu. Nolan tinha que mostrar. Mostrar através de uma atuação genial de Cillian Murphy e de um roteiro que explora todos os lados desse personagem. Oppenheimer não é uma glorificação do personagem. Nolan não doura a pílula nem tenta esconder as falhas de caráter dele.
Todo bom personagem é assim. Desde os tempos bíblicos. Abraão é o pai da fé, mas também era um mentiroso, adúltero e medroso. E depois dele, todos os personagens, reais ou fictícios, que importam têm essa complexidade. E Oppenheimer não é um bom pai, ou um bom marido, não tem fortes ideologias também. Aliás, esse é o tema central de boa parte do filme. Oppenheimer quase não pode trabalhar no projeto Manhattan por conta de sua associação com o Comunismo. Mas ele não era comunista. Ele era pragmático e utilitarista. No momento em que o Comunismo ser tornou um inconveniente, ele simplesmente abandonou a ideologia.
Como pragmático ele estava mais interessado no problema do momento.
O grande psicólogo Viktor Frankl, criador da logoterapia e sobrevivente do holocausto, dizia que o propósito do ser humano estava naquilo que a vida espera dele hoje. Não em projeções especulativas do futuro, mas na frase: O que a vida espera de mim hoje?
Oppenheimer sabia que, naquele momento da maior guerra da história, ideologias não poderiam ajudá-lo. A única teoria que ele precisava era da física.
Então você tem um personagem complexo, diante de um dilema. Os alemães estavam adiantados na pesquisa da bomba atômica. E isso é algo que deve ser levado em consideração. Se Oppenheimer não tivesse criado a bomba, algum alemão o teria feito e a história do mundo seria completamente diferente. Isso não quer dizer que foi certo bombardear Hiroshima e Nagasaki e matar quase 300 mil pessoas. Mas Hitler mandaria essa bomba para Nova York, Londres, Paris, e qualquer lugar que aquele imbecil considerasse uma ameaça.
Ninguém gostaria de estar no lugar de Oppenheimer. Mas Nolan nos coloca lá. E é devastador.
O filme tem 3 horas. E não é pra todo mundo.
Esse é o lance com emoções. Aquilo que me emociona não tem necessariamente o mesmo efeito em você. É uma pena, mas nem todos vão entender a visão de Nolan nesse filme. Mas eu sou o público dele. Ele conseguiu, eficientemente, manipular minhas emoções, deixando um final devastador que me deu pesadelos esta noite.
Ah, tem um detalhe importante. Uma das críticas que eu li sobre o filme, no site do G1, dizia que as mulheres do filme não são bem trabalhadas e são meros acessórios. Em primeiro lugar quase todo mundo é mero acessório diante de Oppenheimer, afinal é o nome dele no filme. Com exceção de Robert Downey Jr, que teve a melhor atuação de sua carreira, simplesmente genial, ninguém mais tem muito tempo de tela.
Mas em segundo lugar, o crítico do G1 só pode estar de sacanagem. Emily Blunt destrói no papel de Kitty. A atuação é impecável e seu protagonismo no último ato é muito claro. Um dos melhores momentos do filme acontece no testemunho que ela dá na audiência e é momento Oscar.
Oppenheimer, volto a afirmar, é o filme mais importante da história. Ele deveria ser assistido por todos os presidentes, desde Putin a Biden. Ele nos deixa assustado com o absurdo de elegermos um ser humano, muitas vezes incompetente e sem inteligência emocional, com poder de apertar um botão e com isso começar o fim do mundo. Durante a Guerra Fria havia 70 mil bombas nucleares, suficientes para matar 14 bilhões de pessoas. Com o fim da Guerra Fria, os países concordaram em diminuir a quantidade de bombas, mas ninguém sabe ao certo quantas bombas existem hoje, o fato é que temos o suficiente para matar bilhões de pessoas.
E é daí que vem a citação no começo do filme e que também serve de título ao livro que inspirou o filme: Oppenheimer: O Prometeu Americano. Prometeu foi um titã que criou o homem a partir do barro e deu a ele duas características que o diferenciariam para sempre dos outros animais, criados por seu irmão: as artes, pois apenas os humanos conseguem criar e apreciar arte; e o fogo, para que se protegesse e tivesse poder. Por ter roubado o fogo dos deuses e dado o aos homens, Prometeu foi condenado por Zeus a ser amarrado e ter seu fígado devorado todos os dias por uma águia.
Artes e fogo.
Oppenheimer deu aos homens o fogo, capaz de proteger e de destruir a humanidade. Nolan nos deu a arte.