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    Jogos Mortais X
    Críticas AdoroCinema
    3,5
    Bom
    Jogos Mortais X

    O golpe está aí, cai quem quer

    por Aline Pereira

    No ano em que Jogos Mortais X chega aos cinemas, Jigsaw está prestes a completar duas décadas desde que apareceu nas telas pela primeira vez para dar início a uma das franquias de terror mais populares de Hollywood. Não à toa, as torturas inventivas conquistaram o coração do público e filme atrás de filme – ao menos até ali a metade da saga –, a curiosidade pelos novos jogos sádicos de John Kramer (Tobin Bell) fez muita gente voltar aos cinemas ao longo dos anos. A questão é: a fórmula tem limite? É possível requentar uma história por duas décadas? 

    Bem, sim, é mais do que possível. A décima parte da franquia principal (que já conta com um spin-off bem dispensável) deve agradar quem já assistiu aos outros filmes e que, por isso, já sabe mais ou menos o que esperar da história. Jogos Mortais não trabalha exatamente com grandes expectativas de revolucionar o gênero, mas sim com a capacidade de “esticar a piada” mantendo o terrível carisma de seu protagonista. A realidade é que, tecnicamente, é quase sempre mais do mesmo, mas isso não é necessariamente um problema quando feito com carinho. 

    Foi essa a sensação que Jogos Mortais X me deixou: é um filme que faz um bom suco dos elementos que tornaram a franquia o que ela é. Estão lá os intermináveis banhos de sangue, a aflição sem fim dos instrumentos de tortura com seu designs bizarros e aquela dose de sadismo que tornam o terror tão agoniante quanto divertido no melhor estilo boneco-sinistro-surge-no-triciclo. 

    Lionsgate Films

    Jogos Mortais X: John Kramer ainda está vivo? 

    Toda vez que um novo Jogos Mortais é lançado, me vem à mente o arrependimento que imagino que os produtores sentiram ao matar John Kramer no terceiro filme da série – algo semelhante com o que acho que a Marvel sente em relação a Killmonger (Michael B. Jordan) em Pantera Negra. Dar início à franquia, em 2004, com o vilão protagonista já à beira da morte certamente criou um problema para os roteiristas de Jogos Mortais na hora de transformar um filme em uma franquia, mas a solução encontrada em X é uma das mais divertidas entre os flashbacks de Jigsaw. 

    A trama de Jogos Mortais X começa com John em fase avançada do câncer no cérebro, com poucos meses de vida pela frente. Surge então o que parece ser a solução milagrosa: uma médica oferece um tratamento alternativo que promete cura definitiva. Tudo é feito no sigilo porque, de acordo com ela, a indústria farmacêutica não quer que ninguém saiba que é possível reverter a doença sem passar a vida dependendo de remédios e outros tratamentos caríssimos. 

    Parece golpe para você? É porque é golpe sujíssimo mesmo. O frio e calculista John Kramer, no entanto, cai no conto do vigário e se arrisca viajando para o México, onde está instalado o hospital secreto em que realizará a cirurgia cerebral. Posteriormente, ele descobre que tudo não passou de uma armação e que os profissionais envolvidos em seu suposto tratamento sequer eram médicos de verdade.  

    A maior parte dos temas principais de Jogos Mortais envolvem Jigsaw querendo fazer justiça contra corruptos, abusadores, traidores, entre outros “párias” da sociedade em sua visão. Não é diferente no 10º filme e o longa faz uma conexão com um mundo real que faz até bastante sentido na fase da internet e das redes sociais que estamos vivendo agora. 

    Lionsgate Films

    Não falta, por aí, quem ofereça soluções milagrosas para os mais diversos tipos de questões: apostas, negócios, perda de peso, trabalho e (como em Jogos Mortais) saúde. Em um momento do longa, inclusive, Kramer fala sobre isso e diz que os golpistas se aproveitam da única coisa que pessoas vulneráveis têm: a esperança. Ao passo que em outra cena hilária, uma das personagens o define como “coach” quando ele diz que seu trabalho é fazer com que as pessoas sejam melhores. 

    É lógico que Jogos Mortais não quer dar lição de moral em ninguém e Jigsaw é tão ruim quanto o mal que ele acha que está combatendo, mas foi um acerto trazer essa proposta de ele mesmo cair numa armadilha sinistra assim. Todo mundo na história é tão terrível que o que nos resta é pegar um balde de pipoca e torcer pela briga. 

    Torturas de Jogos Mortais: A agonia e os “superpoderes” de Jigsaw 

    Já são tantos anos de torturas criativas nos cinema que o chamado “torture porn” (“pornô de tortura”) pode ser considerado um subgênero do terror mais do que sólido – e outras franquias também o utilizam, mas Jogos Mortais é, sem dúvidas, um dos grandes representantes. Para quem gosta, não há com o que se preocupar: o filme de 2023 continua mantendo a tradição de oferecer um banho de sangue e tripas. 

    Nesse aspecto em específico, os primeiros Jogos Mortais eram mais atraentes, mas é difícil definir se é porque as torturas eram novidades ou se porque eram mais engenhosas do que agora. O que dá para cravar é que as armadilhas ficam cada vez mais inacreditáveis – não pela construção em si, mas pelas habilidades surreais que exigem de John Kramer. 

    Lionsgate Films

    Jogos Mortais X deixa a sensação de que pouco tempo se passou entre Kramer descobrir que foi enganado e o início de seus jogos maligno, mas ainda assim, ele dá conta de construir um megacomplexo de tortura, com recursos refinados. Mesmo com a ajuda de seus discípulos (participações especiais que os fãs mais antigos vão gostar de ver!), o parque das torturas é mais absurdo do que o ideal. Mais do que isso, estou quase certa de que John Kramer, além de arquiteto e engenheiro, também é vidente – só isso explicaria sua capacidade de antecipar alguns dos acontecimentos. 

    Mas, novamente, quem já está familiarizado com o universo de Jogos Mortais provavelmente não vai se incomodar com os superpoderes de Jigsaw e com a “falta de sentido” (se é que dá para classificar assim) de alguns dos detalhes. Não há agora (e talvez nunca tenha havido) a promessa de uma história comprometida com a realidade e, nesse caso, a habilidade da produção para entregar entretenimento vale mais do que a lógica. O longa se sai bem nesse aspecto e consegue medir o quanto de sentido precisa sacrificar em nome da diversão. 

    Para os fãs mais fiéis, que muito provavelmente ficaram com um gosto amargo em 2021, a franquia se redime: Jogos Mortais X é muito mais interessante, bem elaborado e inspirado em seu próprio espírito do que o spin-off Espiral: O Legado de Jogos Mortais. Aliás, talvez Jogos Mortais X seja uma das melhores histórias de Jigsaw desde que o conhecemos 20 anos atrás.

     

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