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    My Policeman
    Críticas AdoroCinema
    2,5
    Regular
    My Policeman

    A bilionésima tragédia sobre casais gays

    por Nathalia Jesus

    Um movimento sempre bem-vindo no mundo artístico é o encontro entre gêneros, modalidades e celebridades que jamais poderíamos imaginar trabalhando juntos. A mesma surpresa acontece quando vemos um cantor popular adentrando no universo cinematográfico e apostando em uma carreira paralela como ator. Harry Styles tem tentado isso desde 2017, com papéis menores como em Eternos. No entanto, ao ingressar como protagonista nas telonas, no recente Não Se Preocupe, Querida, vimos um Styles muito menos potente do que nos palcos. Em My Policeman, o astro pop não está muito melhor — mas ninguém pode dizer que ele não tentou.

    No filme, dirigido por Michael Grandage e adaptado do romance de Bethan Roberts, Harry Styles é Tom, um aspirante a policial que tem sua vida mudada quando conhece Patrick, um curador de museu por quem se apaixona — e desafia tudo o que ele acreditava conhecer sobre si mesmo. A história é contada na Londres dos anos 50, onde a homossexualidade era considerada um crime e punida como tal. Querendo fugir deste destino, Tom se casa com a jovem Marion e vive uma vida dupla, fadada à tragédia.

    Caminhando em passos lentos

    Não é difícil ser verdadeiramente transportado para os anos 50 em My Policeman. A ambientação do filme é caprichada e se preocupa com detalhes, desde a trilha sonora temporalmente marcante até as vestimentas de época, que nos remetem a um período mais conservador para mulheres, enquanto homens usam shortinhos mais curtos e confortáveis em momentos de lazer.

    A homofobia e o sentimento de alerta que ela nos causa durante toda a trama também cheiram a anos 50, de forma tão intensa que gera angústia e medo, mesmo que estejamos teoricamente safos em nossas poltronas no cinema. Porém, para chegar a tanto, o filme dá passos pequenos e lentos, nos apresentando os personagens e as situações incômodas de maneira cuidadosa, demorando a revelar a relação que uma pessoa tem com a outra na trama.

    Para quem não leu o livro, as informações permanecem misteriosas por um tempo, a ponto de demorarmos a saber quem são Marion, Tom ou Patrick. O início do relacionamento entre eles é pouco compreensível e, neste aspecto, é positivo, porque os detalhes mais reveladores da história são bem aproveitados e captam a atenção, nos fazendo esperar por algo que está sempre por vir.

    A ordem dos acontecimentos é agradável pela falta de linearidade em um enredo que, para bons entendedores, está caminhando até o desastre. A cronologia de My Policeman nos leva ao passado e futuro dos personagens, ao início e ao fim, sem revelar o que tem de mais importante no meio até que estes detalhes apareçam. Assim, toda a narrativa previsível — fadada ao insucesso do casal gay devido aos regimes sociais da época — se torna um pouco mais interessante de acompanhar.

    Um trio de pessoas infelizes

    Tom, Marion e Patrick são o centro dessa tragédia anunciada e, por mais que a tendência seja torcermos pelos protagonistas (pelo menos um deles), My Policeman deixa o gosto amargo de que não há possibilidade de sucesso para nenhum dos três. Se, por um lado, esperamos que tudo dê certo porque a empatia para com eles é inevitável, por outro, é fácil perder as esperanças. E isso se segue até o momento final, cujo desfecho não é bem a vitória que a história faz parecer.

    Harry Styles foi duramente criticado ao afirmar que o filme é mais do que as cenas de sexo, no qual é a intenção é mostrar um amor sensível entre dois homens. Porém, não temos tempo de ver a paixão dócil entre os dois em meios a tantos impedimentos homofóbicos. É difícil lembrar desse amor em um cenário em que mais da metade do núcleo protagonista o rejeita com tanta veemência.

    As cenas de sexo que aguçaram a curiosidade do público desde o anúncio são, sim, belas, carregam a paixão dos personagens e foram lindamente executadas por Harry Styles e David Dawson. Estes foram, talvez, os únicos momentos em que a química entre eles estava quase palpável. O antes e depois delas, porém, são pouco cativantes e, com tantas barreiras, é difícil enxergá-los como casal.

    A transição do elenco mais velho e o jovem convence e, nesse sentido, é possível afirmar que ambas as versões de Marion, Tom e Patrick foram muito bem alinhadas entre os atores fora das telas. O núcleo maduro de My Policeman, formado por Gina McKeeLinus Roache e Rupert Everett, entrega performances ao nível similar de intensidade, sem tentar se sobressair ou ceder grande parte dos holofotes aos jovens atores.

    O mesmo não acontece entre os jovens talentos do filme. A atuação de Emma Corrin e David Dawson é superior ao desempenho de Harry Styles e isso era esperado após a recente performance do cantor pop em Não Se Preocupe, Querida. As falas monotônicas e expressões faciais pouco emotivas são fruto da falta de experiência do astro, posto como protagonista ao lado de atores com mais estrada do que ele. Porém, não é exagero afirmar que o vencedor do Grammy apresenta melhores condições do que em seu trabalho anterior, mostrando afinidade com seu personagem de maneira inédita desde o início de sua carreira como ator, em 2017.

    Temática desgastada

    My Policeman emociona pelo trágico, pela temática datada e desgastada que os filmes LGBTQ+ exploraram com tanto afinco nos últimos anos e, em 2022, chegam a ser cansativas para os membros da comunidade. Retratar o cenário insalubre em que casais gays viviam em Londres nos anos 50 pode ser importante para documentar, resgatar a memória do que a sociedade não pode mais ser.

    No entanto, My Policeman não segue esse critério. É apenas um filme, entre diversos outros da mesma temática, que revela o quanto as pessoas podem sofrer por não estarem em conformidade com as vigências sociais. O longa-metragem, felizmente, também nos lembra que a sociedade é um pouco menos repulsiva do que costumava ser. De qualquer forma, uma comédia romântica LGBTQ+ cumpre este objetivo de maneira mais agradável do que o material aqui apresentado.

    *O AdoroCinema assistiu ao filme durante o Festival do Rio 2022

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