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    É Assim Que Acaba
    Críticas AdoroCinema
    2,0
    Fraco
    É Assim Que Acaba

    Nem Blake Lively salva adaptação ingênua: É Assim Que Acaba se mantém fiel a Colleen Hoover. E esse é o problema.

    por Giovanna Ribeiro

    Toda nova adaptação cinematográfica de uma obra literária, naturalmente, é capaz de aflorar os ânimos daqueles leitores fieis à história. E quanto maior for o sucesso do livro, maior também será a expectativa para sua versão nas telas. É Assim Que Acaba, livro da autora norte-americana Colleen Hoover, pode ser considerado um exemplo desse caso: a trama virou queridinha entre os usuários do TikTok e acumula, só no Brasil, mais de um milhão de exemplares vendidos.

    Entre todas as críticas prévias feitas pelos fãs acerca da produção do longa-metragem, estavam reclamações sobre a idade dos atores - uma diferença de mais de 10 anos em relação aos personagens retratados nos livros - ou mesmo a caracterização da grande protagonista, Lily Bloom (vivida por Blake Lively), que estaria aquém do esperado. No entanto, pelo menos para os não-leitores de Colleen Hoover, os problemas de É Assim Que Acaba estão longe de passar apenas por uma suposta infidelidade para com a obra original.

    Adaptação do romance tem enredo pouco inventivo

    Em É Assim Que Acaba, Lily Bloom (Lively) é uma mulher que, após vivenciar eventos traumáticos na infância, decide começar uma vida nova em Boston e tentar abrir o próprio negócio. A jovem, que sempre teve um interesse especial por flores, finalmente realiza seu sonho de abrir uma floricultura. Em meio a essa mudança de vida, Lily também acaba conhecendo um novo amor: Ryle (Justin Baldoni, que também assina a direção do longa), um charmoso (e rico) neurocirurgião.

    No entanto, à medida que o relacionamento se torna cada vez mais sério, Ryle vai mostrando uma face violenta, que desperta na moça, lembranças do passado e do relacionamento abusivo de seus pais. Até que Atlas Corrigan (Brandon Sklenar), o primeiro amor de Lily, também retorna para a vida da florista, colaborando para que ela finalmente confronte, tanto os traumas do passado, quanto os do presente.

    Sony

    A história não economiza nos clichês para narrar desde o encontro despretensioso de Lily Bloom e Ryle até os motivos que fizeram a paixão acontecer. Mas, é preciso ressaltar: clichês existem porque já funcionaram bastante. No entanto, precisam ser bem direcionados. O que não acontece em É Assim Que Acaba.

    Temos aqui o neurocirurgião belo, rico, e emocionalmente indisponível, que se rende à jovem que, apesar de independente e empreendedora, não deixa de preencher a persona óbvia de não ser uma mulher “fácil”. Encantado com a recusa da “valorosa” Lily Bloom - que, por exemplo, não faz sexo casual, pois, segundo a própria: “sou o tipo de garota que você apresenta para sua mãe” - o neurocirurgião cafajeste se vê obcecado.

    De quem é a culpa? Trama sobre violência é ingênua demais

    É Assim Que Acaba se estabelece como uma história sobre agressão doméstica, e sobre encerrar ciclos de violência, sobretudo, quando eles vêm em forma de trauma geracional. Mas esse é, justamente, o ponto fraco da trama: a ingenuidade. Que, inevitavelmente, também pode ser perversa.

    Conservadora, a história tenta transformar os sintomas e efeitos do patriarcado, presente na vida de todas as mulheres, em uma espécie de dor individual. Para a narrativa de É Assim Que Acaba, se todos os homens lembrassem de suas mães, filhas e irmãs, não seriam violentos com suas parceiras (ou com mulher alguma). Ou como se a violência de gênero fosse resolvida apenas com a posição individual de uma mulher, em aceitar ou não estar submetida a ela.

    Ryle não é um homem adoecido pela masculinidade. Ele é um homem extremamente consciente de sua posição na sociedade, e por isso, empoderado a ser violento com Lily. Simplesmente porque ele pode ser. Ao tentar buscar nuances ou explicações, a ingenuidade de É Assim Que Acaba se torna, assim, perversa.

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    Sem tirar o mérito e a boa intenção, é preciso relembrar o ditado de que de boas intenções o inferno está cheio. Apesar de questionar o abuso ao qual as personagens estão sendo submetidas, a trama, por exemplo, em nenhum momento, questiona o tratamento mais enraizado dos homens para com as mulheres ao seu redor. Tratamento esse que é a base da violência patriarcal: quando os corpos das mulheres são vistos como propriedade. Que devem ser conquistados. Protegidos. Preservados. E claro, violentados.

    E não questiona, justamente, por ser um produto profundamente inserido dentro dessa lógica. Quase como um panfleto de propaganda de tudo o que deveríamos enfrentar verdadeiramente, se quiséssemos de fato superar e evoluir enquanto sociedade. Politicamente, até. Perdida em um discurso de autoajuda, a trama tem agressores que, por exemplo, não são sequer punidos.

    Uma grande desinformação

    Nesse contexto, Ryle está longe de ser o único homem violento da história. Todos os homens, desde o pai de Lily, à Atlas, agem com violência, por motivos diversos, baseados em uma convicção que entende os corpos das mulheres como algo ou coisa que precisa da supervisão masculina. Romantiza-se assim, Atlas, que não agride Lily. Só agride outro homem na frente dela. Para protegê-la.

    É preciso dizer que, se o maior temor do público sobre a adaptação de É Assim que Acaba, estava no campo da fidelidade da obra, em relação ao livro, vale observar que, é, na verdade, uma pena que o filme tenha sido fiel até demais. E, paradoxalmente, o fato de Blake Lively estar extremamente convincente em sua Lily Bloom, não ajuda o filme a superar seus problemas estruturais.

    Talvez, o longa teria sido uma obra muito mais interessante, em si, se fosse ousado o bastante para subverter a história, a ponto de, justamente, alcançar o que o livro não alcançou. Dirigido por Justin Baldoni (que já havia dirigido anteriormente, títulos como A Cinco Passos de Você e Clouds, e agora faz um trabalho mediano), o filme chega às telas em perfeita sintonia com sua obra original. Infelizmente.

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