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    Bangla
    Críticas AdoroCinema
    2,0
    Fraco
    Bangla

    Linha tênue entre desconstruir e estereotipar

    por Sarah Lyra

    Torpignattara, segundo o protagonista de Bangla, Phaim Bhuiyan, é o bairro mais miscigenado de Roma, responsável por abrigar três "gangues" principais: os estrangeiros, os hipsters e os idosos. Suas paredes coloridas pela arte de rua, mescladas aos cheiros de lasanha, curry e kebab, oriundos dos estabelecimentos locais, oferecem uma experiência quase psicodélica aos frequentadores do bairro. Essa descrição do local, feita na cena de abertura, em meio a uma montagem frenética e quebra da quarta parede, sinaliza um desejo do longa de nos conduzir pela descoberta de um interessante mundo inexplorado pelo Cinema até então. No entanto, Bangla não só falha em concretizar sua premissa, como cria alguns estereótipos em relação à região e aos grupos que a habitam.

    Prova disso é a maneira como descreve os hipsters: homens e mulheres que não trabalham, têm filhos com nomes artísticos e estão sempre sem dinheiro. O pouco que têm gastam em produtos orgânicos e bebidas alcóolicas. Em uma tentativa de criar humor fácil, Bhuiyan ridiculariza o sotaque e as vestimentas dos imigrantes bengali em Roma e sugere que eles comprem um chapéu, já que estão sempre com a cabeça coberta por conta do frio. Quando um amigo pede para ser buscado no aeroporto, porque não quer "ser confundido com um terrorista", a impressão passada é a de que o diretor e roteirista tem um comentário social em mente, mas, ao invés de fazê-lo adicionando camadas à problemática ou desconstruindo a imagem preconceituosa, apenas reforça o reducionismo com que o próprio povo é tratado.

    No que é claramente uma trama autobiográfica, o diretor Phaim Bhuiyan, que não só interpreta o personagem principal, como empresta seu nome a ele, trata as barreiras culturais de um jovem de origem bengali, mas nascido na Itália, como sua principal problemática. Aos 22 anos, Phaim, praticante do Islamismo, precisa conter o impulso de explorar sua sexualidade para se manter fiel aos costumes da religião. Ao conhecer uma garota italiana chamada Asia, a tarefa se torna muito mais desafiadora, e Phaim passa a questionar os valores de sua cultura, enquanto lida com a dualidade de ser "50% bengali e 50% italiano", como ele mesmo define.

    A contradição vem do fato de que, embora tente parecer uma comédia politizada, as questões sociais nunca chegam a ser adentradas. Na maior parte do tempo, Phaim age como se o dilema fosse se resolver por conta própria. A única cena em que o garoto demonstra qualquer tipo de insatisfação com sua religião é quando sua mãe diz que ele precisa ter mais respeito pela própria história. Inconformado com a fala da mãe, ele diz que nasceu, estudou e morou a vida inteira em um raio de menos de dois quilômetros e que sua história não é tão grande e profunda como ela faz parecer.

    O relacionamento do casal é o ponto de maior destaque no roteiro. Enquanto Phaim se sente exótico e uma moda passageira na vida de Asia, a garota se sente comum, excluída por não entender a religião do namorado. Nesse ponto, Bangla se propõe a inserir algumas discussões sobre barreiras culturais, mas perde o fôlego no momento de mostrar personalidade, principalmente por conta da recusa de aprofundar as dores dos personagens, principalmente os protagonistas. O próprio arco envolvendo a irmã de Phaim, que está presa a um relacionamento sem amor e se vê obrigada casar por conta das convenções religiosas, é totalmente abandonado pelo roteiro à medida que o longa avança. E o que é ainda problemático: essa mesma subtrama é acionada novamente apenas para criar um contexto para o desfecho de Phaim. Asia, que também carece de uma história própria, desaparece completamente enquanto o protagonista lida com suas questões. Uma ausência sentida em muitos níveis, especialmente no contexto atual, que muito discute a representatividade feminina no Cinema.

    Bangla, que se vende como uma comédia diferenciada em um primeiro momento, não só pela temática apresentada, como pela ambientação proposta, acaba recorrendo aos clichês para se desenvolver. Ao fim, a sensação do espectador é de que o filme idealizado por Phaim Bhuiyan não tem clareza sobre sua linguagem, conteúdo ou gênero.

    Filme visto no 8 ½ Festa do Cinema Italiano, em agosto de 2019.

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