Mesmo tendo experiências com direção em bons trabalhos, como o longa Boa Noite e Boa Sorte (2005) ou na série Catch-22 (2019), parece que George Clooney, como cineasta, ainda precisa aprender mais – afinal, com o Céu da Meia-Noite, ele tenta tornar uma ficção cientifica em um palco para tratar de dilemas familiares e pessoais, assim como Christopher Nolan fez em Interestelar ou Alfonso Cuarón em Gravidade – usando o pano de fundo do aquecimento global, o astro de Hollywood opta por arcos e decisões dramáticas pouco convincentes, apelando, muitas vezes, para um melodrama infundado, que, dada a criação, desenvolvimento e apresentação de personagens pouco inspiradas, transforma esse longa em uma decepção – e o pior: sendo desonesto com o espectador.
Baseado em um livro de Lily Brooks-Dalton, com roteiro escrito por esta em parceria com Mark L. Smith, o filme conta a história de Augustine, vivido pelo próprio Clooney, um renomado cientista, em fase terminal de vida, devido à um câncer severo – se passando no ano de 2049, onde a Terra está a beira do colapso, devido as drásticas e terríveis mudanças climáticas, ele é o último refugiado em uma base de comunicação no polo norte – uma das poucas regiões onde o aquecimento global não causou efeitos – isolado, ele acaba encontrando dentro da estação uma menina (Springall), que não fala, mas acaba ficando ao lado dele, para que consigam chegar até uma antena, que pode ajudar no contato com uma nave espacial, que em missão para tentar estabelecer vida em uma lua de Júpiter, está voltando a Terra – e, agora, cabe a Augustine correr contra o tempo para avisa-los das condições em que o planeta se encontra e garantir o futuro da raça humana.
Com toda essa urgência da trama – simplesmente a “continuidade da vida dos seres humanos” – é impressionante como tanto a direção de Clooney quanto o roteiro não conseguem passar a tensão que isso deveria provocar – optando por trabalhar a questão envolvendo a maternidade/paternidade na vida de cada um de seus personagens, Clooney erra por não dar a devida atenção para todos os personagens – seu único acerto acaba sendo em sua composição como Augustine – demonstrando o peso e cansaço por uma vida não vivida como queria, um relacionamento amoroso que não conseguiu explorar melhor ou a própria solidão em viver na estação no polo norte – Clooney (o diretor) tenta mesclar todos os temores do personagem com a luta para garantir a sobrevivência e continuidade da Terra – fazendo um paralelo disso com a questão de que seu personagem quando jovem (vivido por Ethan Peck, que não se parece em nada com Clooney) luta por encontrar outros planetas para a humanidade continuar, mas dá pouca atenção para sua companheira – indo supostamente contra a vontade de procriação, que suas pesquisas exploram – ainda assim, torna-se até bonita a maneira como tenta interagir com a menina vivida pela pequena Caiolinn Springall – um papel até desafiador para uma criança, já que não diz uma palavra e precisa parecer expressiva – isso torna as sequências na Terra curiosas de se acompanhar até certo ponto – porém, a conclusão acaba sendo somente a utilização de um recurso quase batido de inserir personagens que representam algo por trás, sem mais complexidade nisso – algo que em muitas outras obras é um tipo de linguagem que faz sentido e causa impacto – de Lady Bird até Mãe, do Aronofsky, existem vários exemplos que lidam bem com isso.
Mas aqui, quando passa a mostrar os integrantes da nave espacial, O Céu da Meia-Noite se perde tristemente – e o erro está, justamente, por querer dar a cada membro da missão uma ligação com a questão da maternidade/paternidade – Felicity Jones – em uma atuação quase robótica e inexpressiva – vive uma astronauta gestante, ao passo que o capitão da nave, vivido por David Oyelowo, é o pai da criança – relegando o piloto Mitchell, do Kyle Chandler (que tem o azar de participar de outro conflito familiar fraco em um filme, depois do que fez em Godzilla – Rei dos Monstros) a apenas mostrar que sente falta dos familiares que ficaram na Terra – e o cientista Sanchez de Demián Bichir, que parece ter só a função de ver a outra tripulante da nave, a Maya de Tiffany Boone, como uma filha – e, esta, praticamente sem mais função nenhuma para a trama – culminando numa cena que deveria ser tensa e até triste, mas não causa impacto por não sabermos ao certo exatamente quem os personagens são, de fato – Clooney parece que acha que mostrar os integrantes da nave vendo hologramas antigos de suas famílias é o suficiente para nos identificarmos com eles – como se Maya, por exemplo, demonstrasse quem era só por dizer que tinha um “gatinho inteligente” – é uma falta de inspiração que torna a “mensagem” do longa ainda mais fraca – e, quando disse que o diretor foi desonesto, me refiro, principalmente, à um certo momento no primeiro ato, quando uma personagem procura desesperadamente por sua filha – conforme o terceiro ato mostra, tal momento foi criado só para ajudar a “esconder” uma revelação que não deixa de soar um tanto forçada – e, com todos esses elementos desenvolvidos sem criatividade, jamais consegue emocionar ou cativar o espectador.
Não sendo um desastre completo por seus atributos técnicos – a fotografia é belíssima, tanto em mostrar os ambientes no espaço e, principalmente, pelas paisagens no ártico – enquanto que o design de produção é curioso, por dar um visual um tanto retro para o interior da grande nave espacial – que por fora é bonita com seus imensos arcos espelhados e grandes “antenas infláveis” – ou seja, um bom dinheiro gasto para uma obra de pouca substância – o ritmo lento da narrativa ainda interfere em momentos onde a ação poderia ser mais urgente – sim, como disse antes, o desenrolar da história não capta essa urgência – seja por uma tempestade no meio do gelo, o quase afogamento em um trailer ou uma chuva de gelo enquanto três astronautas andam fora da nave – o que faz com que o compositor Alexandre Desplat precise trabalhar sua trilha em praticamente todos os momentos – “ditando” emoções passo a passo – como se Clooney apenas tivesse lhe dito: “agora você faz um acorde para emocionar... agora coloca algo meio agressivo para causar tensão” – só não fica pior porque o compositor realmente é talentoso e cria boas composições.
Fechando com um plano final tão sem graça – que chega a rivalizar com o fim ridículo da nova versão de O Grito – O Céu da Meia-Noite é aquele tipo de longa que tem boas intenções, mas sua própria pretensão simplória o impede de ser uma experiência verdadeira e introspectiva para o expectador – algo que Clooney não aprendeu com Alfonso Cuarón, quando participou como ator em Gravidade.