Narrativa desleixada
por Kalel AdolfoNão é novidade que a Netflix deseja se tornar uma grande força criativa no cinema de super-heróis. Desde o despretensioso Pequenos Grandes Heróis, até o ambicioso The Old Guard, o estúdio não vem poupando esforços em oferecer interpretações diferentes para um gênero tão amado. E em Esquadrão Trovão, a gigante do streaming se une ao cineasta Ben Falcone para entregar novamente uma produção fora dos padrões.
Liderado por Melissa McCarthy — que conquistou uma indicação ao Oscar em Poderia Me Perdoar? — e Octavia Spencer — vencedora da estatueta por seu papel em Histórias Cruzadas — o filme fala sobre a pequena Emily Stanton, que perdeu os pais após um ataque de seres humanos mutantes.
Por sorte, ela acaba fazendo amizade com Lydia Berman, que a conforta durante o luto. Mesmo assim, as duas se desentendem e rompem a relação. Décadas se passam, e as personagens seguem caminhos distintos na vida.
Enquanto Emily se torna uma grande cientista que busca deter os miliantes — criaturas que mataram a sua família — Lydia segue uma rotina medíocre trabalhando em um ferro velho. Quando a dupla finalmente se reencontra, um erro fatal acaba as transformando em super-heroínas. Agora, elas precisam colocar as diferenças de lado para combater os indivíduos que continuam aterrorizando a cidade.
Felizmente, a química entre McCarthy e Spencer flui de forma prazerosa, com as duas estrelas entregando performances altamente carismáticas que se complementam. Emily é a personagem sóbria e excessivamente racional. Enquanto isso, Lydia apresenta uma persona impulsiva, que balanceia a falta de espontaneidade da parceira.
Além disso, precisamos ressaltar que essa é uma mega produção de super-heróis escalando duas mulheres com mais de quarenta anos como protagonistas. Para os padrões sexistas de Hollywood, a Netflix realmente acertou o quesito representatividade em cheio, escapando das convenções do gênero.
Porém, mesmo com a dinâmica entre as duas funcionando, a trama desenvolve pouca profundidade para mergulharmos no universo de Esquadrão Trovão. Ao invés de explorar as motivações e bagagens de seus personagens centrais, a direção de Ben Falcone acaba optando pelo excesso de objetividade, que deixa lacunas enormes no roteiro.
Aliás, é impossível ignorar que até mesmo o antagonista do longa — The King, interpretado por Bobby Cannavale — possui propósitos tão caricatos, semelhantes a de um vilão de desenho animado. O elenco secundário também acaba sendo reduzido a momentos simplistas de alívio cômico. The Crab (Jason Bateman) e a vilã Laser (Pom Klementieff), que são os principais ajudantes de The King, são os maiores afetados.
Mesmo que estejamos falando de um besteirol, a obra claramente ultrapassa os limites do humor escrachado, entrando em uma área de piadas infantilizadas que quase nunca dão certo. Com pouca atenção às nuances e detalhes narrativos, toda a experiência é dominada por uma atmosfera de desleixo.
Visualmente, a produção também não surpreende. Porém, o ar “campy” do roteiro faz com que os efeitos medianos pareçam parte da proposta.
A trilha sonora criada por Scott Ian e Dave Lombardo é um dos poucos pontos altos do projeto. Extremamente empolgante, a sonoridade heavy metal potencializa a adrenalina de algumas das sequências de combate mais intensas. Para melhorar, Lzzy Hale — do Halestorm — e Corey Taylor — integrante do Slipknot — emprestam vocais para a música-tema de Esquadrão Trovão.
De forma geral, a produção joga de forma exageradamente confortável. Mesmo que não ofenda, a baixa complexidade do projeto impressiona, não oferecendo grandes recompensas ou surpresas aos espectadores. Contudo, não é impossível que uma continuação venha a acontecer.