O que aprendemos numa jornada?
por Katiúscia ViannaDesde suas primeiras exibições nos Festivais de Toronto e Veneza, os cinéfilos ficaram de olho: Nomadland prometia ser um dos melhores filmes de sua safra. O nome de Chloé Zhao estava prestes a ficar famoso, ao comandar Os Eternos da Marvel, mas a pandemia do Coronavírus adiou o lançamento da aventura. Logo, os holofotes voltaram para esta obra independente da cineasta que, sinceramente, merece toda a atenção que recebeu.
A trama gira ao redor de Fern (Frances McDormand), uma mulher que perdeu tudo na Grande Recessão de 2008. Quando sua cidade desaparece do mapa, ela embarca numa van para viver como uma nômade, passando pelo oeste norte-americano, ao mesmo tempo que ainda carrega o luto, já que não consegue superar a morte de seu marido. Dentre empregos temporários e contratempos, ela faz amigos e descobertas no meio do caminho.
Nomadland mistura realidade e ficção
Alguns consideram Nomadland como um híbrido entre filme e documentário. E é meio complicado mesmo. É inspirado no livro de Jessica Bruder, que conta histórias verdadeiras, mas a personagem Fern é uma obra de ficção criada por Zhao. Ao mesmo tempo, ela é cercada por nômades da vida real, interpretando versões fictícias de si mesmos, como Linda May, Swankie e o mentor Bob Wells. Sinceramente, é até difícil descrever este longa. Por um bom tempo, só fui capaz de explicá-lo através de uma palavra: lindo. Viva Chloé Zhao!
É um retrato honesto de uma parcela da população norte-americana, que enfrenta, diariamente, perigos, frio e pobreza. Seria muito fácil tratar essa história de forma exagerada, explorando tais dificuldades e problemas. Mas Zhao decide enxergar pelo outro lado, observar como os nômades vivem, se envolvendo entre eles, a fim de contar algo fiel. Então, a equipe (e a duas vezes oscarizada Frances McDormand) fez as malas, viajou por cinco estados, durante semanas, com câmera na mão.
O resultado é uma imersão completa, que não enxerga o dia a dia como problemático, mas simplesmente considera isso como um modo de vida. Alguns buscam aventuras, outros não tem opção, mas, juntos, formam uma comunidade que merece ter sua voz ouvida. Por mais que Nomadland seja a jornada de Fern em busca de aceitação e superação; é impossível desvinculá-la desse contexto, já que ela se envolve tão perfeitamente dentre seus "colegas de elenco". Apenas David Strathairn também é um ator profissional, cujo personagem, felizmente, não cai no clichê. Viva Chloé Zhao - parte 2!
Frances McDormand proporciona outro momento marcante de sua carreira
Daí, temos Frances McDormand, que nunca decepciona em serviço, não é mesmo? Novamente, ela entrega uma performance poderosa, misturando vulnerabilidade, mesmo com aquela face séria de alguém que não gosta de pedir ajuda. Ela é o centro de tudo, e nem sempre toma as atitudes que o espectador deseja, mas é impossível não criar uma conexão com a protagonista. Seja por respeitar sua atitude diante dos obstáculos ou simplesmente por gostar de seu olhar diante de diferentes cenários naturais em seu caminho — tão bem apreciadas pelo trabalho de fotografia.
Nomadland podia ter dado muito errado. Podia ser dramático demais, monótono demais ou opaco demais. Felizmente, o que vemos é algo singelo, pois a direção de Zhao (que também edita, assina e produz o longa) não ignora a frieza da realidade, mas sabe encontrar a magia da naturalidade. Sim, rimei sem querer e parece meio poético, mas é assim que o filme funciona mesmo. Viva Chloé Zhao - para sempre!