"Enfeitiçados" é mais uma parceria entre a Skydance Animation e a Netflix, e sua estreia chegou sem muito alarde. Com um marketing discreto e um visual que parece um tanto ultrapassado, especialmente quando comparado ao padrão elevado por obras como Homem-Aranha no Aranhaverso, o filme tinha tudo para ser mais uma animação esquecível do catálogo. Contudo, ao mergulhar na trama, é impossível ignorar seu charme, principalmente pela narrativa sensível e por algumas músicas que conseguem captar momentos emocionantes, mesmo que de maneira inconsistente.
A história, à primeira vista, parece seguir uma fórmula simples: uma garota precisa enfrentar desafios em uma floresta mágica para ajudar seus pais, que foram transformados em monstros. No entanto, a profundidade do roteiro vai além do básico. Enfeitiçados aborda com delicadeza os impactos de uma separação na vida de um filho, explorando os sentimentos de abandono e reconciliação. A transformação dos pais em monstros simboliza como o término de um relacionamento pode afetar as percepções de uma criança, uma metáfora eficaz que enriquece a narrativa. Conforme a protagonista avança pelas provações mágicas, o filme constrói um caminho emocional que pode cativar o público, embora careça de maior intensidade em seu desfecho.
Um ponto que pode pegar o espectador de surpresa é o fato de se tratar de uma animação musical. A presença de Rachel Zegler, conhecida por sua atuação em Amor, Sublime Amor, já indicava um uso significativo de músicas, mas a execução é irregular. Algumas canções são vibrantes e conseguem transmitir emoções, enquanto outras soam deslocadas e pouco memoráveis, funcionando mais como preenchimento narrativo do que como momentos de impacto. A trilha, portanto, não alcança o brilho esperado, mas cumpre seu papel de maneira funcional.
O destaque maior talvez fique por conta da dublagem brasileira, que, como em diversas animações, eleva a experiência de Enfeitiçados. O humor e a leveza dos personagens ganham vida através das vozes nacionais, que ajudam a criar uma conexão mais forte com o público. Apesar disso, o universo mágico apresentado no filme, embora visualmente atraente, não atinge o nível de grandiosidade necessário para torná-lo inesquecível. Existe uma tentativa de se afastar da mesmice, mas o filme nunca parece ousar o suficiente. Mesmo tratando de temas relevantes e subestimados, como o impacto emocional do divórcio na perspectiva infantil, o roteiro hesita em dar o salto necessário para criar uma obra verdadeiramente marcante.
No fim, Enfeitiçados é uma animação que entrega mais do que aparenta em um primeiro momento, mas fica aquém de seu potencial. Sua história comovente e personagens simpáticos conseguem entreter e, em alguns momentos, emocionar, mas falta a ousadia necessária para que se destaque como algo mais do que "mais uma animação no catálogo da Netflix". É uma aposta segura, que acerta em alguns pontos, mas que também deixa um gosto amargo de que poderia ter sido muito mais.