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    45 Dias Sem Você
    Críticas AdoroCinema
    2,5
    Regular
    45 Dias Sem Você

    Turismo sentimental

    por Bruno Carmelo

    Rafael (Rafael de Bona) acaba de romper com o namorado, que preferiu retomar o relacionamento com o ex. Inconsolado, ele poderia encher a cara de sorvete diante de um filme romântico na televisão, ou então sair pelas festas em busca de um novo pretendente. Mas Rafael tem outros planos: ele viaja durante 45 dias por Lisboa, Coimbra, Londres, Paris e Buenos Aires, encontrando amigos e curtindo a fossa diante de belos cartões postais. Não se sabe muito bem em que o protagonista trabalha, mas o dinheiro não é problema. Os amigos estão sempre disponíveis para recebê-lo, mesmo sem aviso, e abertos a escutar longas lamentações acerca de seu estado de espírito.

    45 Dias Sem Você gira em torno de um garoto privilegiado, “branco e burguês”, como ele próprio reconhece. O diretor Rafael Gomes reconhece o egocentrismo dos seus personagens, que discursam sobre si mesmos o tempo inteiro, assim como percebe o elitismo do contexto que permite viagens a qualquer lugar do mundo, quando se quiser, sem a obrigação real de voltar. Este é um mundo alegremente inconsequente, onde o jovem apaixonado não encontra dificuldades de qualquer tipo em seu caminho. Todas as portas e braços estão abertos, num cenário feito sob medida para o desfrute.

    Ao mesmo tempo, esta configuração social muito específica jamais é criticada, tampouco vista com distanciamento. O projeto embarca numa idealização da “busca de si próprio”, flertando com a autoajuda quando Rafael começa a fazer listas de dez objetivos em sua vida, ou quando reencontra ex-namorados num processo terapêutico para curar as feridas. Paralelamente, existe algo ingênuo e infantil no fato de se recusar dizer o nome do ex-namorado, ou nos coraçõezinhos desenhados pelos muros de Portugal como forma de um suposto ativismo sentimental.

    A cada cena, o filme se esforça para combinar o pretensioso e o despretensioso, o intelectual e o popular. Os personagens se comunicam através de diálogos autoindulgentes e maneiristas como “O que é teatro, afinal? Só perfumaria barata”, “Não é fácil ser o queijo na ratoeira”, “Estou quase vulnerável de tão disponível, porra!” ou ainda “Ela é dona de uma generosidade afetiva que eu nunca vi”. O roteiro é excessivamente dependente destes diálogos pop antinaturalistas, que combinam Nietzsche e séries de TV, Roland Barthes e desenho animado, Shakespeare e Wong Kar-wai. Não existe qualquer interação profunda com as cidades, que permanecem no estágio de cenários, fundos bucólicos para os protagonistas sentarem e conversarem, andarem e conversarem, deitarem na praça e conversarem.

    Se o retrato do amor soa um tanto adolescente, 45 Dias Sem Você se sai muito melhor na representação da amizade entre adultos. As cenas de colegas assistindo a um filme juntos no computador de casa, tomando a cerveja no bar ou apenas passeando pelas ruas soam espontâneas, realistas, equilibrando o aspecto artificial do texto. Júlia Correa e Mayara Constantino, em especial, se saem muito bem em seus papéis, funcionando não apenas como alívio cômico, mas também como figuras capazes de transmitir um carinho verdadeiro pelo problemático viajante. É fácil acreditar na intimidade entre Rafael, Júlia, Mayara e Fábio, assim como no histórico de vivências entre eles.

    O projeto se conclui como uma bem-vinda iniciativa de comédia romântica adulta, gênero raro na cinematografia nacional, ainda que o ideal de fuga corresponda aos destinos turísticos mundiais mais icônicos (Nova York e Chicago também são citadas mais de uma vez). É louvável encontrar um retrato despojado da homossexualidade, assim como um olhar não glamurizado à profissão de artista, com tantas atrizes frustradas e dubladores lutando para ganhar a vida. Faltava entretanto buscar alguma aspereza nesta trajetória lisa demais, inabalavelmente otimista e autocondescendente. Mesmo com um orçamento limitado - ainda que se perceba o trabalho eficaz de câmera e som direto -, um pouco de ambição estética ou de construção metafórica nas imagens não faria mal.

    Filme visto no 26º Festival Mix Brasil de Cultura da Diversidade, em novembro de 2018.

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