Sequência é brutal, mas desorganizada
por Bruno BotelhoEm 1978, o diretor John Carpenter lançou Halloween - A Noite do Terror, um dos filmes de terror mais aclamados da história e considerado um dos pilares do subgênero slasher ao apresentar o icônico assassino em série Michael Myers (Nick Castle). O sucesso da produção rendeu uma das franquias mais longas do horror no cinema, que infelizmente acabou perdendo muito de sua qualidade inicial nas incansáveis continuações. Halloween (2018) foi uma bem-vinda correção de curso, onde David Gordon Green ignora todas as sequências e situa a história 40 anos após os eventos do filme original com Jamie Lee Curtis retornando no papel de Laurie Strode. Depois do sucesso do longa de 2018, Halloween Kills: O Terror Continua (2021) é a segunda parte de uma nova trilogia que vai ser encerrada em Halloween Ends. Mas será que eles conseguiram acertar a mão novamente?
Em Halloween Kills: O Terror Continua, depois de quatro décadas se preparando para enfrentar Michael Myers, Laurie Strode (Jamie Lee Curtis) acredita que enfim venceu. Minutos depois de deixar o assassino queimando, Laurie vai direto para o hospital com ferimentos graves de vida ou morte. Mas quando Michael consegue escapar da armadilha de Laurie, sua vingança e desejo por um banho de sangue continua. Enquanto Laurie luta contra a dor, ela tem que se preparar mais uma vez para se defender de Michael e consegue fazer toda a cidade de Haddonfield se juntar para lutar contra o monstro. Mulheres se juntam e formam um grupo de vigilantes que vão atrás de Michael e acabá-lo de uma vez por todas, garantindo o retorno de um Halloween tranquilo e paz na cidade.
Halloween Kills aborda paranoia e desinformação, mas tropeça em uma narrativa bagunçada
Um dos maiores acertos de Halloween (2018) foi conseguir capturar um pouco da atmosfera e o clima de tensão que tornaram o filme original marcante, especialmente ao contar uma história sobre o trauma e seus efeitos ao longo da vida, com mais um retorno de Jamie Lee Curtis como Laurie Strode na franquia. Em Halloween Kills: O Terror Continua, Curtis infelizmente tem sua presença reduzida na trama com sua personagem hospitalizada e fragilizada depois dos eventos anteriores, então quem ganha destaque no roteiro escrito por David Gordon Green, Danny McBride e Scott Teems é toda a cidade de Haddonfield, enfrentando a figura de Michael Myers (James Jude Courtney com ajuda do intérprete original, Nick Castle).
Por isso, a sequência vai além de Laurie Strode, sua filha Karen (Judy Greer) e sua neta Allyson (Andi Matichak), e apresenta outros personagens sobreviventes dos eventos no filme de 1978, liderados por Tommy Doyle (Anthony Michael Hall, mas foi interpretado por Paul Rudd em Halloween VI - A Última Vingança), que estão cansados do medo causado pelo assassino em série durante todos esses anos e querem acabar de uma vez por todas com esse pesadelo no lugar. Com isso, ele se alinha bastante com o momento atual do mundo em pandemia e traça comentários sociais interessantes (e relevantes) sobre paranoia, desinformação e pânico coletivo. Ao mesmo tempo que o filme acerta em cheio ao examinar esse comportamento humano em situações de crise e estresse, acaba sofrendo bastante com uma narrativa bagunçada e com falta de foco na história principal e seus personagens que carecem de desenvolvimento.
Essa nova trilogia comandada por David Gordon Green ignora todas as sequências lançadas depois do original Halloween - A Noite do Terror, mas ainda assim Halloween Kills funciona praticamente como uma reconstituição de Halloween II - O Pesadelo Continua (1981), com Laurie novamente passando um tempo no hospital para se recuperar de seus ferimentos. Um problema que existe em muitas trilogias, e aqui não é diferente, é que não acompanhamos uma progressão necessária e com novidades relevantes em relação a trama do anterior – que apresentou seus eventos de forma mais clara e direta –, o que faz dele apenas um capítulo transitório para a conclusão dessa história em Halloween Ends.
Michael Myers aparece mais brutal do que nunca em Halloween Kills
Halloween (2018) apostava em cenas mais violentas, mas sem deixar de lado a progressiva criação de tensão estabelecida em produções de terror psicológico e que marcou o primeiro filme da franquia – que assustava mais com sua atmosfera e a figura ameaçadora do Michael Myers do que com as poucas cenas de mortes. Halloween Kills: O Terror Continua vai na direção oposta ao seu antecessor, tanto para o bem quanto para o mal: ele perde muito das sutilezas, mas é um dos capítulos mais viscerais na franquia.
Isso acontece especialmente pelo fato de que Michael Myers aparece em sua versão mais brutal no cinema desde os remakes comandados por Rob Zombie (Halloween - O Início e Halloween 2) e o diretor David Gordon Green abraça toda a violência do slasher, com cenas criativas onde o sangue escorre com vontade em muitas mortes de personagens durante toda sua duração. Halloween Kills vai fundo na criação do medo e Michael é, mais do que nunca, uma personificação do mal que não pode ser parado, o "bicho-papão" que assombra a cidade de Haddonfield e traumatiza seus moradores durante décadas sem fim.
Outra questão que atrapalha essa continuação é sua recorrente tentativa de conversar com o passado e o legado traumático de Halloween, mais preocupado em fazer as conexões dos personagens da franquia que retornam com as marcas deixadas pelo encontro com Michael Myers – comentei anteriormente sobre Tommy Doyle, mas ainda temos Lindsay (Kyle Richards) e Marion Chambers (Nancy Stephens) –, do que desenvolver uma narrativa que sustente a história de todos eles de maneira relevante. Tudo isso acaba sendo ainda mais frustrante com a participação contida de Jamie Lee Curtis, que é a verdadeira força motriz da nova trilogia. Um dos maiores exemplos para esses problemas é a longa cena de abertura de Halloween Kills, que retorna para eventos da noite de Halloween do filme de 1978 apenas para contextualizar o espectador sobre um dos protagonistas – e poderia ser feita de maneira menos expositiva.
Vale a pena assistir Halloween Kills: O Terror Continua?
Halloween Kills: O Terror Continua é mais violento que Halloween (2018) e apresenta uma das versões mais brutais de Michael Myers no cinema, mas o filme falha por causa de sua narrativa bagunçada e com pouca efetividade na criação de tensão, ainda que consiga apresentar comentários sociais interessantes. No geral, a sequência apresenta muitas cenas sangrentas e empolgantes para os fãs de slasher, mas infelizmente não consegue progredir muito sua trama em relação ao antecessor. Só nos resta aguardar por uma conclusão eficiente para a história de Laurie Strode e a cidade de Haddonfield em Halloween Ends.