Mergulhando na história
por Barbara DemerovAntes de ser Rio Roosevelt, existia o Rio da Dúvida. A Expedição Científica Roosevelt - Rondon, criada para ampliar os mapas do Brasil, se fez necessária não só para fins políticos como também para fins históricos. De 12 de dezembro de 1913 a 7 de maio de 1914, o ex-presidente Theodore Roosevelt, que havia governado os Estados Unidos por dois mandatos, e o brasileiro Coronel Rondon desbravaram rios e estados ainda não tão conhecidos mundialmente.
De Mato Grosso do Sul até Rondônia e Amazonas, a dupla atravessou desafios a fim de obter resultados que permaneceriam sólidos no futuro – e de fato, é assim que tudo se mantém quase 100 anos depois. O simples fato deles viajarem pelo itinerário mais difícil dentre as opções, onde se encontrava o atual Rio da Dúvida, foi o suficiente para que ambos entrassem para a história. De forma poética e sincera, o documentário de Joel Pizzini, intitulado simplesmente Rio da Dúvida, traz todas as possíveis sensações que Roosevelt e Rondon foram expostos durante esta viagem ao desconhecido.
Através de ricas cenas ficcionais que se misturam com imagens de arquivo reais, assim como memórias da família Rondon, a dinâmica da dupla é apresentada de modo singelo, mas bem explicada. O itinerário que Rondon criou – e que Roosevelt sequer objetou – tinha como principal objetivo o alcance ao conhecimento. Tanto para um quanto para outro o objetivo era bem claro: Rondon, defensor dos índios, queria desbravar um solo ainda não percorrido sem tocar no que pertencia à natureza ou ao povo indígena, tendo como missão implantar o telégrafo nestas regiões; e Roosevelt, ganhador do prêmio Nobel da Paz, queria alcançar a imagem de aventureiro, muito além da política.
Ao passar pelo Pantanal, o Cerrado e, claro, a Floresta Amazônica, a narrativa vai tomando forma com um estilo aventuresco, cuja narração dá a impressão de que estamos acompanhando ali a verdadeira expedição, e não uma simulação atual. Não só mostrando os bons resultados que ambos obtiveram com este trabalho, o documentário também aborda as dificuldades, como a fome e a falta de noção que tiveram antes de se ambientarem completamente e os embates. A relação de Rondon com os índios também é bem explícita e há depoimentos de indígenas, cujos antepassados conheceram o general e levaram consigo o respeito para com sua figura através das gerações.
Entre belíssimas imagens dentro de um pequeno barco, com os sons de pássaros, da natureza no geral e da narração de Rondon e Roosevelt, é inevitável sentir-se próximo a esta aventura tão importante para o Brasil. Rio da Dúvida é um trabalho que prima por usufruir de seu acervo histórico, alcançando, assim, um ótimo nível de criatividade por ainda unir a linguagem cinematográfica com o descobrimento do curso do rio.
Filme visto na 42ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo, em outubro de 2018.