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    Rogéria, Senhor Astolfo Barroso Pinto
    Críticas AdoroCinema
    3,0
    Legal
    Rogéria, Senhor Astolfo Barroso Pinto

    Quanto mais quente melhor

    por Barbara Demerov

    Do nascimento de Astolfo Barroso Pinto ao nascimento de Rogéria (que antes também havia sido Rogério), o documentário de Pedro Gui engata uma viagem carinhosa ao passado de uma das maiores artistas travestis do Brasil. Rogéria, Senhor Astolfo Pinto entra em um estilo de docudrama ao intercalar depoimentos de pessoas próximas à figura com composições teatrais utilizando atores de diversas idades para nos apresentar a artista em diferentes fases da vida.

    Todo o conteúdo trabalho é feito com um carinho explícito e certa proximidade também. Entendendo a importância de Rogéria, principalmente pela personalidade forte e por suas atitudes que visavam encarar de frente o país opressor da década 60, o diretor aproveita bem suas facetas e diverte o espectador com sua presença irreverente e marcante. Próximo da protagonista, ele consegue mesclar seus inúmeros talentos (que iam do palco à televisão) com lembranças vívidas de pessoas que conviveram com Rogéria e vivenciaram seus marcos pessoais, que ainda ecoam no cenário artístico brasileiro. 

    Bibi Ferreira, Nany People, Betty Faria, Jô SoaresAguinaldo SilvaRita Cadillac compõem o elenco de apoio às memórias de Rogéria, cada um inserindo informações ora mais sérias, ora extremamente divertidas sobre sua persona e seus feitos. Desde seus tempos de maquiador (quando ainda se chamava Astolfo) na extinta TV Rio até a glória nos palcos de shows para além do Atlântico, vemos seu crescimento íntimo ser exposto em tela, assim como a identificação de quem ela era e quem queria ser.

    A cena em que Rogéria relembra, com brilho nos olhos, o momento em que o nome Rogério tornou-se Rogéria através voz do público pela primeira vez, é tão sincera quanto emocionante - além de dizer muito sobre a presença feroz que ela possuía fora dos palcos. Tal força era transportada imediatamente assim que ela pisava neles e, por mais que a admiração fosse unânime, ninguém se orgulhava mais disso que a própria performer.

    Sua confiança e ausência de medo para usar sua voz de todos os modos possíveis permeiam todo o documentário. O que tira um pouco da força da narrativa (que é tão focada no brilho e na glória) talvez seja a ausência do diretor encarar os momentos mais complicados da artista de frente, com mais atenção e tempo. O grave acidente no qual Rogéria recebeu uma cicatriz no rosto fez com que ela se fechasse um pouco do mundo, mas também a fortaleceu posteriormente. A questão é que, no filme, tal acontecimento só engrandece o lado positivo do ocorrido. Se fosse possível vermos mais deste lado sensível da artista seguramente a conheceríamos mais como ser humano, e não só como profissional.

    Por mais que se preocupe mais em honrar o que ela representa, Rogéria, Senhor Astolfo Pinto expõe bem o orgulho e a alegria de Rogéria ser Astolfo - e Astolfo ser Rogéria. "Eu não quero ser uma mulher, eu quero interpretar uma mulher", chega a dizer a protagonista. Da loirice de Marilyn Monroe à letra de La Vie en Rose, aqui é possível conhecer sua vida mais a fundo do que já é mostrado no ótimo documentário Divinas Divas. Os dois se complementam de certa forma, apesar de o trabalho de Leandra Leal ter mais espírito de convívio no que se diz respeito ao dia a dia de Rogéria.

    Filme visto no 26º Festival Mix Brasil de Cultura da Diversidade, em novembro de 2018.

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