Antes mal-acompanhado do que só
por Sarah LyraExiste uma diferença — muitas vezes sutil, mas sempre poderosa — entre criar personagens machistas com o intuito de questionar uma cultura, e criar personagens machistas para reforçar visões misóginas sobre a mulher. Deslize escolhe a segunda opção, e o mais assustador é que parece não se dar conta disso. Ao criar um ambiente universitário cujo único propósito é unir homens e mulheres sexualmente — porque, aparentemente, só existem héteros no mundo —, o filme dirigido e roteirizado por Ann Deborah Fishman é surpreendentemente desconectado da realidade, lembrando as tramas adolescentes dos anos 80, que raramente envelhecem bem, justamente por conta da distância abismal em relação às questões sociais do momento atual. A diferença é que Deslize foi feito em 2018.
A premissa do longa não apresenta qualquer elemento original, o que não chega a ser um problema até o roteiro mergulhar de vez na incoerência. A ideia é simples: acompanhar adolescentes entrando na faculdade e lidando com pressões sociais. O protagonista James (Kendall Ryan Sanders) é um garoto introvertido, tem dificuldade de interação com outras pessoas e é um prodígio em linguagens de programação. Seu colega de quarto, Lance (Noah Centineo), é o típico adolescente popular de todos os filmes norte-americanos: rico, atraente e requisitado, sempre acompanhado de dois ou três amigos que o enxergam com o líder do bando. O caminho dos dois personagens se cruza quando Lance propõe que James crie um "app de pegação" diferente de todos os outros, com termos e condições de uso pensados especificamente para impedir mulheres de se apegarem aos seus parceiros. Portanto, perguntar informações pessoais e sair uma segunda vez com a mesma pessoa são algumas das proibições que atuam como "descomplicadores" para os homens, interessados apenas em chegar ao momento sexual da forma mais rápida possível.
Para começar, Deslize erra grosseiramente ao sugerir que mulheres são incapazes de dissociar sexo de amor. Todas as garotas são retratadas como histéricas e desesperadas pela atenção de um homem, a ponto de concordarem com os termos absurdos do serviço com a justificativa de que "é onde todos os homens estão", mesmo que isso implique em postar fotos de perfil usando roupa íntima. Em uma cena que mostra uma jovem em prantos após um encontro mal sucedido, vemos um grupo de amigas oferecendo consolo com falas como: "o aplicativo é horrível, mas vamos ter que lidar com isso". Aqui, o filme evidencia sua própria visão misógina ao deixar implícito que mulheres devem ser conformistas, mesmo diante de uma situação claramente abusiva.
O sexismo não é justificável em hipótese alguma, mas é preciso ressaltar que há, na trama, uma exposição bastante estereotipada sobre o tema. Em uma tentativa frustrada de apresentar o comportamento machistas dos homens, Fishman cria cenas em que eles se referem às mulheres da própria turma como "vadias" e "piriguetes" — o que não está, de forma alguma, longe da realidade. O problema é que a reação das mulheres ao tratamento recebido é totalmente ilusória. Elas não se ofendem ou se indignam, e frequentemente tentam explicar o comportamento tóxico como "coisas de homem". O filme chega ao absurdo de mostrar Lance sendo abordado por uma garota sobre a noite que passaram juntos, e quando o rapaz responde que não se lembra de ter dormido com ela, a garota pergunta: "mas você vai me ligar mesmo assim?".
A partir daí, os problemas transbordam: mulheres de vestido curto ou barriga de fora são rotuladas de "piranhas" em um grande consenso, um questionário sobre moral nos anos 50 é usado como parâmetro de boa conduta para a mulher contemporânea, e um personagem se declara publicamente à amada, mesmo após ela ter expressado explicitamente suas frustrações com gestos grandiosos que a expõem. Em vez de respeitar o desejo da personagem, Fishman dá um tom romântico à cena, e a menina que antes se apavorava diante dessa mesma situação, sela o romance com um beijo apaixonado.
O auge do filme — e não no bom sentido — é quando há uma tentativa de redenção para James, que faz um discurso para um grupo de amigas ressaltando que elas são constantemente tratadas como pedaços de carne pelos homens. Ao final do monólogo, ele diz que vai criar um aplicativo para devolver às colegas o poder — sim, um homem diz que vai dar poder à mulher, e não de forma satírica. As jovens, em resposta, enaltecem o poder de percepção do protagonista, e perguntam se ele não é, na verdade, um estudante de psicologia, tamanha é sua maturidade e inteligência.
Com diálogos superficiais e condescendentes, Deslize não fracassa apenas em suas ideias, mas também em seu tom. Chama a atenção o fato de que Fishman sequer desenvolve as características da comédia — os esforços para gerar humor são mínimos — ou do romance. Não há qualquer tipo de aprofundamento quanto às motivações dos personagens, e a mensagem é a de que tudo é aceitável para não se estar sozinho. No último ato, quase como em um passe de mágica, a diretora conclui a narrativa mostrando todos os homens admitindo aleatoriamente suas visões deturpadas e reconquistando as mesmas garotas que passaram tanto tempo insultando, reforçando seu posicionamento não a partir do comportamento desprezível dos homens, mas na apatia das mulheres diante das situações apresentadas. No fim das contas, quem precisava de redenção era o roteiro e todo seu desserviço às mulheres.