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    Onde Quer que Você Esteja
    Críticas AdoroCinema
    2,0
    Fraco
    Onde Quer que Você Esteja

    A cidade dos desaparecidos

    por Bruno Carmelo

    Como reagir ao desaparecimento de uma pessoa querida? Quando o marido vai às compras e não volta, quando a filha adolescente foge de casa de novo? Neste filme, as pessoas procuram pela rádio Cidade Aberta, onde o programa Onde Quer que Você Esteja permite a qualquer um lançar apelos de amor e súplicas de retorno. Neste grupo se encontram a profissional das transmissões radiofônicas, que busca o marido há meses (Débora Duboc), o homem solitário cuja esposa acaba de abandonar o lar (Leonardo Medeiros), a funcionária do supermercado que procura pela babá (Sabrina Greve) e o pai de um bebê recém-nascido em busca da mãe de seu filho (Samuel de Assis).

    O filme investe no melodrama durante a maior parte de sua narrativa – especialmente o núcleo dedicado ao menino Lucas -, porém permite doses cada vez mais generosas de humor rumo à conclusão. Os melhores momentos se encontram quando estas figuras carentes começam a interagir umas com as outras, criando novos amigos ou namorados. A ideia de solidariedade entre anônimos numa cidade como São Paulo é encantadora, sendo tratada de maneira próxima à fábula – vide esta rádio onde parece existir um programa só, a estrutura simples do ambiente com aparência de estúdio ou a própria importância social que as rádios populares ainda desempenham em tempos de Internet, algo voluntariamente anacrônico.

    Outro ponto positivo se encontra no elenco, com nomes hábeis na hora de transitar entre dor e humor. Gilda Nomacce é sempre o trunfo perfeito para cenas cômicas, mas Leonardo Medeiros e Débora Duboc não se saem nada mal em suas interações. É uma pena que o resultado seja comprometido pela estética deficiente em termos de luz, som e montagem. Os enquadramentos focam-se demais nos rostos, a câmera tem dificuldade de enquadrar em ambientes restritos (as cozinhas das casas, especialmente), a luz esbranquiçada não consegue imprimir volume nem textura às cenas. Às vezes, a câmera conserta seu enquadramento durante o plano para não cortar um rosto ou um movimento específico.

    Em diversas cenas, testemunhamos personagens vestidos em cores pálidas sobre fundos pálidos – uma escolha que poderia se tornar interessante, caso reforçada com teor cômico/crítico. No entanto, a solidão dos personagens é dependente demais dos diálogos e das reviravoltas do roteiro, ao invés de ser representada pela estética. A fotografia da cena em que três amigos se encontram num bar, ou a captação de som do jantar de Zélia aos amigos revela um conjunto de deficiências difíceis de ignorar. A produção obviamente conta com orçamento restrito, mas seria interessante buscar soluções criativas para contornar estas limitações.

    Ao mesmo tempo, a temática do desaparecimento limita-se à constatação: as pessoas desaparecem, outras as procuram. Não se investiga os motivos profundos das fugas, as angústias na cidade grande, nem o que os sumiços representam enquanto fenômeno social. Os casos são usados como amostragem, evitando constituir qualquer forma de discurso político mais abrangente. Esta é uma história de rupturas e reencontros, lágrimas e sorrisos. Não conhecemos os sonhos, os gostos, as preferências, os trabalhos, o passado destas pessoas que vivem numa bolha isolada, num parêntese radiofônico lúdico, desconectado do resto da cidade.

    Filme visto no 13º Festival de Cinema Latino-Americano de São Paulo, em julho de 2018.

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