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    Mulheres do Caos Venezuelano
    Críticas AdoroCinema
    1,5
    Ruim
    Mulheres do Caos Venezuelano

    A crítica de tudo

    por Bruno Carmelo

    Caso o espectador não tenha muitas informações sobre a história recente da Venezuela, o narrador é generoso: em menos de dez minutos, uma voz off efetua um apanhado do processo de democratização, da eleição de Hugo Chávez, da venda de petróleo e da pauperização do país. Em seguida, cinco mulheres distintas compartilham os seus problemas com a câmera: uma delas teve o filho sequestrado por motivos políticos, outra é enfermeira num hospital onde faltam medicamentos, uma terceira testemunhou o assassinato dos dois filhos, e assim por diante. O painel é desolador.

    O principal mérito do drama dirigido por Margarita Cadenas é seu olhar empático em relação às classes desfavorecidas, preferindo que os fatos sejam contados por mulheres do povo ao invés dos homens do governo. Tantas histórias de abuso de poder e violação de direitos humanos merecem ser contadas e denunciadas, e o espectador dificilmente sairá imune a tantas lágrimas. O projeto demonstra preocupação em representar pessoas de diferentes idades, regiões geográficas e etnias, sugerindo universalidade: para Mulheres do Caos Venezuelano, a pequena amostragem representa um país inteiro.

    Infelizmente, os méritos humanitários não se traduzem em méritos cinematográficos. O primeiro problema diz respeito à falta de foco: o documentário denuncia os temas mais variados, sem ter tempo se aprofundar em nenhum deles. Entendemos que falta comida aos mais pobres, porém a cineasta não questiona a origem o problema, a eventual existência de políticos ou organizações tentando combatê-lo, e tampouco sugere formas de lidar com a questão. As denúncias se sucedem com a impressão de dever cumprido: fala-se da pobreza, pronto, pode-se passar para as atitudes ditatoriais do governo, para a falta de seringas nos hospitais, para o enfrentamento das milícias.

    É óbvio que estes elementos fazem parte de uma gestão global tendo como consequência em comum os danos aos mais pobres. No entanto, o simples fato de elencar problemas não implica uma forma de análise, tampouco basta para gerar reflexão. Estamos próximos do funcionamento dos telejornais sensacionalistas, para os quais a constatação de um defeito estrutural é mais importante do que a investigação do mesmo. Paralelamente, Cadenas privilegia o diálogo pela emoção ao invés da razão: somos levados a compartilhar o sofrimento, os pesares, numa estética de confronto. Chega a ser irônico que um filme tão diretamente ligado à política consiga ser ao mesmo tempo tão apolítico, incapaz de enxergar um mecanismo para além dos casos citados.

    Ainda mais fracos são os recursos cinematográficos empregados para efetuar as denúncias. Da apresentação didática, passamos a frases de efeito questionáveis por sua simplificação (“Todos são afetados de uma forma ou de outra”, “Os venezuelanos têm um só objetivo: a busca por comida”). A cada salto no tempo, uma música de suspense sugere consternação, enquanto as cartelas classificam as mulheres entrevistadas por suas profissões, sem explicar o motivo de tal critério. Por fim, o discurso de esvazia. O espectador sai da sessão na mesma posição em que começou: ciente de que a Venezuela é um país cheio de problemas, e que algo precisa ser feito para a situação melhorar. Só não se sabe exatamente o quê.

    Filme visto no 13º Festival de Cinema Latino-Americano de São Paulo, em julho de 2018.

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