Ainda Estou Aqui é um dos filmes mais marcantes de 2024, trazendo uma poderosa combinação de narrativa, direção e atuações memoráveis que transformam a experiência do espectador. Dirigido por Walter Salles e escrito por Murilo Hauser e Heitor Lorega, o longa explora a complexidade da ditadura no Brasil com uma sutileza que amplifica a sensação de medo e insegurança, fazendo o público mergulhar na atmosfera hostil e imprevisível que os personagens enfrentam.
O roteiro, aliado à direção sensível de Salles, não só retrata o ambiente político opressor da época como também constrói com precisão a intimidade e os laços familiares dos personagens. A escolha de Selton Mello para o papel de Rubens é especialmente assertiva, pois sua atuação carismática e envolvente faz com que seu desaparecimento cause um impacto profundo na narrativa e no público. Com uma presença curta mas marcante, Fernanda Montenegro também consegue transmitir, em poucos minutos e sem falas, uma carga emocional imensa, reforçando a sensação de desespero silencioso que permeia o filme.
Mas o grande destaque fica com Fernanda Torres, que assume o protagonismo de forma impecável, cuja performance conduz a narrativa com intensidade e uma sutileza notável. Sua personagem, Eunice, passa por um sofrimento que vai da resistência interna até o colapso emocional, e Torres captura essas nuances de forma brilhante, sem precisar de exageros. Ela sustenta o filme com uma atuação silenciosa, mas devastadora, onde um simples olhar expressa toda a dor e a coragem de uma mãe em meio ao horror da ditadura.
A escolha de Walter Salles pela sutileza transforma *Ainda Estou Aqui* em uma experiência que transcende a tela, deixando o impacto do filme gravado na memória do público de forma duradoura. Em vez de recorrer a cenas explícitas para retratar os horrores da ditadura, Salles opta por uma abordagem que valoriza o implícito e o não dito, o que coloca o espectador em uma posição ativa. Cada cena é construída de maneira a sugerir as tensões e os perigos da época, deixando espaço para que a imaginação do público preencha as lacunas e amplifique a angústia.
Essa escolha narrativa eleva a profundidade emocional do filme. A sensação de insegurança e opressão permeia a história, mas o terror é apresentado de forma quase invisível, sutilmente nas expressões, silêncios e olhares dos personagens. Esse tratamento sutil e cuidadoso intensifica a experiência, pois o espectador não apenas observa, mas sente a atmosfera sufocante e se conecta intimamente com as emoções dos personagens, em especial com Eunice, vivida por Fernanda Torres.
Ao optar pelo implícito, Salles cria uma obra que reverbera internamente e que permanece conosco muito depois de o filme terminar. Essa sutileza exige que o público explore suas próprias emoções e memória para processar os horrores daquela época, transformando o longa em uma experiência emocional e reflexiva, onde a ausência de respostas concretas gera um impacto psicológico profundo e duradouro.
Ao final, Ainda Estou Aqui se firma como uma das melhores produções brasileiras recentes, com um potencial de destaque em prêmios internacionais, incluindo o Oscar. A força das atuações e a precisão na abordagem dos temas históricos fazem dele um filme memorável, capaz de reverberar por muito tempo após os créditos finais.