O plano perfeito
por Taiani MendesQue tal um filme de assalto em que em momento algum os criminosos repassam o plano, planejam o que farão com o dinheiro ou mesmo comentam de quanto será o lucro do “serviço”? A Floricultura é desses. Tomi (Tomàs Balog) e Rasto (Vano Rastislav) escavam túnel dentro de uma loja de flores para chegar aos cofres de um banco, mas a história não começa com um virando para o outro e dizendo: “Ei, tive uma grande ideia, vamos roubar um banco!”. A coisa já está decidida e sendo executada e o público é como um convidado que chegou atrasado e deve manter-se discreto, sem direito a fazer perguntas ou entender detalhes do processo.
Tomi e Rasto ganham o reforço do volúvel Mizu (Vladimír Balázs), mas os braços a mais na escavação tornam-se irrelevantes quando todo o trabalho é parado com conta de insistente chuva. Antes mesmo disso a atenção do diretor e roteirista Ruben Desiere já estava mais nas conversas aleatórias dos três do que nos preparativos para o roubo e a partir de então é numa efervescente (no quesito temas) sala de espera que a boca do túnel se transforma. Preservando a expressão séria os ciganos discutem flores de plástico, o barulho da chuva, skinheads, os melhores países para imigrar, sonhos e até celebram o Réveillon.
A atividade está interrompida, mas para esses estrangeiros camuflados nas sombras não existe possibilidade de lazer. Nenhum lugar os quer, é a conclusão, e eles estão na Bélgica para trabalhar, não viver. Não há trilha sonora, mas um deles canta uma canção sobre abuso de poder policial e problemas domésticos, sequência tão definidora quanto o trecho em que eles comentam a inexistência de um termo na língua cigana para “relaxar”.
Um personagens diz que o dinheiro dissemina a raiva, outro alega que ele conserta tudo e por fim ambos estão certos, afinal enquanto estamos “aqui” algo acontece “lá”. Para cada imigrante que consegue se dar bem, mal abrindo a boca e se esgueirando exclusivamente à noite, dezenas são tratados da pior maneira, sem qualquer respeito.
Não são necessários antagonistas em evidência ou contratempos além do que estimula os diálogos, pois tudo e todos fora do confinamento têm potencial hostil, a vida não sorri para eles. O glamour de assaltar é coisa de Hollywood, em A Floricultura tal ato é construído meramente por uma repetição de ações destituídas de qualquer emoção, uma rotina comum. O intento não é torcer, o importante é conhecer esses homens o bastante a ponto de dar falta no caso algum desaparecer.
Filme visto no 7º Olhar de Cinema, em junho de 2018.