(Insta: @cinemacrica) Almodóvar está de volta. Dessa vez, o lado reptiliano dos instintos humanos, sobretudo os sexuais, estão muito mais contidos. Salvador, um cineasta que hoje já não desfruta do apogeu da carreira, amarga dores presentes ao mesmo tempo em que adoça essa realidade com memórias infantis. Com claras referências autobiográficas, Almodóvar expõe episódios icônicos que provavelmente marcaram sua carreira e vida íntima. Mesmo com um tom mais discreto, alguns elementos típicos do diretor ainda se fazem presentes. Rapidamente se nota o pragmatismo fotográfico, desde as ambientações funcionais ao claro uso de paletas com cores que já o acompanharam: o primordial vermelho, verde e um tímido azul. Também não falta elegância em sugerir mensagens ou nos tirar de uma posição cômoda. Esse é o caso dos momentos em que Salvador entende que é homossexual: a verborragia é desnecessária quando se manipula a sutileza com habilidade. Faz sentido o título da obra começar com “Dor”. Apesar das conquistas, a carga pessimista encontra mais espaço no roteiro também assinado pelo diretor. A negatividade é explorada de forma sensível e ampla, o declínio da popularidade profissional soma-se a outros reveses como a dor física persistente em diversas partes do corpo, desilusões amorosas, infância atípica e ingresso na experimentação de heroína. Outra dor centra-se na figura materna, um elemento fundamental para Almodóvar. A preocupação padrão quando criança cede espaço para uma relação presente mais ríspida. Há também uma proposição interessante sobre o valor da arte. O mesmo Salvador, muda de opinião sobre o próprio filme e atuação do protagonista após um intervalo de 30 anos. Se antes o ele era mais intransigente, a maior experiência veio carregada de um olhar mais compreensivo. O valor da arte muda com o tempo? De igual forma, artistas estão sujeitos à mesma volatilidade? Almodóvar elegantemente se desvencilha de qualquer auto-construção heróica ou do apelo emotivo para uma visão de mártir da arte. É uma biografia interessante, mas não excepcional.
Almodóvar é um dos cineastas mais festejados do mundo, desde que me entendo por gente. E seus filmes, sempre muito coloridos (visualmente e figurativamente falando) sempre apresentam traços fortes da personalidade do diretor espanhol que acabou alçando status de gênio contemporâneo. Seus personagens principais são sempre fortes e complexos. Aqui não poderia ser diferente. Mais maduro do que nunca, ele nos traz um filme redondo, bonito e extremamente pessoal (de acordo com o próprio, o mais pessoal de toda sua filmografia). Muita gente já rotulou o filme como uma autobiografia, mas não o é. O próprio cineasta já falou isso. Há várias coisas que remetem à sua vida ali, mas o Salvador do filme não é Almodóvar. Essas associações se fazem presentes por evidências claras de uma inspiração na vida do diretor. O filme narra a vida de um cineasta, homossexual, ovacionado pela crítica e que passa por um processo de perda criativa. Um amor marcante do passado, a primeira revelação de desejo, um relacionamento intenso com sua mãe, drogas e dor física. Tudo isso está lá, muito bem amarrado e narrado com extrema delicadeza e esmero. É um filme lindo sobre a vida de um homem e suas escolhas. Um filme sensível e tecnicamente beirando a perfeição. E que elenco! Antonio Banderas nos dá a melhor interpretação de sua carreira. Marcante e dedicado, o ator evidentemente se entregou ao papel. E ainda há participações de grandes atores de língua espanhola que estão fantásticos tais como Penélope Cruz e Leonardo Sbaraglia. Em suma, trata-se de um filme que é para aqueles que curtem cinema de arte, com história relativamente simples, bem contada e que deixa um gostinho de quero mais. Pedro Almodóvar sendo Pedro Almodóvar. Em seu melhor estilo.
Filme começa mais fechado, a trama vai se abrindo por camadas e a cada minuto conhecemos mais e mais os personagens. Banderas está ótimo no papel de protagonista é o desfecho da história te pega de surpresa.
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