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    O Diabo de Cada Dia
    Críticas AdoroCinema
    3,5
    Bom
    O Diabo de Cada Dia

    Maldade absolvida?

    por Barbara Demerov

    Adaptação do livro homônimo escrito por Donald Ray Pollock, o filme The Devil all the Time também possui uma estrutura dividida em capítulos -- o que pode funcionar no sentido de contar histórias distintas com alguns personagens que mal chegam a se conhecer, mas também pode dar a impressão de que alguns pontos não se fecham de forma natural. Diante de diversas tramas contadas rapidamente, sem a profundidade necessária para que o espectador possa sentir por aqueles personagens, existe apenas um símbolo repetido à exaustão: o uso da fé e de Deus como pretexto para praticar atos violentos, sobretudo pensando apenas no que é conveniente para a pessoa que os comete.

    É dessa forma que a história do filme dirigido por Antonio Campos se desenrola, o que dá margem para duas possíveis resoluções para o espectador: a percepção da imoralidade e corrupção através de diferentes tramas, ou o observar de um significado que é introduzido com força, mas acaba sucumbindo até chegar a um resultado oco, superficial, que já chegou ao seu ponto principal logo no início sem deixar dúvidas. Ao lidar com diversas narrativas que possuem afinidades apenas com o cenário de fundo (além da fé, as cicatrizes que a guerra deixa na população), The Devil all the Time acaba tendo como principal atrativo o contexto de todos os acontecimentos em si, mas não exatamente por cada um de forma isolada.

    Não é como se o filme desperdiçasse talentos, pois o elenco faz um bom trabalho no sentido de trazer bastante perturbação com relação às ações de seus personagens. No arco da família Russell, por exemplo, é possível ver a tradição da fé deturpada passada de pai (Bill Skarsgård como Willard) para filho (Tom Holland como Arvin) e o quanto isso é capaz de desmoralizar uma pessoa completamente. O jovem Arvin vai perdendo sua noção de limite partindo da base da "boa intenção" - assim como os personagens Roy (Harry Melling) e o cherife Lee (Sebastian Stan). Mas, se há um par de personagens que são puramente aquilo que querem ser sem colocar nenhuma desculpa no meio, é o casal Carl (Jason Clarke) e Sandy (Riley Keough). Apesar deles serem os responsáveis pelas cenas mais brutais do longa, é curioso notar como eles são os mais sinceros em suas causas.

    THRILLER PSICOLÓGICO ABORDA OS MALES QUE A RELIGIÃO PODE CAUSAR DIANTE DE DISCURSOS E PREGADORES ADEPTOS AO RADICALISMO

    Com isso, a divisão temporal e geográfica do roteiro vai colocando indícios de que o verdadeiro diabo de cada dia é apenas o que está dentro das pessoas; mas ainda deixando claro que há certas distinções dentre aqueles que cometem crimes pensando que serão amparados pela "lei" da fé. Ao mesmo tempo em que é o ponto mais interessante de reflexão, é também o momento em que o filme consome o máximo de significados dentro do viés religioso -- até mesmo na crítica aberta à hipocrisia de ditos religiosos --, tornando a experiência como um todo um tanto repetitiva diante da violência e ânsia por vingança. Se tudo começa com a vingança por aquilo que é intangível (no caso do arco de Willard e Arvin e a perda de entes queridos), no desdobrar da história isso se transforma na procura de Arvin pela mesma coisa que o pai procurava após voltar da II Guerra. O jovem passa por uma espécie de rito de passagem ao encerrar uma etapa dolorosa de forma física e simbólica, sendo seu arco aquele que mais funciona no todo.

    Mas o mesmo não pode se dizer dos demais personagens, como é o caso do reverendo Preston (Robert Pattinson em interpretação singular). Apesar de aparecer em momentos emblemáticos com seus sermões que beiram o absurdo, Preston, no fim das contas, acaba por ser apenas uma das facetas que a história busca apresentar pensando no panorama completo. Adicionando sua breve trama à dos demais personagens, The Devil All the Time certamente toca na ferida aberta dos males que a religião já causou no mundo por conta de discursos e pregadores adeptos a tomarem ações drásticas.

    Porém, os recortes que se encontravam espalhados pelo filme e vão se juntando aos poucos concebem um impacto imediato ao espectador, mas não fornecem uma base edificante relacionada a cada uma daquelas pessoas. Por todas as histórias serem tão semelhantes nas representações sobre a fé, falta um elemento que seria capaz de elevar a potência da obra: a definição de motivações mais exatas e o que realmente se encontra por trás da camada espiritual.

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