(Insta: @cinemacrica)
O assistencialismo em meio ao caldeirão étnico francês é a temática principal de "Boas Intenções". Isabelle é o tipo de cidadã que se engaja em causas sociais e dedica boa parte do tempo em amparar necessitados. O escopo do seu trabalho reside em ensinar o idioma francês a estrangeiros em condições de pobreza. O alicerce linguístico, portanto, seria um primeiro passo para tornar essas pessoas elegíveis a busca de emprego. A evolução cômico-dramática, por sua vez, vale-se das contradições de uma pessoa que, na ânsia de exercer o amparo social, comete excessos contra pessoas de condição similar a sua.
É verdade que o pilar que sustenta humor rende pontos altos ao filme. A combinação da figura dos estrangeiros e hábitos ocidentais criam situações inusitadas. O modo com que Isabelle lida com o marido, por exemplo, ilustra bem esse ponto. Nos momentos de intimidade, frases clássicas de tratamento amoroso cedem lugar a sussurros na cama como "vem cá, meu refugiado", ou algo próximo disso. Essa coletânea de recursos poderia ser genial se bem trabalhada e se de fato encabeçasse a vocação primária da obra. Infelizmente, não foi o caso.
"Boas Intenções" acaba sendo um prato desequilibrado. É inegável que há o objetivo de levar o drama da discriminação social francesa à tona. Ao mesmo tempo, o diretor Gilles Legrand busca a alavanca cômica para promover esse objetivo. No final, encontramos uma falta de harmonia que resulta num drama não poderoso e situações engraçadas isoladas que por vezes entram na zona do exagero.
Para o primeiro aspecto, o dramático, o arco da personagem não promove uma construção que carrega a audiência para o lado sensível das relações humanas. O trato de Isabelle com as pessoas da mesma condição social é atabalhoada, deselegante, exagerada. Mesmo considerando que um dos objetivos de Legrand seja evidenciar as contradições de alguém que ajuda os pobres e destrata os semelhantes, o meio escolhido fragiliza a mensagem. Por fim, o lado cômico fica deslocado em função da falta de identificação dramática e de abusos dos estereótipos de estrangeiros. Nesse caso, o abuso se configura como exagero porque, ao meu ver, a obra não tem esse gênero como prioridade absoluta. Um tanto quanto confuso.