Aventura solo
por Barbara DemerovEm um filme cuja história possui Sherlock Holmes como mero coadjuvante, é até esperado sentir que ela pode não entregar um resultado satisfatório. Mas Enola Holmes, estrelado pela jovem Millie Bobby Brown, proporciona aquilo que seus materiais de divulgação sempre almejaram entregar: uma aventura com toques de fantasia, que conta com uma personagem com o potencial de ofuscar o maior detetive que a literatura já conheceu.
É claro que a versão mais jovem de Holmes, com Henry Cavill (Superman) no papel, pode trazer ares de uma adaptação mais informal, conduzida na clara intenção de chamar a atenção do público jovem e de dar toques modernos. Isso se estende, também, à escolha de Bobby Brown no papel de Enola, mas ambos os atores fazem um ótimo trabalho no sentido de imersão no espírito de seus personagens. Diante da perspectiva mais descontraída destas figuras clássicas, o filme ganha traços do estilo coming of age dentro de roupagens tradicionais.
Apesar de não ir muito além dentro da narrativa de Enola - jovem de 16 anos que se vê pela primeira vez completamente sozinha no mundo real após viver toda sua vida ao lado da mãe -, Enola Holmes convence por destacar bem o peso que a ausência maternal tem no psicológico da protagonista. Ao mesmo tempo, é exatamente esta falta que a impulsiona a agir ao longo de toda a história; e isso acontece de forma natural (ainda mais quando estamos diante de uma história de origem, que por vezes podem não proporcionar um entendimento maior sobre o personagem em questão).
Mesclando elementos fantasiosos e aventurescos com o drama da família Holmes - seja com Sherlock ou com Mycroft (Sam Claflin) -, o longa justifica as ações de Enola com facilidade e, ainda por cima, a insere em situações que demonstram o quão corajosa e inteligente sempre foi. Ao expandir seus horizontes e acrescentar mais elementos à sua própria jornada em busca da mãe, a própria jovem acaba se conhecendo melhor. É por isso que o gênero de coming of age soa tão bem colocado aqui, aliado aos ótimos trabalhos de direção de arte, figurino e fotografia, que contrastam os diferentes lados de Enola muito bem.
Porém, uma das questões que tornam Enola Holmes um pouco vagaroso em decisões e momentos-chave recai em sua duração. Talvez um corte mais afiado e enxuto faria com que a obra ficasse ainda mais dinâmica na maior parte de seu tempo. Uma comparação cabível aqui é a versão de Guy Ritchie de Sherlock Holmes, lançada em 2009, que usa e abusa de uma montagem mais prática para fazer com que o espectador fique atento a cada pista e possível solução.
Não é como se isso não ocorresse em Enola Holmes, mas são poucas as passagens que se aproveitam do cenário investigativo para transmitir a essência da família, algo que também era um elemento consideravelmente esperado. No mais, Bobby Brown domina o filme com seu carisma e presença inegáveis, afastando-se da aura sombria de Eleven de Stranger Things para conduzir sua própria trama de liberdade e autoconhecimento. Com a ajuda da quebra da quarta parede e tiradas sagazes, esta é uma experiência realmente agradável de se acompanhar.