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    303
    Críticas AdoroCinema
    2,0
    Fraco
    303

    Ame ou se mande

    por Taiani Mendes

    Jule (Mala Emde) e Jan (Anton Spieker) têm 24 anos, são estudantes universitários, atraentes, assertivos e, após um dia de fracassos, estão deixando a Alemanha rumo a encontros que poderão mudar os cursos de suas vidas. Se conhecem num posto de gasolina, onde ela aceita dar carona ao educado e simpático desconhecido, e partem em viagem ao extremo oeste do continente europeu, durante a qual certamente se envolverão sexual e/ou amorosamente. Está claro como seus cabelos loiros.

    Aberto com citação do poeta Rainer Maria Rilke sobre o amor, 303 é a construção do indescritível sentimento, que tanto aflige a juventude, numa Eurotrip. Não apenas química, os dois têm biologia, geografia, história, religião e um longo tempo de estrada para debater os mais diversos assuntos. Ao invés de seduzir o espectador, no entanto, o diretor austríaco Hans Weingartner (Edukators) empenha notável esforço em puxar seu tapete: "Achou que uma vez juntos eles seriam inseparáveis? ERROU. Achou que eles ficariam na primeira oportunidade? ERROU. Achou que na verdade era uma história sobre amizade sincera entre homem e mulher, sem segundas intenções? ERROU. Acho que cada país atravessado influenciaria o romance? ERROU DE NOVO. Achou que seu coração bateria mais forte em algum momento? ERROU MAIS AINDA".

    Enquanto aguenta as "reviravoltas", toma ciência do avanço territorial pelas placas que separam os países e espera o inevitável, o público é entretido num primeiro momento com discussões até opulentas sobre capitalismo, cooperação e suicídio, com poucas revelações pessoais. Depois que Jan prova ser não apenas digno de ocupar o banco do carona do bonitinho motorhome de Jule, como também muito útil, a intimidade vai crescendo, as músicas ficam melosas, pontos turísticos passam a ser visitados, fotos são tiradas, e os assuntos do coração viram tema. Superada a paixão, onde a faísca surge da oposição, eles experimentam o amor florescido na comunhão, mas se privam de assumi-lo.

    Enquanto a bióloga e o cientista político investigam por quantos quilômetros serão capazes de resistir ao desejo, o público tem a paciência testada por cenas como um cheirando a camisa do outro ou dando aquela olhadinha discreta e adoradora. As teorias amorosas e sexuais que eles tanto discutiram são colocadas vagarosamente à prova e o motivo da derrota acadêmica de ambos no início da trama ressurge com única explicação para tamanha enrolação aos 45 do segundo tempo: eles não sabem equilibrar estratégia e atitude, assim como o cineasta não encontra os valores da equação "verborragia + ação = filmão", o maior exemplo sendo talvez a forma como os propósitos das respectivas jornadas são resolvidos de qualquer maneira.

    Se a pressa é inimiga da perfeição, a minuciosa preparação é inimiga da excitação. Não tem como não lembrar da trilogia de Richard Linklater sobre Jesse (Ethan Hawke) e Celine (Julie Delpy), mas os fofos Jule e Jan passam tempo demais se enganando e irritando o público com a conivência do diretor, que sem querer querendo apresenta um clipe ao pé da letra da canção "Hell Yeah", de Ani DiFranco, tocada justamente na virada para pior do longa-metragem. A vida é um filme b, estúpido e estranho. Uma história sem direção em que os diálogos são esfarrapados é o que é mostrado. Mas no 'ele disse, ela disse', às vezes há alguma poesia se você virar as costas pelo tempo suficiente e deixar acontecer naturalmente são os versos seguintes, que 303 não alcança.

    Filme visto na 42ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo, em outubro de 2018.

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